Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA– Do jeito que as coisas vão, chegaremos ao segundo semestre com um milhão de novos desempregados, a contar de outubro do ano passado. Ou não foram 665 mil até dezembro, mais pelo menos 100 mil este mês?
Não se dirá que os empresários dão de ombros para o drama de seus ex-empregados. Devem estar sentidos, mas, para eles, tanto faz como tanto fez. Estarão garantidos pessoalmente.
Só que existe outro problema tão grande quanto o desespero dos que vai perdendo postos de trabalho, humilhados por precisarem recorrer ao pálido seguro-desemprego ou ao bolsa-família.
Do milhão acima referido, quantos não resistirão à tentação ou à compulsão de buscar a marginalidade? Se for 1%, serão dez mil, mas poderão ser bem mais optando pelo crime, em especial em grandes centros como São Paulo, Rio, Belo Horizonte e outros.
A falta de previsão tem sido característica centenária dos governos nacionais e estaduais. Preferem o imediatismo. Seria bom parar para pensar, especialmente numa hora em que o palácio do Planalto puxa a fila dos cortes orçamentários para enfrentar a crise. Gastos com esporte, turismo, meio ambiente e defesa foram reduzidos de forma drástica no plano federal, como informou ontem o ministério do Planejamento. Dirão os tecnocratas de Brasília que segurança pública não é com eles.
Trata-se de problema dos governadores, também empenhados em passar a tesoura nos respectivos orçamentos. Só que não é bem assim. Dotações do ministério da Justiça e das forças armadas relacionam-se com a proteção do cidadão, e sofrem cortes.
A conclusão surge amarga: para enfrentar o aumento da criminalidade seriam necessários investimentos imediatos nos setores policial e sucedâneos. Só que está acontecendo o oposto. Além de não crescer, o arcabouço da segurança pública diminui. Como parece inócuo sugerir que cada cidadão passe a adquirir a sua arma, dentro da campanha ainda vigente pelo desarmamento, a solução seria, no mínimo, para a população comprar cadeados, aprisionando-se em sua própria casa... O IMPÉRIO REDIVIVO? - O império romano saiu pelo ralo há mais de mil e quinhentos anos, mas, pelo jeito, alguns pretendentes a César não sabem disso. Querem reviver a máxima do “Roma locuta, causa finita est”. A pressão do governo da Itália sobre o Brasil é inamissível, em pleno Século XXI, para a extradição de um italiano misto de terrorista, dissidente e diletante. Até na Gália os romanos respeitavam usos, costumes e leis das populações que dominavam. Ironicamente, o primeiro-ministro Berlusconi quer de volta um César de sobrenome Battisti, condenado em seu país de origem à prisão perpétua.
Para começo de conversa, o ministro Tarso Genro, da Justiça, aplicou a lei brasileira, apoiado pelo presidente Lula. Foi dado refugio ao indigitado cidadão, mesmo assim ainda preso na cadeia de Brasília. O Procurador-Geral da República, Antônio Fernando de Sousa, recomendou o arquivamento do processo de extradição, aberto pelo governo da Itália. Caberá ao Supremo Tribunal Federal a última palavra.
O problema é que Berlusconi determinou a convocação do seu embaixador, Michele Valensise, que por sinal embarcou há pouco para Roma. Um ato hostil, desnecessário e irrelevante, a menos que Força Aérea italiana se encontre de motores ligados para sobrevoar o Atlântico, num ato de ópera bufa.
CONSAGRAÇÃO - A bancada do PMDB no Senado homologou ontem a candidatura de José Sarney à presidência do Senado. Quase unanimidade, já que faltaram três. O ex-presidente está apoiado, também, pelo PSDB, o PTB e penduricalhos, além de parte do DEM. Está eleito, salvo reviravolta impossível.
Deixando para segunda-feira saber quantos votos o deputado Michel Temer perderá em sua escolha mais do que certa para a presidência da Câmara, e feita também à ressalva para os inusitados, a pergunta que surge é sobre o futuro.
Sarney e Temer são confiáveis para o presidente Lula, em termos da candidatura de Dilma Rousseff ao palácio do Planalto? É bom marcar coluna do meio. Nenhum dos dois avançou declarações de entusiasmo a respeito da possibilidade de a chefe da Casa Civil disputar a presidência da República indicada pelo PT.
Vão assumir a direção do Congresso entoando juras de amor à preservação da aliança do PMDB com o governo, mas guardarão distância razoável de qualquer engajamento prévio com a candidata. Será preciso aguardar as pesquisas e, nelas, os percentuais de Dilma, até agora restritos a um dígito.
Variáveis de diversas espécies serão consideradas. E se o presidente Lula acabar aceitando o terceiro mandato? Aécio Neves pode constituir-se numa opção, caso troque o ninho tucano pelo PMDB? E José Serra, deve ser considerado adversário?
Por tudo isso, melhor aguardar. De início, os discursos de posse dos dois caciques peemedebistas.
ALÉM DAS ENCHENTES - Depois da tragédia em Santa Catarina, ano passado, a natureza tem sido cruel para capitais como São Paulo, Rio, Belo Horizonte e outras. Mesmo cidades de densidade populacional menor sofrem com as chuvas, como raras vezes tem acontecido no país.
A explicação é uma só, lá e cá: sem exceção, tornaram-se insuficientes as galerias de escoamento das águas. As bocas de lobo entupiram, os rios são permanentemente assoreados com lixo, sujeira e esgotos.
O êxodo rural e o crescimento desordenado de favelas e mocambos vem sendo responsável por situações hoje impossíveis de ser enfrentadas. Décadas atrás, no Rio, frente a sucessivos incêndios em grandes prédios, um singular comandante do Corpo de Bombeiros aconselhou a população a comprar cordas, já que as escadas da corporação não chegavam aos andares mais altos. Se estivesse vivo, certamente iria sugerir que cada família adquirisse botes salva-vidas.
Obras de saneamento costumam não dar votos. Não aparecem. Há muito que as autoridades públicas desinteressaram-se de fazer em nossas capitais aquilo que Paris, Londres, Nova York e outras cidades fizeram ainda no século XIX. O principal, porém, seria evitar o crescimento desordenado dos grandes centros e até dos médios. Mas fixar o cidadão no interior, de que forma? Há quem ponha a culpa no agro-negócio...
Fonte: Tribuna da Imprensa