quinta-feira, setembro 02, 2010

Palocci vai herdar um cachorro

Carlos Chagas

Tancredo Neves tomaria posse a 15 de março e, mesmo assediado pela imprensa inteira para divulgar seu ministério, mantinha-se irredutível. Anunciaria a equipe de uma vez só, dia 12. Não admitia exceções, mas como os convites vinham sendo feitos, tornava-se impossível evitar as especulações, a maioria delas corretas.

Aureliano Chaves tinha sido peça fundamental para formar a dissidência contra Paulo Maluf, no PDS, e ninguém duvidava de que ocuparia as Minas e Energia. Dia sim, outro também, o então vice-presidente da República era assediado para confirmar o convite e informar quem seria o presidente da Petrobrás. Fez chegar ao presidente eleito o constrangimento e a necessidade da antecipação de seu nome para o ministério, mas Tancredo continuava irredutível: só no dia 12, todos juntos. Matreiro, porém, sentia estar se armando um choque com Aureliano, de temperamento mais do que forte.

Veio a solução. Instalado na Granja do Riacho Fundo, surpreendeu os jornalistas aparecendo de repente no jardim, pronto para conversar com eles, fato inusitado naqueles dias. Estava tudo armado. Um dos repórteres amigos tinha recebido a instrução de perguntar quem seria o presidente da Petrobrás. Perguntou. Tancredo, fingindo surpresa e irritação, antes de dar as costas ao grupo, exclamou apenas: “perguntem ao dr. Aureliano.”

Estava resolvida a questão, afastada a primeira sombra de crise. O presidente eleito não anunciara a nomeação de Aureliano para as Minas e Energia, mas, ao mesmo tempo, deixara óbvia sua escolha. Mais uma jogada de mestre, que comemorou entre sorrisos mineiros…

Por que se conta essa historinha? Para Dilma Rousseff adquirir jogo de cintura quando indagada pela milésima vez se Antônio Palocci será seu ministro-chefe da Casa Civil. Sempre haverá um jeito de dizer que ele está aprendendo a gostar de cachorros, tanto que vai herdar o bicho que foi de José Dirceu e era dela até a formalização de sua candidatura…

Elocubrações futuras

Não tem limites o galope do cavalo branco da imaginação. Diante da mais do que provável eleição de Dilma Rousseff, já se especula sobre a sucessão de 2014, com as candidaturas do presidente Lula, pelo PT, e Aécio Neves e Geraldo Alckmin, pelo PSDB, além do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, pelo PSB. Fica no ar a pergunta: e o PMDB, prestes a confirmar a previsão de que continuará como maior partido nacional, crescendo em número de governadores, senadores e deputados? Parece impossível que essa formidável estrutura partidária abra mão, pela quarta vez, de dispor de um candidato próprio.

Mas quem? Que nomes poderiam, hoje, despontar como futuros possíveis pretendentes ao palácio do Planalto, já que as legendas concorrentes dispõem de nomes mais do que fortes? Roberto Requião, prestes a voltar ao Senado? Sérgio Cabral, governador reeleito do Rio? Michel Temer, vice de Dilma Rousseff? A safra ainda não foi plantada, fazendo lembrar a colheita que revelou Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Teotônio Vilela, Orestes Quércia, Waldir Pires e outros.

Quando bater faz crescer

Caso verdadeiras as informações de estarem os tucanos mudando de tática eleitoral para tentar salvar a candidatura José Serra, seria bom que prestassem atenção na cozinha. Na cozinha? Sem dúvida, porque se os novos planos envolverem críticas ainda mais contundentes a Dilma Rousseff, é bom pensar na massa de bolo, aquela que quanto mais se bate, mais cresce.

Desde o início da campanha que o PSDB enveredou pelo caminho errado. Quando Serra liderava as pesquisas e chegou a ser tido como imbatível por importante diretor de instituto de pesquisa, deixou de definir uma linha coerente. Hesitou entre preservar o presidente Lula ou expor as mazelas do governo. Enfrentar o próprio ou contemporizar. Agora, ainda poupando o criador, pensa em flagelar a criatura. Não vai dar.

Severidade e impaciência


Dizia Juscelino Kubitschek que as urnas eram severas e o eleitorado, impaciente. Dilma Rousseff terá condições de, eleita, traçar o roteiro de seu mandato e partir não só para a continuidade do governo Lula, mas para projetos próprios. Se ficar apenas como um vídeo-tape do antecessor, logo sentirá a impaciência de seus eleitores. É bom lembrar que o Lula anunciou o Fome-Zero e a criação de dez milhões de empregos nos primeiros dias de sua posse.

Fonte: Tribuna da Imprensa