Carlos Newton
Recebemos do comentarista Carlo Germani uma impressionante matéria de Heitor de Povoa, publicada pelo excelente site “Mídia sem Máscara”, que aborda com propriedade uma das questões mais importantes e delicadas do Oriente Médio: o radicalismo dos muçulmanos, com base na sua particular e exclusiva Declaração dos Direitos Humanos no Islã, aprovada em 1990 na Conferência Islâmica realizada no Cairo.
O autor faz comparações com a Declaração dos Direitos do Homem aprovada pelas Nações Unidas em 1948, que é um documento laico, sem citação religiosa de qualquer espécie (graças à intervenção direta do ateu Stalin). Pois a Declaração dos Direitos Humanos do Islã baseia-se justamente no contrário.
É impressionante. O Art. 1 define que a humanidade inteira forma uma só família unida por sua adoração a Alá e sua descendência comum de Adão. No Art. 2, defendendo que a vida é um dom de Alá, não é possível suprimi-la, a não ser por exigência da Sharí’a (princípios da Lei Islâmica), assim como a integridade do corpo humano.
Helio de Povoa mostra que o documento segue concedendo direitos, porém sempre dentro dos limites da Sharí’a. E no Art. 10 diz textualmente: “O Islam é a religião indiscutível. Não é lícito exercer nenhum tipo de coerção sobre o ser humano, nem aproveitar-se de sua pobreza ou ignorância, para levá-lo a mudar sua religião por outra, ou pelo ateísmo”.
Depois de declarar no Art. 16 os direitos intelectuais e de pesquisa, assinala: “Serão protegidos os interesses intelectuais e materiais gerados pelo seu trabalho, sempre que estes não contradigam a Sharí’a”.
Os dois últimos dispositivos reafirmam a ditadura religiosa: Art. 24: “Todos os direitos e os deveres estipulados nesta declaração estão sujeitos aos preceitos da Sharí’a Islâmica”. E o Art. 25: “A Sharí’a Islâmica é a única fonte de referência para o esclarecimento ou interpretação de qualquer artigo do presente documento”.
Sharí’a é a Lei que comanda todos os aspectos da vida dos muçulmanos: a rotina diária, as obrigações religiosas e familiares (incluindo conjugais), acordos financeiros e diplomáticos etc. Com poderá ser democrático um povo que se submete a esse tipo de ditadura radical religiosa? A gente torce para que ditadores como Kadafi e Mubarak sejam derrubados, mas não se pode ter muitas ilusões com relação à democratização desses povos.
Há quem pense que os povos árabes querem se ocidentalizar, livrar-se dos véus e dos rígidos rituais de sua Igreja, mergulhar numa libertadora onda de sexo, drogas e rock and roll, mas a realidade é bem outra. O assunto é importante e intrigante, tem de ser debatido com profundidade e cuidado.
Fonte: Tribuna da Imprensa