SÃO PAULO - Enquanto o criminalista Nélio Machado exaltava nominalmente o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, pela concessão do habeas corpus em favor de seus clientes e criticava duramente a Polícia Federal, o Ministério Público e a primeira instância da Justiça em entrevista coletiva no escritório do Opportunity em São Paulo, o banqueiro Daniel Dantas era preso novamente pelos federais no nono andar de um prédio na Avenida Nove de Julho, o endereço de Machado na capital paulista.
Sob o pretexto de que esclareceria a participação do banqueiro em todas as acusações da Operação Satiagraha, o advogado de Dantas discursou por quase 30 minutos contra a atual estrutura do Judiciário no País. Acusou a PF, o Ministério Público e juízes de formarem um "triunvirato acusatório" que estaria perseguindo e retaliando seus clientes, que seriam vítimas da "tortura branca" das prisões "espetacularizadas" da PF.
"Nós temos tido uma ideologização da prática persecutória, de tal modo que as pessoas estão sendo linchadas em praça pública como se estivéssemos na época medieval", bradou Machado, comparando a primeira prisão de Dantas e sócios do Opportunity aos julgamentos do período nazista.
O advogado intercalava os ataques aos elogios a Gilmar Mendes, "juiz da maior reputação, da maior credibilidade". "Não fora assim não seria nem ministro do Supremo, e menos ainda presidente daquela corte", disse Machado, considerando a liminar de Mendes, que libertou na madrugada de quarta-feira seus clientes, "efetivamente um passo marcante no sentido da independência do Judiciário".
Mesmo as perguntas sobre os grampos em que emissários de Dantas teriam afirmado que o banqueiro temia a PF e a primeira instância da Justiça, e que ele teria o controle no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no STF, serviram como mote para exaltar o presidente do Supremo. "Se ele (Dantas) disse isso, o que eu posso imaginar é que ele empresta uma confiança que até me lisonjeia como advogado dele. Agora, desconheço essa declaração e, se ela foi proferida de fato, ela decorre de uma visão otimista como eu afirmei que eu ainda acreditava no ministro Gilmar Mendes."
Machado criticou o juiz que decretou as prisões dos mandatários do banco Opportunity, Fausto Martin De Sanctis, por supostamente desrespeitar reiteradamente ordens de tribunais, do STJ e do STF, de repassar dados sobre o procedimento investigatório contra o Opportunity. "Um juiz de nível hierárquico inferior tem que acatar ordem de tribunal", disse. "E aí vai o despacho (das prisões), cheio de lugar comum, vazio, com presunções, com juízos hipotéticos."
Em perguntas pontuais, como qual seria a relação de Dantas com Humberto Braz e Hugo Sérgio Chicaroni, que teriam negociado a propina para um delegado federal, Machado alegou não ter tido acesso aos autos e deu respostas evasivas. "Eles se conhecem, não há dúvida. Mas eu posso afirmar que Daniel Dantas não tem relação nenhuma com o (ex-prefeito) Celso Pitta." Disse ainda que Naji Nahas seria adversário empresarial de Dantas, embora admita que mesmo assim fosse "possível que eles tenham se falado por telefone".
Machado voltou a falar de depoimentos na Justiça americana e principalmente na italiana, que demonstrariam as motivações para o que chamou de perseguição a Dantas. Questionado sobre o teor dessas denúncias, disse apenas que o ex-vice-presidente da Telecom Itália no Brasil, Angelo Jannone, tinha declarado que "manipulava e mandava na Polícia Federal no Brasil" e que isso teria sido ignorado pelo Ministério Público.
O advogado de Dantas recuou das ameaças de revelar motivações políticas para as supostas perseguições ao Grupo Opportunity, mas sinalizou que seu cliente seria vítima do atual governo ao dizer que, desde 2002, Dantas tem sofrido com investigações da PF, trabalho que teria se intensificado muito a partir de 2004.
Ao final da entrevista, por volta das 15h30, Machado afirmou que seus clientes, "de maneira muito suspeita", tinham sido convocados para depor na PF. Aconselhado pelos advogados que o acompanhavam, pediu para encerrar a entrevista. Disse que não queria fugir do debate e que não poderia estender a entrevista.
Nesse momento, Dantas era novamente preso pelo delegado Protógenes Queiroz, desta vez acusado de mandar pagar US$ 1 milhão para ter seu nome, de sua irmã e filho retirados de uma investigação policial.
Fonte: Tribuna da Imprensa