Vencedora da eleição presidencial do fim de semana, com cerca de 45% dos votos, a senadora Cristina Fernández de Kirchner comandará, a partir de 10 de dezembro, uma nação em busca do poderio perdido, hoje preocupada com o futuro mais próximo. De imediato, a primeira-dama que sucederá o marido, Néstor Kirchner, enfrentará três desafios na área econômica: conter a inflação, que recupera o fôlego; evitar a crise energética, e o recorrente pesadelo do apagão; e manter o impressionante ritmo de crescimento econômico apresentado nos últimos anos (8% em média, desde 2002).
Reconquistar a confiança dos investidores estrangeiros - abalada desde a moratória de 2001 - é outra batalha a ser travada cotidianamente nos próximos quatro anos de mandato. Embora tenham se passado seis anos da aguda crise econômica, política e social que levou o país a trocar de presidente cinco vezes em 12 dias, os grandes players globais ainda não degustaram bem o plano de reestruturação posto em prática pelo atual governo. Um programa baseado na troca de títulos da dívida com pagamento suspenso por outros papéis - com descontos de até 75%, se considerados os juros não pagos no período crítico.
De cada 100 pesos emprestados, o credor recebeu 25. Em fevereiro de 2005, quando o plano terminou de ser aplicado, apenas Kirchner comemorou. Os investidores - vários deles, fundos de pensão - estrilam até hoje.
Quanto à inflação, a história comprova que previsões catastróficas sobre altas incontroláveis costumam se cumprir. Um perigo a mais no futuro de Cristina. A manutenção do crescimento, por seu lado, dependerá de fatores externos que, até o momento, mostram-se favoráveis à Argentina.
O maior temor dos portenhos hoje recai sobre a capacidade de geração de energia, que já atingiu o limite. Obras urgentes para evitar um apagão são imprescindíveis logo nos primeiros meses do futuro governo, alertam especialistas. É nesse ponto que os vizinhos sul-americanos poderão ser úteis à Argentina.
O estreitamento dos laços com os parceiros de Mercosul - promessa de campanha repetida à exaustão pela senadora - pode garantir o suprimento energético de que o país tanto precisa. A construção do gasoduto Norte-Sul, que levará gás venezuelano até a Argentina, é obra vital. Prevê-se, portanto, a manutenção da política de aproximação da Casa Rosada com Hugo Chávez. No quesito política externa, contudo, as relações com Brasília continuam insuperáveis no topo da agenda.
Tanto assim que, ainda candidata, Cristina fez questão de incluir o Brasil no giro internacional (cujo roteiro se estendeu a Espanha, Alemanha, Áustria e EUA). No início do mês, ao lado do presidente Lula, prometeu revitalizar o Mercosul. Nenhum dos dois entrou em detalhes sobre como superar as assimetrias com os sócios menores, especialmente Paraguai e Bolívia.
O conflito sobre a construção de fábricas de celulose (a guerra das papeleras, que opôs Argentina e Uruguai e cuja intermediação caberá à Corte Internacional de Justiça) voltará à baila durante a gestão da senhora Kirchner. Caso queira devolver ao marido o poder em 2012 - o derradeiro desafio - terá de começar a caminhada a passos largos.
Fonte: JB Online