segunda-feira, janeiro 10, 2011

Que se abram todos os arquivos e todas as memórias

Carlos Chagas

Vale a máxima que por 25 anos, antes de aposentar-me, transmiti a meus alunos de Ética e de História da Imprensa, na UNB, até referida em seu discurso de posse por uma singular aluna tornada ministra do governo Dilma: “O mundo não está dividido entre mocinhos e bandidos”. Todos nós, em maior ou menor grau, temos as qualidades e os defeitos dos personagens do faroeste, ainda que certas figuras possam caracterizar-se muito mais como bandidos do que como mocinhos.

Feito o preâmbulo, o principal: mais do que necessária, torna-se imprescindível a aprovação do projeto da Comissão da Verdade, em tramitação na Câmara, capaz de permitir a identificação dos agentes do poder público, civis e militares, empenhados em práticas de tortura e de assassinatos, nos anos de chumbo do regime ditatorial. Ainda que a punição tenha se tornado impossível pela Lei de Anistia e até pela prescrição penal, importa que sejam identificados.

É necessário pagarem assim o preço do inominável abuso de poder demonstrado naquele período. Em especial se admitirem reconhecer que vinha de cima a permissão para o horror, de preferência com nomes e datas, tanto dos responsáveis maiores quanto das indigitadas vítimas. Aliás, é farta a literatura a respeito, restando saber o que fizeram com parte dos assassinados, como resgate para suas famílias.

Há, no entanto, o reverso da medalha. Por que não identificar quantos se empenharam na guerra suja praticando violências do tipo “justiçamento”, como chamavam. Ou que mataram sentinelas, soldados, seguranças, guardas de bancos, agentes da lei, empresários e sucedâneos? Aqueles que assaltaram, roubaram e pretendiam instaurar uma ditadura igual à que combatiam também precisam ser identificados.

É insuficiente atribuir-lhes apenas motivações heróicas e ideais de juventude, mesmo sabendo-se que o lado de lá ganha de goleada em número de atrocidades, ainda mais porque encobertas pelo manto de uma falsa legalidade então vigente.¼br /> �
Claro que, nos dois casos, trata-se de História, por isso mesmo necessitando ser iluminada nos seus mais obscuros desvãos. Vergonha houve para ambas as partes. Se é para ir em frente, e é, que se abram todos os arquivos e todas as memórias.

JÂNIO QUADROS E LULA, TAMBÉM

Um adendo ao memorável puxão de orelhas dado por mestre Hélio Fernandes no governador Geraldo Alckmin por haver declarado que Rodrigues Alves foi o último paulista dos presidentes da República. Nosso guru aí de cima lembrou Washington Luiz e Fernando Henrique Cardoso, nascidos fora de São Paulo mas presidentes paulistas tanto quanto os outros. Faltou referir Jânio Quadros e o Lula, cujas carreiras se fizeram em São Paulo, mesmo nascidos em Mato Grosso, um, e em Pernambuco, outro. Este, desde a infância, aquele, ainda jovem, tiveram suas ações, interesses e concepções centrados no estado mais rico da Federação.

MAIS DEBATES

Vai demorar para chegar ao Congresso o projeto que cria a Agência Nacional de Comunicação, preparado no apagar das luzes do governo Lula. São 113 artigos, alguns em conflito com a legislação vigente. Daí a decisão da presidente Dilma Rousseff de abrir amplo debate a respeito, junto à sociedade.

A preservação da liberdade de imprensa é ponto fundamental para o atual governo, acrescendo-se que para os abusos praticados através dos meios de comunicação existe o Poder Judiciário. Tudo dentro do princípio óbvio de que abusos só podem ser punidos depois de praticados. É o preço a pagar em nome da liberdade, ainda que a Justiça, aqui para nós, possa vir a ser um pouquinho mais rápida…

Fonte: Tribuna da Imprensa