Lula aposta num governo do PT, que se inicia sob severas limitações
Por William Waack (foto)
Não é uma frente ampla o que Lula montou para governar. É um governo do PT que já começa limitado por duas severas restrições, ambas de amplo alcance.
A primeira é de natureza fiscal e tem como causa principal o horizonte político muito restrito do próprio Lula. Ele se esforçou por conseguir uma licença para gastar – seu único foco inicial – e a obteve a custo altíssimo: o Centrão enfiou na PEC de fim de ano enorme pressão pela subida de gastos públicos.
O preço disso, nas contas de Marcos Lisboa e Marcos Mendes, é consumir de saída a “gordura” (que nunca existiu) para investir e antecipar o dilema entre juros altos ou carga tributária mais elevada. Suspeita-se que teremos os dois.
A segunda limitação está na clara intenção de Lula de enfiar goela abaixo do mundo político um “ferrolho” composto pela velha-guarda petista. As figuras simbólicas de Geraldo Alckmin, Simone Tebet e Marina Silva não dispõem das forças necessárias (bancada, máquina partidária, peso político individual) para se contrapor, caso pretendam, ao núcleo duro petista.
É bastante evidente que Lula ofereceu a grupos políticos diversos a oportunidade de participação num governo cujo número de ministérios já sugere grande dispersão de esforços (e enorme dificuldade de coordenação), mas até aqui não parece têlos incluído na formulação das grandes diretrizes. Se é que se pode falar disso no momento.
Hábil na arte da acomodação tática, Lula não dá sinais por enquanto de entender uma frente ampla como agenda abrangente que garanta num horizonte expandido condições de governabilidade melhores do que compromissos de cargos e influências no atual amplo ajuntamento de grupos políticos. A presença no desenho ministerial de posições antagônicas sugere que tudo convergirá para o arbítrio “ad hoc” do líder – ou paralisia decisória.
Exemplo disso é o relatório da assembleia de transição. Ela produziu diagnósticos de situações específicas acompanhadas de sugestões setoriais comparáveis a uma “shopping list”, mas longe de comporem um plano consistente de ação ordenado segundo uma “visão” (compartilhada ou não por uma frente ampla de correntes políticas).
As ações de Lula até aqui sugerem que ele superestima suas próprias habilidades e a “fortuna” (na definição de Maquiavel). É comum agentes políticos acreditarem que alcançaram algo apenas por si próprios, ignorando circunstâncias que pouco controlam.
É onde Lula parece estar no momento. Não parece reconhecer a correlação de forças diferente daquela de 20 anos atrás. Nem a natureza e amplitude da oposição social que enfrenta.
O Estado de São Paulo