terça-feira, outubro 28, 2008

A Crise Sistêmica do Capitalismo

Por Renato Prata Biar 28/10/2008 às 00:37
A crise sistêmica pela qual passa o capitalismo é realmente esclarecedora e reveladora do que é esse sistema e quais são suas reais prioridades.
A crise sistêmica do capitalismo A crise sistêmica pela qual passa o capitalismo é realmente esclarecedora e reveladora do que é esse sistema e quais são suas reais prioridades. Em pouco mais de trinta dias após o pico da crise, em 15 de setembro, os bancos centrais da Europa e dos Estados Unidos (sem contar com os bancos centrais dos países asiáticos) já desembolsaram mais de cinco trilhões, entre dólares e euros, para salvar financeiras, bancos, seguradoras, etc. Entretanto, para que fosse possível alcançar a meta traçada pelo projeto, Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, proposto pela ONU, para a diminuição da pobreza, da mortalidade infantil e materna, saneamento básico, acesso à água potável, etc., seria necessário (de 2006 até 2015) o equivalente a 1,2 trilhões de dólares. Ou seja, em pouco mais de um mês já foi gasto, para socorrer estelionatários, gangsteres, bandidos, etc., praticamente cinco vezes aquilo que seria necessário para que se diminuísse drasticamente a miséria no mundo, e num prazo de nove anos. Para a efetiva consagração dessa vergonha e dessa ignomínia sem precedentes na história da humanidade, mais uma vez o discurso do medo e do pânico, que paralisa a população e cria o consenso ideal para legitimar a aplicação das medidas políticas e econômicas necessárias à manutenção do status quo, é colocado na ordem do dia. A todo o momento é repetido à exaustão o discurso de que deixar essas instituições falirem é pior para a população. O fantasma do desemprego é o marketing mais eficaz para manter a população pacata, amedrontada e, ao mesmo tempo, confiante de que seus respectivos líderes e representantes políticos encontrarão uma saída para a crise. Os mesmos que ficaram bilionários com a especulação e a jogatina do mercado, agora se dizem preocupados com os menos abastados e pedem, sem nenhuma vergonha ou pudor, pela intervenção do Estado. Porém, o que aconteceu e está acontecendo até o momento, é a premiação com dinheiro público dos responsáveis diretos pela crise. Os mesmos que vociferavam contra a regulamentação do mercado através do Estado, hoje se colocam não como autores desse sistema, mas como vítimas dele. Como se toda a especulação e volatilidade tivessem surgido do nada; algo exógeno às suas ações. Portanto, a melhor denominação para essas medidas de salvamento dessas instituições financeiras é o título de uma carta que o cineasta Michael Moore escreveu ao povo estadunidense: ?O assalto do século.? O Brasil, por exemplo, já sofreu o seu grande assalto durante o governo FHC, quando foi criado o PROER, em 1995, para salvar alguns bancos da falência. Nesse programa, foram gastos cerca de 25 bilhões de reais (sendo 100% de dinheiro público) para ajudar os pobres banqueiros das conseqüências de seus instintos gananciosos e incompetentes. Também o processo de privatizações foi um verdadeiro assalto aos cofres e ao patrimônio público. Para exemplificar aquilo que foi a regra nas privatizações das empresas estatais, basta citar apenas o caso da Vale do Rio Doce. Esta empresa foi vendida por 3,3 bilhões de reais (quantia inferior ao lucro auferido semestralmente pela empresa) e, como se não bastasse, o dinheiro utilizado para a compra da Vale, foi emprestado pelo BNDES ao seu comprador. Ou seja: nós pagamos para que uma empresa estrangeira comprasse uma das mais lucrativas, maiores e mais importantes empresas brasileiras. Teria saído mais barato e seria menos vergonhoso para a população brasileira se essas estatais tivessem sido ?apenas? doadas. Mas voltando à questão da crise mundial, o que se pretende salvar hoje no mundo, com dinheiro público, é um sistema que foi responsável pela decadência de todos os índices sociais, em âmbito mundial, durante as mais de três décadas de sua vigência praticamente hegemônica. Basta comparar a era neoliberal com a era do Estado do Bem-estar social ( esta vigorou do pós 2ª Guerra até meados da década de 1970) para comprovar que tudo aquilo que é realmente de interesse da grande maioria da população: emprego, renda, saúde, educação, segurança, alimentação, etc. foi drasticamente deteriorado durante a aplicação dessa ideologia pró-mercado. Apenas para deixar claro, não vai aqui nenhum saudosismo e nem tampouco uma apologia ao keynesianismo e seu Estado do Bem-estar social, já que este também não passa de outra ideologia puramente capitalista. Destarte, aquilo que mais preocupa nessa crise não é somente o seu agravamento, mas as soluções que serão buscadas para a salvação do sistema capitalista. Na crise de 1929, o que salvou o capitalismo não foi nenhuma medida milagrosa e nem tampouco algum super-herói (como gostam de colocar os estadunidenses) como o presidente F. D. Roosevelt e seu New Deal. Como disse o saudoso economista Lauro Campos num discurso proferido no Senado Federal em 09/06/2000: ?Roosevelt disse ? está publicado no livro ?Os Mil Primeiros Dias? de seu secretário: ?Aquilo que estou fazendo nos Estados Unidos é a mesma coisa que Stalin fez na Rússia e que Hitler faz na Alemanha. Mas estou fazendo de forma mais ordeira. ?. Então, o que Roosevelt, o democrata, fazia nos Estados Unidos para salvar o capitalismo era a mesma coisa que Hitler tinha feito na Alemanha para salvar o capitalismo alemão, com 45% de desemprego, em 1933. E os Estados Unidos, naquela época tinha 25% de desemprego. Então, o governo teve de gastar em qualquer coisa, principalmente, como Keynes fala seis vezes no seu livro ?A Teoria Geral?, em guerra muito bem remunerada, com os fornecedores de partes e equipamentos bélicos, como aviões, navios, etc. Em 1939, o governo-norte americano decuplicou as despesas de guerra e, então, acabou o desemprego.? Portanto, a salvação do capitalismo foi a 2ª Grande Guerra, que possibilitou uma reorganização da produção mundial, a qual se voltou para a destruição (armas, artefatos de guerra, etc.). Uma produção voltada para as não-mercadorias, não-meios de produção e não-meios de consumo. Uma produção direcionada não para as necessidades básicas e naturais do ser humano, mas, sim, para suprir as necessidades de um sistema que submete o público ao privado, o interesse coletivo ao individual e, principalmente, que submete o valor incomensurável da vida à ganância pelo lucro e pela acumulação de riqueza. Não é por acaso que o clima típico da época da Guerra Fria, já está esquentando entre as grandes potências mundiais... É esperar para ver.
Renato Prata Biar; historiador; Rio de Janeiro; R.J.
Fonte: CMI Brasil