Carlos Chagas
Arrisca-se o ex-presidente Lula a duas derrotas, se levar adiante sua disposição de coordenar a reforma política no PT e adjacências: a votação em listas partidárias para deputado e o financiamento público das campanhas estão na alça de mira da maioria parlamentar.
As cúpulas partidárias defenderem as listas, ou seja, o voto na legenda, quer dizer, a proibição de o eleitor votar no candidato de sua preferência. Trata-se de malandragem pura, porque serão as cúpulas a compor as listas, certamente colocando-se nos primeiros lugares e garantindo a eleição. Mas os grotões, como ficam? São maioria mas precisarão mendigar a inclusão nas listas em posições capazes de garantir-lhes a vitória eleitoral. Nem todos conseguirão, ou melhor, a maior parte ficará prisioneira dos barões controladores dos partidos. Melhor, assim, rejeitar de vez a mudança. Mesmo no PT há resistência, imagine-se em partidos menos dóceis diante de suas lideranças, como o PMDB, o PSDB e o DEM.
Quanto ao financiamento público das campanhas, quatro obstáculos: os candidatos com mais recursos ou menos escrúpulos não deixarão de gastar dinheiro então considerado irregular, mas de difícil fiscalização; o financiamento será entregue às cúpulas partidárias, que distribuirão os milhões saídos dos cofres públicos conforme seus próprios critérios; nesses tempos de contenção e cortes orçamentários, o governo não vê com bons olhos destinar grandes quantias para financiar campanhas políticas; finalmente, a opinião pública não consegue entender como falta dinheiro para escolas, hospitais e estradas, mas sobrará para a eleição de uma classe não propriamente benquista nas ruas.
Bem que o Lula conseguirá virar algumas tendências, se mergulhar de cabeça na defesa dessas reformas, mas fica evidente que correrá riscos. Dificilmente perderá popularidade no caso da derrota das duas propostas, mas pelo seu comportamento de jamais ficar contra o sentimento majoritários nacional, pode ser que um dia desses desembarque de sua decisão de coordenar a reforma política.
IMPRENSA, PARA QUÊ IMPRENSA?
Na reunião do Lula com prefeitos, líderes, deputados, senadores e ex-dirigentes do PT, num hotel em São Paulo, os jornalistas foram olímpicamente escanteados. Levados para uma sala próxima dos debates, ainda tiveram que suportar um aparelho de som a mil decibéis, forma grotesca dos organizadores de não permitir sequer escutas clandestinas daquelas tipo “orelha na parede”.
Trata-se de prática contumaz do PT, essa de desconsiderar a imprensa. Parece ainda predominar aquele espírito de antagonismo entre os companheiros e os meios de comunicação, explicáveis quando os jornalões identificavam comunistas em cada núcleo petista, mas anacrônico desde muitos anos.
Acresce que nesse tipo de reunião, segredos duram no máximo alguns minutos, já que alguém sempre fala, principalmente se tiver tido seus interesses contrariados.
AS AVENTURAS TÊM NOME
Ainda sobre a reunião do Lula com o PT, uma evidência: o ex-presidente pregou alianças com setores mais conservadores e conclamou os companheiros a não se envolverem em aventuras, nas eleições municipais do ano que vem. Traduzindo: nada de escolherem candidatos a prefeito apenas para marcar posição, sabendo-os de antemão derrotados. O conselho tem alguns endereços definidos e nome no catálogo telefônico. Será aventura o partido insistir em Aloísio Mercadante e Marta Suplicy para a prefeitura de São Paulo. Ambos tem sido derrotados em eleições recentes para a prefeitura e para o governo de São Paulo. Se entenderam ou não o recado, é outra história.
ECOS DA CONDECORAÇÃO MINEIRA
Tancredo Neves era governador de Minas e no primeiro ano em que presidiu a entrega das medalhas da Inconfidência a alguns agraciados, convidou o então governador de São Paulo, Franco Montoro, para orador principal, em Ouro Preto. Ninguém entendeu, ainda mais quando a felpuda raposa mineira lembrou o nome do colega paulista para candidato à presidência da República, nas eleições que ainda poderiam vir a ser diretas, em 1985. Afinal, já se delineava a candidatura do próprio Tancredo, em especial se o modelo continuasse indireto.
Explicação: ao lançar Montoro, o governador de Minas estava atingindo o verdadeiro candidato de São Paulo, naqueles idos também do Brasil e do PMDB, Ulysses Guimarães, que nem convidado foi para a cerimônia. E caso Montoro se firmasse como candidato, seria muito mais fácil afastá-lo…
Esse episódio se conta no dia em que a presidente Dilma Rousseff será homenageada na mesma Ouro Preto, agora pelo governador Antônio Anastásia. O ex-governador Aécio Neves seguramente estará no palanque, mas a dúvida é se José Serra, Geraldo Alckmin e Fernando Henrique foram convidados…
Fonte: Tribuna da Imprensa