Leide Brandão e Livia Veiga
A avenida de maior movimento da capital foi cenário de uma tragédia, que até hoje é cercada de mistério. Por dia, mais de 120 mil veículos trafegam na região do Iguatemi, e entre as 18 e 19 horas, esse fluxo ultrapassa a marca dos 10 mil. No último sábado, pedestres, motoristas e pessoas que trabalham na área testemunharam o assassinato do juiz Carlos Alessandro Pitágoras, da comarca de Valença, morto com dois tiros efetuados pelo soldado da Polícia Militar, Daniel dos Santos Soares. Mas, após o crime, testemunhas se reservam ao silêncio e a polícia tem dificuldades no encaminhamento do inquérito.
Porém, uma testemunha que temendo represálias preferiu o anonimato, e que inclusive, se mostra relutante em procurar a polícia para contar o que viu, resolveu falar com exclusividade à Tribuna. O trabalhador estava a poucos metros do local do crime e até hoje, se diz chocado com a cena que presenciou.
Já era noite de sábado e o movimento em frente ao shopping era intenso, inclusive com pontos de retenção no trânsito. A testemunha relata que dois veículos entraram juntos em uma curva, o Kia Sephia, cor preta, placa JNU 9928, pertencente ao soldado e o Honda Civic, cor prata, placa JSW 5532, conduzido pelo magistrado. Em seguida, o PM, que estava com os vidros do carro fechados, teve que reduzir a velocidade, por conta do engarrafamento.
A testemunha conta que o juiz parou o carro ao lado do meio fio, desceu do veículo, deixando a porta aberta, e seguiu em direção ao carro do policial, que estava a alguns metros de distância.
“Até este momento, ninguém sabia que era um policial que estava dirigindo, nem que o homem que desceu do carro, com uma arma na mão, apontada para baixo, era uma autoridade”, contou. De acordo com relatos do trabalhador, em alguns segundos, o soldado percebeu que o motorista do Honda Civic estava vindo em sua direção andando. O PM, então, abriu a porta do carro, andou até o lado do carona e de imediato, disparou dois tiros seguidos contra o homem, que caiu na pista.
Neste momento, quando saiu do carro, o policial fardado, foi ao encontro da vítima e a puxou para cima da calçada. Como conta a testemunha, o juiz ainda estava vivo e agonizava. “Estou morrendo. Vou morrer”, teria dito o magistrado ao acusado de atirar contra ele, que teria informado já ter chamado o socorro do Samu. Na calçada, ao lado do policial, o juiz teria se debatido ainda por alguns minutos e ali mesmo, em frente a populares, deu o último suspiro.
Familiares de juiz se desesperam
“O Samu chegou 20 minutos depois dos tiros. O policial a todo tempo olhava em direção ao carro da vítima e dizia estar preocupado que alguém roubasse o veículo, que estava com a porta aberta. Mas em nenhum momento, alguém desconfiou que a vítima era um juiz”, relatou a testemunha.
Alguns policiais chegaram ao local, estes que teriam sido acionados pelo próprio PM Daniel dos Santos. Eles teriam orientado o soldado a retirar o distintivo que o identificava na farda. A testemunha conta que os policiais fizeram com que populares que filmavam o local do crime com celulares, apagassem as imagens.
“Eu achava que o policial militar tinha matado um policial civil, porque os dois estavam armados”, contou, porém, após constatada a morte, e checada a documentação, o juiz foi identificado. Ainda com a vítima no solo, familiares chegaram ao local, desesperados. Uma mulher teria lançado os sapatos na pista e corrido gritando: “é meu irmão”. Um rapaz da família também chegou ao local e se deparou com a trágica cena.
Apesar de frequentar a área, a testemunha reluta em procurar a polícia para contar sua versão e diz estar traumatizada. Ela afirma conhecer o acusado de vista, já que atua na região e que ele seria um policial de boa conduta.
A testemunha questiona uma versão divulgada, de que o policial teria dado voz de prisão ao juiz e, em seguida, atirado. Segundo o trabalhador, o PM teria atirado duas vezes contra o motorista que vinha em sua direção, armado, porém com o revólver apontado para baixo. (LB/LV)
Fonte: Tribuna da Bahia