terça-feira, março 28, 2023

Isenção de Bolsonaro a pastores que enriquecem no culto entra na mira de Receita e TCU

Publicado em 28 de março de 2023 por Tribuna da Internet

Cinco dias depois, houve comemoração com os evangélicos…

Fabio Serapião e Ranier Bragon
Folha

A isenção tributária a pastores evangélicos publicada pela Receita Federal às vésperas da campanha eleitoral de 2022, durante o governo Jair Bolsonaro (PL), está passando por reavaliação interna do Fisco sob suspeita de ter ocorrido de forma atípica.

O ADI (Ato Declaratório Interpretativo) nº 1, de 29 de julho de 2022, ampliou o alcance da isenção previdenciária a pastores —forte núcleo de apoio a Bolsonaro, então candidato à reeleição— e também está sob investigação do TCU (Tribunal de Contas da União).

ATO ATÍPICO – Após a posse de Lula (PT), esse ato declaratório foi considerado atípico por integrantes do Fisco e passa agora por uma nova análise no órgão. Ao fim desse procedimento, a normativa poderá ser total ou parcialmente revista.

Um dos pontos detectados, de acordo com envolvidos na análise, é que a edição do ato não passou pela avaliação técnica da subsecretaria de tributação da Receita.

O ADI foi assinado por Julio Cesar Vieira Gomes, então chefe do Fisco. Atualmente, ele também está na mira da investigação sobre a tentativa de Bolsonaro em reaver as joias presenteadas pela Arábia Saudita e apreendidas no aeroporto de Guarulhos (SP). Julio Cesar nega ter havido atipicidade no ato e diz que todas as normas da sua gestão foram regulares e seguiram a tramitação devida.

TCU INVESTIGA – A Receita enviou as informações sobre o caso ao TCU em fevereiro deste ano. O tribunal havia aberto ainda em 2022 um procedimento para investigar possíveis irregularidades na edição do ADI e solicitou informações ao Fisco.

No último dia 17 de março, a Secretaria de Controle Externo de Contas Públicas do TCU pediu informações complementares à Receita. Entre elas, esclarecimentos sobre se o ato não exorbitou o poder do órgão de regulamentação, tendo em vista que a “isenção tributária deve ser interpretada de forma literal, nos termos do Código Tributário Nacional”.

Bolsonaro citou o ADI do Fisco em seu primeiro ato de campanha, em 16 de agosto, em um encontro com lideranças religiosas em Juiz de Fora (MG). Na ocasião, ele iniciou seu discurso respondendo a um pedido de solução para as cobranças da Receita. “A reivindicação já foi aceita, [o ato] está publicado no Diário Oficial da União”, disse o presidente, acrescentando que a medida só não estava sendo cumprida ainda por “perseguição” aos pastores.

ENTENDA O CASO – Por trás do ato editado pelo governo Bolsonaro está a chamada prebenda, remuneração recebida pelos pastores e líderes religiosos por serviços prestados às igrejas.

A lei isenta a prebenda do recolhimento de contribuição previdenciária, desde que ela tenha relação com a atividade religiosa e não dependa da natureza ou da quantidade de trabalho.

A Receita, porém, detectou nos últimos anos que algumas igrejas usam a prebenda para driblar a fiscalização e distribuir uma espécie de participação nos lucros aos pastores que reuniam os maiores grupos de fiéis (beneficiando lideranças de templos em grandes cidades ou bairros, por exemplo) ou as maiores arrecadações de dízimo.

MULTAS MILIONÁRIAS – O Fisco aplicou multas milionárias e exigiu o pagamento da alíquota previdenciária de 20% sobre os valores pagos a pastores, dirigentes e lideranças religiosas. O entendimento dos auditores era o de que a isenção não se aplicava a mecanismos de remuneração variável.

A partir daí, a busca pelo perdão tributário e pela flexibilização das regras passou a ser uma pauta prioritária da bancada evangélica no Congresso Nacional.

Em 2015, no governo Dilma Rousseff (PT), uma primeira lei estipulou que valores diferenciados, pagos em dinheiro ou como ajuda de custo de moradia, transporte e formação educacional também seriam isentos de tributação.

EXIGIU RECIBOS – O Fisco reagiu exigindo recibos desses gastos e multou quem não conseguiu comprovar a natureza das despesas. A Receita adotou ainda o entendimento de que a nova lei não retroagia, ou seja, as multas expedidas antes de sua publicação continuavam valendo.

Em 2020, Bolsonaro sancionou uma lei que previa expressamente a retroatividade da isenção previdenciária mais ampla sobre a prebenda. A intenção era anistiar as multas que ainda pairavam sobre pastores aliados.

No entanto a controvérsia no âmbito da fiscalização continuou, uma vez que, segundo integrantes do governo, os auditores não viram nenhuma mudança no alcance das isenções.

NA CONTA DO INSS – Em setembro de 2021, por exemplo, uma solução de consulta publicada pela Coordenação-Geral de Tributação afirmou que, caso o pagamento pela instituição se dê com características inerentes a remuneração por serviços prestados pelo ministro de confissão religiosa, o valor recebido deveria ser considerado na base de cálculo da contribuição previdenciária.

O mesmo entendimento valeria para valores pagos “de forma excedente ao necessário para fins de subsistência da pessoa”.

A manutenção das multas chegou a ser classificada por Bolsonaro como perseguição aos evangélicos. Nesse contexto, surgiu o ADI assinado pelo então secretário da Receita.

AUDITORES PROTESTAM – Na época da edição do ato, o Sindifisco Nacional (Sindicato dos Auditores-Fiscais da Receita Federal) disse que a medida “extrapola a competência da Receita Federal para atos normativos”.

“Ao reduzir as condicionantes para o que se considera remuneração para fins de incidência previdenciária, a Receita Federal faz com que mais remunerações se considerem isentas. Uma ação que prejudica tanto a arrecadação presente quanto créditos tributários já constituídos e produz efeitos danosos nas contas da seguridade social”, disse o sindicato dos auditores.

No ano passado, a lista pública de devedores inscritos na Dívida Ativa da União apontava as entidades religiosas com um débito de R$ 1 bilhão, sendo R$ 951 milhões relacionados à Previdência.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – Cinco dias depois, Bolsonaro foi homenageado pela bancada evangélica. Caramba, amigos! O que essa gente faz para enriquecer em nome de Deus não é brincadeira. São falsos pastores que não acreditam nem mesmo na justiça divina. “Vade retro satana!”, dizia-se antigamente. (C.N.)