segunda-feira, junho 30, 2008

Coisas da política: O Estado Nacional e os seus inimigos

Mauro Santayana
Ainda que com atraso, moveu-se o governo no caso das organizações não-governamentais, essa invenção dos neoliberais para destruir, de dentro para fora, os estados nacionais periféricos. Investigação preliminar, em nosso país, descobriu que há mais de 100 mil dessas organizações sem o controle do Estado. Grande parte delas recebe dinheiro público e dele não presta contas. Na Amazônia, há 469 entidades estrangeiras em ação, mas só 27 registradas. Dessas, sete estão sob suspeita de tudo, até mesmo de substituir ritos religiosos indígenas por outros (sem falar na clássica evangelização que, no fundo, é a mesma coisa). Segredos da medicina indígena são surrupiados por algumas, outras se apropriam de sementes e animais da biodiversidade amazônica. Há também as que saqueiam minerais raros, diamantes e outras pedras preciosas. Tudo vem sendo contrabandeado.
Mesmo que todas essas organizações fossem honradas; que não houvesse as que roubam e sustentem, com salários altos e vantagens adicionais, os espertalhões que as criam, seriam danosas, por servirem numerosas delas a potências estrangeiras e exercerem, todas elas – sem a legitimidade da representação política – poderes e deveres do Estado Nacional.
Os Estados constituídos devem cuidar dos membros da comunidade nacional, garantindo-lhes a educação, a assistência médica, a previdência social, o direito ao trabalho e a segurança pública. Eles surgiram exatamente para buscar a igualdade de direitos e, assim, impedir o domínio dos fortes contra os fracos. Essa é a função primordial do poder político, que não pode, nem deve, transferir a organizações não-governamentais o que é próprio do Estado.
O processo de privatização iniciou-se durante o governo militar, com a entrega a terceiros de funções que sempre foram soberanas do Estado. Isso se tornou clamoroso com a criação de empresas de segurança, muitas delas dirigidas por oficiais reformados das Forças Armadas ou da Polícia Militar, a fim de substituir o Estado na proteção aos bens e às pessoas. Coube a dois governos ditos democráticos, o de Collor e de Fernando Henrique Cardoso, seguir o Consenso de Washington e ampliar a privatização do Estado.
O fato é que o Estado, em lugar de empregar ele mesmo os recursos tributários na prestação dos serviços públicos, transfere a organizações privadas sua responsabilidade sobre eles, e entrega o dinheiro do contribuinte, sem sua aquiescência, a organizações privadas.
Elas agem à margem dos governos dos países periféricos, com estrutura independente e paralela, mesmo que recebam subsídios do erário, como ocorre no Brasil. De acordo com dados preliminares, quase 50 bilhões de reais em cinco anos (de 2002 a 2007) lhes foram entregues: cerca de 10 bilhões por ano. Algumas, tenham ou não recebido dinheiro brasileiro, estão associadas, desde o início, aos governos dos grandes países. É esse o caso da WWF, cujo presidente é o Duque de Endimburgo, o príncipe consorte da Inglaterra. Além disso, contam com recursos de grandes corporações multinacionais, que as utilizam para fins bem específicos – como é o caso das gigantescas indústrias farmacêuticas.
As medidas anunciadas pelo governo são ainda tímidas, e se resumem em classificar essas entidades de acordo com sua origem e finalidade. A solução seria a de só autorizar aquelas que, criadas bem antes da era Reagan-Thatcher, comprovaram sua seriedade e a sua necessidade, como é o caso da Cruz Vermelha Internacional e algumas mais. As outras devem ser convidadas a fechar as suas portas. Que o governo assuma a sua responsabilidade. Para isso dispõe de receitas orçamentárias.
Duas matérias publicadas ontem pelo JB chamam a atenção por sua importância. O economista Luis Gonzaga Belluzzo volta a criticar os desvarios do capitalismo neoliberal e recomenda o retorno às teses de Keynes. A outra, de Ludmilla Totinick, mostra como o Brasil se transformou no paraíso das multinacionais que multiplicam seus lucros com o real supervalorizado e os remetem, sem controle, às matrizes. Os dois textos recomendam ao governo exercer controle fiscal sobre essas empresas, a fim de que suas contas sejam transparentes, e não ocultem, como hoje, seus lucros reais – e recolham os impostos devidos.
Fonte: JB Online