"É uma praga", diz o presidente da CPI dos Grampos, Marcelo Itagiba, sobre a "banalização" das escutas. "O grampo é medida extrema. Não está havendo o cuidado necessário na concessão de autorizações."
PERGUNTA - Os políticos são o alvo dos grampeiros?
MARCELO ITAGIBA - Também são. Um caso emblemático ocorreu com o presidente Lula. Funcionários da empresa Oi alegam ter encontrado indícios de escuta numa linha direcionada ao presidente no Hotel Glória, no Rio. O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, foi grampeado em casa, no Rio. Uma linha do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi monitorada em Petrópolis. Queremos saber quais medidas foram adotadas pelo Gabinete de Segurança Institucional, se foi aberto inquérito pela Polícia Federal. Se o presidente e um ministro do Supremo podem ter sido grampeados, já dá para calcular o alcance disso.
Que país é esse em que 1,2 mil grampos são instalados todo dia?
Isso demonstra que um instrumento excepcional, que deve ser utilizado no combate ao crime organizado, à corrupção e ao colarinho branco, está sendo banalizado de forma assustadora. Somos 180 milhões. Pelo menos 4 milhões de cidadãos estão sob escuta se levarmos em conta que cada grampeado se comunica com pelo menos 10 interlocutores todo dia. O grampo é medida extrema. Não está havendo o cuidado necessário na concessão de autorizações. Há casos em que a escuta se prolonga por até 900 horas. Os juízes efetivamente ouvem tudo o que foi captado? Ou apenas aquilo que foi selecionado para formar a sua convicção e, a partir daí, condenar ou absolver?
Por que os agentes policiais responsáveis pelas degravações só apresentam resumos dos grampos?
Essa é uma grande preocupação nossa, a questão do devido processo legal e a forma como essa interceptação é tratada como prova dentro dos autos. Se ela é uma prova técnica tem que ser toda degravada, periciada. A interpretação tem que ser aquela que o juiz vai dar, não a de terceiros. Toda conversa é feita dentro de um contexto. Quem avalia a prova é o juiz. Os juízes não têm condições de ouvir tanta coisa. Eles admitem isso.
Qual a proposta da CPI?
Há certos tipos de crimes que precisam ser mantidos sob monitoramento por um prazo superior. O seqüestro, por exemplo, é crime permanente. Mas para outras situações é preciso estabelecer um limite. A CPI busca uma radiografia do sistema de interceptação telefônica no País. A partir daí vamos fazer um diagnóstico e apresentar soluções. A CPI atua em três áreas. Queremos saber sobre a interceptação legal, autorizada pela Justiça. A segunda questão é a escuta ilegal. E o terceiro foco são os equipamentos do grampo, quem produz, a quem são comercializados.
Já viu tanto grampo assim?
Nem na ditadura tinha tanta escuta. Hoje tem o grampo ilegal e o grampo legal, revestido de legalidade, mas que não sofre controle estrito necessário nesse tipo de atividade. Um problema gravíssimo: a Constituição define que cabe à polícia judiciária, ou seja, à Polícia Civil nos Estados e à Polícia Federal, o papel da investigação por meio da instauração de inquérito. Ocorre que outros órgãos, como o Ministério Público, também pedem grampo e chegam a executá-lo.
Como evitar que um grampo legal não se transforme em bisbilhotagem policial?
Os juízes têm de exercer o devido controle sobre aquilo que autorizam. Mas isso não ocorre. O Ministério Público também deve fazer parte dessa cadeia de controle. Só que para fazer isso não pode grampear. A escuta só pode ser consentida em inquérito policial.
Fonte: Tribuna da Imprensa