Dora Kramer
Folha
Muito já se falou, em tom de discordância e espanto, sobre as decisões do ministro Dias Toffoli de anular provas e suspender multas decorrentes da corrupção assumida por empresas envolvidas em negócios escusos com políticos, partidos e governos.
As razões alegadas pelo ministro de suspeição dos investigadores e supostos atos de constrangimento ilegal na obtenção das confissões são contestadas pelos fatos, mas as decisões estão tomadas e já produzem efeito cascata.
MUITO À VONTADE – O que se há de fazer, além de apontar a discrepância entre a realidade dos atos que resultaram em acordos de leniência avalizados por poderosas bancas de advogados e a ficção criada por Dias Toffoli sobre os réus confessos terem sido coagidos? Um deles, aliás, aparece muito à vontade num depoimento, rindo, praticamente confraternizando com os interrogadores.
A sociedade pode pouco, além de se espantar. Mas Judiciário e Executivo podem muito e até agora, curiosamente, não se manifestaram como deveriam no exercício de suas funções.
A Procuradoria-Geral da República pode recorrer. O Supremo Tribunal Federal pode submeter o tema ao colegiado. A Advocacia-Geral da União pode questionar o prejuízo ao erário dos bilhões em multas suspensas.
JOGADA SUJÍSSIMA – A rigor, as empresas contempladas com a benevolência suprema poderiam pedir a extinção dos acordos de leniência, mas não o fazem para não perder os benefícios dessa espécie de delação premiada para pessoas jurídicas.
Conferem, assim, validade seletiva para o acerto firmado com as autoridades suspeitas de coagir inocentes. O pleno do STF tampouco indica disposição de se manifestar para confirmar ou rejeitar a decisão do colega.
E o Executivo? Este olha compassivo a cena sem se importar com a dinheirama perdida nestes tempos bicudos, a fim de não perder a condição de narrador de uma versão que considera inexistentes ilícitos dados como realmente acontecidos mediante excesso de provas.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Esse réu citado por Dora Kramer e que deu um depoimento bem-humorado, confraternizando com os interrogadores, é Emílio Odebrecht, que Toffoli afirma ter sido coagido para depor. Na verdade, o megaempresário se ofereceu para prestar depoimento, jamais recebeu intimação, porque quem conduziu os negócios corruptos foi o filho Marcelo. No depoimento, Emílio relatou suas relações íntimas com Lula, o dinheiro gasto para reformar o sítio em Atibaia e os 250 milhões de reais que deu ao PT, a pedido de Lula, para bancar a campanha do partido. No entanto, na concepção alucinógena de Toffoli, ao dar essa decisão patológica, o empresário Emílio Odebrecht deve ter sido torturado pelo coronel Brilhante Ustra, alguma coisa assim. Sinceramente, neste processo o pior criminoso chama-se Antonio Dias Toffoli, Mas quem se interessa? (C.N.)