Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Não poderia ter sido mais infeliz a senadora Ideli Salvatti, líder do PT, após justificar por que a CPI dos Cartões Corporativos não deveria convidar para depor, como não convidou, a ministra Dilma Rousseff. Disse a representante de Santa Catarina, em entrevero com a senadora Marisa Serrano, que por ser chefe da Casa Civil e, talvez, por sua importância em 2010, Dilma não poderia ser submetida a interrogatório.
De forma oficial, ficou demonstrado que os detentores do poder dividem o País em duas categorias: os cidadãos de primeira e os cidadãos de segunda classe. As cidadãs também.
Ficou mal para todo mundo. Para o governo, que Ideli representava, por tentar blindar uma de suas principais figuras. Para a CPI, que não teve número suficiente para afirmar suas prerrogativas, já que a maioria de seus integrantes votou com a líder do PT. E para a ministra Dilma Rousseff, que se não tem nada a esconder, deu a impressão de ter.
Continua grande o festival de contradições no mais novo capítulo dos cartões corporativos. Afinal, quem preparou o dossiê referente aos gastos do ex-presidente Fernando Henrique e sua mulher? Se não foi a Casa Civil, como disse a ministra, que misterioso computador da Presidência da República continha aquelas informações, segundo ela acrescentou?
No fundo, o dossiê não deveria ter vindo a público. Serviria apenas para intimidar o PSDB, impedindo seus parlamentares de exigir a abertura dos gastos do presidente Lula. Divulgado em parte, o relatório teve o efeito de um tiro saindo pela culatra.
O singular nessa história é que, como em muitas outras anteriores, o presidente Lula ficou de fora. Mais essa lambança deixou de respingar nele. Quanto ao vaticínio condicional da senadora Ideli Salvatti, sobre 2010, será bom aguardar. Pode ser que Dilma Rousseff emplaque como candidata, pode ser que as pesquisas continuem omitindo suas chances.
A companheira pode ser vista todas as semanas acompanhando a campanha do presidente Lula em torno das obras do PAC, pelo País. Aprendeu a sorrir, a comportar-se como princesa herdeira do trono. Pode estar havendo um grande equívoco nessa operação. As características positivas de Dilma são opostas: é a dama de ferro, inflexível, nacionalista ao extremo, empenhada em fazer funcionar a máquina administrativa federal. Nenhuma dessas qualidades vem sendo apresentada nessa exposição preliminar, mas se vier a ser candidata, dificilmente se elegerá por conta dos sorrisos e dos acenos à multidão.
Esta semana a chefe da Casa Civil comparou o crescimento do Nordeste ao crescimento da China. Com todo o respeito, é bom lembrar que lá prevalece a imposição do partido único, de certa forma o fator responsável por tudo o que acontece. Se existe uma semelhança, ela se refere aos salários: tanto o trabalhador chinês quanto o nordestino recebem uma miséria. Predomina o trabalho quase escravo, chamariz principal para que as multinacionais se estabelecessem no litoral da China, faturando alto e, ironia dos tempos atuais, fornecendo àquele país condições de desenvolvimento.
Só depois das eleições municipais
No palácio do Planalto continua germinando, mesmo feito plantinha tenra, a idéia de ampla reforma do ministério, mas com uma condicionante: nada acontecerá antes de conhecidos os resultados das eleições municipais de outubro. Os ministros porventura candidatos a prefeituras, como Marta Suplicy, Luiz Marinho e, quem sabe, Patrus Ananias, obrigados a desincompatibilizar-se, serão substituídos por auxiliares ou por técnicos sem conotação partidária.
Só depois de abertas as urnas e ficar definida a ação dos partidos é que o presidente Lula deverá debruçar-se na busca de mais eficiência para o seu governo. Enquanto percorre o País, fiscalizando as obras do PAC, ele aproveita para verificar que ministros deixam a desejar e quais os que correspondem à sua expectativa. Mas não afastará nenhum, como regra.
A grande pergunta por enquanto sem resposta é sobre a performance do PT. Pelo jeito, o partido pretende ter candidatos próprios nas disputas por quase todas as prefeituras das capitais e das principais cidades. Vitoriosos, os companheiros darão a tônica dos derradeiros dois anos de governo Lula, 2009 e 2010 e encontrarão campo livre para desenvolver proposta, hoje tida como sacrilégio, a do terceiro mandato. Derrotados, ficarão expostos à escolha de um candidato saído de um dos partidos da base de apoio do palácio do Planalto.
Assim, por enquanto, todos os ministros estão garantidos, mesmo aqueles que há seis meses não despacham com o presidente da República.
Fonte: Tribuna da Imprensa