Há menos tolerância dos investidores para perdoar ataques à democracia ou crises institucionais
Por Fábio Alves (foto)
Quando a guerra na Ucrânia estourou, muitos analistas atribuíram o aumento no fluxo de capital estrangeiro para ativos brasileiros à fuga dos investidores da Rússia em direção a uma grande economia emergente mais estável política e institucionalmente. A mais recente crise entre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF) deve afetar essa visão favorável ao Brasil pelos investidores globais.
Já eram esperadas, em 2022, maior volatilidade e turbulência na Bolsa de Valores brasileira e em outros ativos, como o câmbio, em razão das eleições presidenciais. Esperava-se, contudo, que o nervosismo dos investidores com o ciclo eleitoral fosse afetar o mercado brasileiro a partir de agosto, quando normalmente a corrida presidencial pega fogo.
Mas, ao conceder indulto ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado a oito anos e nove meses de prisão, o presidente Jair Bolsonaro desafiou o STF e deflagrou uma crise sobre a qual, hoje, ninguém garante que o pior ficou para trás e a tensão acabou.
A eleição é o pano de fundo do novo embate entre os poderes Executivo e Judiciário. O perdão à pena imposta a Silveira foi claramente uma tentativa de Bolsonaro em agradar à base mais fiel de apoiadores, num momento em que se recupera nas pesquisas de intenção de voto.
Há alguns meses, alguns investidores chegaram a defender a tese de que, em razão da polarização consolidada entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula, com uma terceira via já considerada fora do baralho, a eleição deste ano talvez pudesse não causar tanta volatilidade quanto nos pleitos anteriores, uma vez que os dois candidatos que deverão disputar o segundo turno já são conhecidos do mercado – em seus defeitos e qualidades.
A tensão institucional causada pelo indulto mostra que uma parte do mercado foi ingênua em crer que a queda forte do dólar até a semana passada não fosse ser revertida mesmo com o início para valer da campanha eleitoral.
Mas, daqui em diante, não se podem descartar atitudes radicais de Bolsonaro, com ameaça de nova crise institucional, na tentativa de impedir sua derrota nas urnas. Ou, caso seja derrotado, contestar o resultado das eleições para além de duras críticas.
Além disso, a sinalização de um ciclo mais agressivo de alta dos juros americanos pelo Federal Reserve deve enxugar fortemente a liquidez internacional. Países emergentes, como o Brasil, podem sofrer consequências com a saída de capital. Ou seja, há menos tolerância dos investidores para perdoar ataques à democracia ou crises institucionais.
O Estado de São Paulo