sábado, fevereiro 07, 2009

O castelo da Cinderela

Por: Carlos Chagas

BRASÍLIA - De repente, o grande assunto político de Brasília passou a ser o castelo da Cinderela, ou melhor, do deputado Edmar Moreira, do DEM de Minas Gerais. Não porque seja proibido possuir castelos, mesmo em pleno século XXI. Afinal, o Papa tem pelo menos dois, reis, presidentes e primeiros-ministros de diversas nações da Europa, Ásia, África e Américas, também, ainda que a prazo fixo, enquanto detiverem suas atuais funções.
O singular no caso do deputado é que o castelo dele é dele mesmo, ainda que passado em nome do filho, porque, mesmo deixando a Câmara, permanecerá proprietário de uma das mais fantásticas construções nacionais, com 36 suítes, várias torres, dezenas de salas de jantar, salões de estar, bibliotecas, piscinas e tudo o mais que se pense.
Vivemos num sistema capitalista, cada um tem o direito de gastar como quiser o seu rico dinheirinho, mas não deixa de ser singular a existência de um nababo desse quilate. Se mora lá ou não, trata-se de problema dele. Se enriqueceu criando e explorando empresas terceirizadas que prestam serviços ao poder público, da mesma forma não transgrediu a lei.
O que espanta é o fato de Edmar Moreira haver-se tornado corregedor da Câmara e haver sugerido que o Supremo Tribunal Federal passe a julgar seus colegas que atentarem contra o decoro parlamentar. Não é sempre que se vê um membro do Poder Legislativo abdicando de suas prerrogativas. Elas têm sido atropeladas pelo Executivo e pelo Judiciário, mas entregues de bandeja aos concorrentes parece inusitado. Qualquer dia, o representante mineiro poderá oferecer o palácio do Congresso para os demais poderes, quem sabe pretendendo que o Legislativo brasileiro passe a funcionar no seu castelo. Lugar não faltará.
Maquiagem
No Congresso sob nova direção, o primeiro debate quente entre governo e oposição aconteceu quinta-feira, quando PSDB, DEM, PPS e penduricalhos esparsos criticaram o governo por andar maquiando o PAC, ou seja, apresentando como se fossem novas obras uma porção delas já incluídas na programação do ano passado.
Assim, por exemplo, a ampliação do metrô do Rio de janeiro, o trem-bala interligando Rio e São Paulo e a exploração de petróleo abaixo da camada de pré-sal no litoral do Espírito Santo.
É da tradição brasileira governantes inaugurarem obras já inauguradas pelos antecessores, prática bem mais abominável do que essa agora descoberta nos desvãos do governo e, até prova em contrário, no gabinete da mãe do PAC.
Terá sido contágio, essa maquiagem orçamentária, depois da divulgação de que Dilma Rousseff contratou uma maquiadora para retocar todos os dias sua imagem. Nos dois casos, adiantará muito pouco. O eleitorado votará maciçamente em Dilma, se votar, por conta de sua competência no trato da coisa pública, não por haver trocado o batom vermelho por cor mais amena. Assim como a opinião pública aplaudirá as novas obras só se elas saírem do papel...
Delírios
Corre no Congresso que em encontro realizado ano passado, o presidente Lula, o governador José Serra e o governador Aécio Neves discutiram o futuro, chegando à curiosa projeção. Para início de conversa, os três teriam concordado em que a reeleição deve ser extinta, em troca de mandatos de cinco anos. Assim, José Serra seria eleito para o período de 2011 a 2015, sendo sucedido pelo presidente Lula, que governaria de 2016 a 2020. O presidente seguinte seria Aécio Neves, com idade bastante para aguardar e exercer o poder até 2025.
Só pode ser brincadeira, essa versão, que lembra muito a já conhecida conversa do Garrincha com Vicente Feola, no longínquo 1958. Recebendo instruções na véspera do jogo com a União Soviética, quando deveria pegar a bola, driblar três russos, chegar à linha de fundo e centrar rasteiro para o Vavá marcar, o genial craque indagou se o competente técnico havia combinado tudo com os adversários.
Começa que Lula não quer Serra, que, se porventura eleito, jamais apoiará o retorno do antecessor. Quanto a Aécio Neves, terá torcido a cara, porque ninguém sabe que potencial de popularidade poderá dispor daqui a vinte e três anos.
Indisposição partidária
Quem parece indisposto com a eleição de José Sarney para o Senado e Michel Temer para a Câmara é o governador Sérgio Cabral, do Rio. Primeiro porque não forma no time de nenhum deles, dentro do PMDB. Depois por não estar gostando nem um pouco dessa história de que Geddel Vieira Lima já é o companheiro de chapa de Dilma Rousseff, nas eleições presidenciais do ano que vem. Muito menos da proposta de que a reeleição deve ser extinta.
Cabral dispõe de linha direta com o presidente Lula, não avançou um comentário sequer sobre a sucessão, mantém-se muito mais ligado às diretrizes que o chefe do governo definirá no devido momento do que nas ilações feitas em torno de Sarney e Temer, sobre um apoiar Aécio Neves e o outro, José Serra. O Rio vem readquirindo seu peso específico na política nacional e os caciques poderão surpreender-se ainda este ano.
Fonte: Tribuna da Imprensa