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José Luís C. Zamith
O voto legitima as ações prometidas pelo governante e o empodera para que, após a posse, inicie a implementação das esperadas medidas para resolver os problemas da população. E no espectro de ferramentas para alcançar os objetivos, um dos componentes fundamentais era relevado a segundo plano: o servidor, o funcionário responsável por fazer a máquina andar.
Após a garantia do governador de que os salários dos servidores seriam pagos em dia, mesmo dentro do contexto financeiro atual do Estado, restabeleceu-se a tranquilidade no dia a dia das famílias do funcionalismo público. Mas, além disso, a gestão estadual precisava de algo mais para romper a inércia. Um desafio assumido por mim, enquanto secretário responsável pela governança do governo.
LIDERANÇA – Minha formação de fuzileiro naval alicerçou, como uma de minhas premissas, que não é possível conduzir ninguém para um objetivo se não há liderança. Assim, tendo como norte a chefia do governador, passei a colocar em prática as ferramentas, que forjaram minha formação ao longo da carreira, dentro do meu ambiente de responsabilidade.
Uma de minhas maiores preocupações era como tomar diversas medidas impopulares, como cortes orçamentários, retirada de privilégios, mudanças de local de trabalho, cobranças de horário, padronização de funções e parametrização de gratificações, de forma a não imobilizar ainda mais uma máquina que já não andava.
Precisava olhar o todo, mas fundamental era começar de um jeito que trouxesse resultados satisfatórios para a minha secretaria, já que somos o centro nervoso do governo.
AS MUDANÇAS – No meu “quintal”, o início foi impactante. Comecei pela mudança de local de trabalho, organizando pessoas que estavam espalhadas em vários equipamentos do Estado – pagando aluguel – e concentrando em um só local, o Complexo do Palácio Guanabara.
Os prédios, que antes eram ocupados por 500 servidores, passaram a receber quase dois mil funcionários diariamente, a serviço da Secretaria da Casa Civil, Secretaria de Governo e Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
Mexi no enraizamento das pessoas, mas, em contrapartida, busquei melhorar o local de trabalho com algumas medidas, entre elas, acelerar a implantação de um restaurante, com valor acessível, para que os funcionários não precisassem se deslocar e pagar os valores praticados por restaurantes da Zona Sul da cidade.
DIÁLOGO FRANCO – Iniciei também aquilo que considero primordial para uma liderança: transparência e diálogo aberto com os servidores da minha pasta. Diante de qualquer problema, assumi de frente a interlocução e a explicação funcionário a funcionário, dizendo como seria a solução e quanto tempo mais perduraria o problema.
Ao começar a lidar de frente com os servidores, fui surpreendido ao descobrir que essa era uma prática inédita. Antes, secretário de Estado era um ser de uma “corte”, que não se dirigia aos seus “súditos”. Algo surreal e inimaginável para quem pretende ser um dos guias dentro de uma organização.
Ao me aproximar dos servidores da ponta, com um ‘bom dia’, um sorriso, ou uma explicação de ‘para onde o governo se encaminha’, notei uma carência enorme nas pessoas em serem ouvidas.
“NOSSO GOVERNO” – Estabeleci um canal de comunicação, que aos poucos, fez com que as pessoas se sentissem parte da nova gestão. Ouvi muito no início: “o governo de vocês” e hoje, o que mais escuto é “o nosso governo” – um discurso em que as pessoas se colocam como protagonistas desta administração.
A valorização das pessoas, pelo simples fato de realmente serem vistas e ouvidas, foi o pilar fundamental dos resultados que estão sendo alcançados e um componente ímpar na liderança. A partir dessas mudanças, decidi que não poderia mais ficar sentado na minha cadeira, precisava “conhecer o chão da fábrica” e participar da rotina dos nossos colaboradores.
LINHAS DIRETAS – No Palácio Guanabara são realizadas inúmeras reuniões. Por ter funções estruturantes na gestão estadual, minha equipe coordena vários encontros em que é necessária a participação de diversas secretarias.
Aproveitando a oportunidade de aproximação, passei a abrir ou fechar as reuniões, explicando como era o novo governo, qual era a estratégia adotada, as restrições necessárias, e tudo o que o servidor precisava ouvir da boca de um gestor, em vez de ter esse conhecimento apenas pelos jornais, como sempre foi de costume.
Sempre termino as minhas falas com um ‘muito obrigado’. Não custa nada e é a mínima recompensa que podemos dar pelo esforço do trabalho diário.
VISITA SEMANAL – Além disso, estabeleci uma visita semanal a todos os meus subordinados diretos, para pelo menos desejar um bom fim de semana e agradecer a contribuição. Cabe ressaltar que a secretaria que comando funciona com mais de mil servidores. No início, com meu histórico militar, vários vieram me indagar se o que fazia era inspeção. Entretanto, com o passar do tempo, nas poucas semanas em que não tive oportunidade de cumprimentá-los, por causa da agenda apertada, ouvia o comentário: “O Sr. não foi lá na sexta, hein!”.
Por último, tomei a decisão de ligar, diariamente, para os aniversariantes do dia. De segunda a segunda. A praxe era o envio do cartão, mas achei que isso seria muito impessoal. Se todos estão me vendo de perto, como um servidor comum – o que realmente sou – nada mais natural do que pegar o telefone e cumprimentar o meu colaborador de forma pessoal.
Tenho feito isso há mais de um mês e o feedback é muito engraçado. Num primeiro momento, as pessoas não acreditam que seja eu, mas o fim da conversa é quase uma renovação de compromisso entre nós, para que continuemos trilhando o caminho certo.
NOVA ENGRENAGEM – A liderança não perpassa apenas pelo relacionamento. É muito mais. Entretanto, fiz questão de focar este artigo na relação com os servidores, porque isso me saltou aos olhos como um dos principais problemas a serem trabalhados para o restabelecimento da engrenagem. Liderar pessoas é estar próximo, entender o seu subordinado e fazer com que ele compreenda que aquilo que é solicitado é algo que precisa ser feito para beneficiar tanto ele quanto outras pessoas. E isto não custa um tostão.
Com a valorização dos servidores e as mudanças no relacionamento diário, conseguimos um aumento de mais de 25% na performance da Secretaria de Estado da Casa Civil e Governança, em comparação a todo o ano de 2018. Aos poucos, estamos avançando e mudando uma prática enraizada em órgãos públicos. Ainda há muito a se fazer e teremos muitos percalços a enfrentar. Contudo, no meio de uma complexidade enorme que é a administração pública, é possível avançar com simplicidade, determinação e comprometimento.
José Luís Cardoso Zamith é Secretário Chefe da Casa Civil e Governança do Estado do Rio de Janeiro