Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Pesquisa divulgada pela "Folha de S. Paulo" deu conta, no dia da votação, que 43 senadores condenariam Renan Calheiros. Revelado o total do painel de votações secretas, foram 48 pela absolvição e 29 pela condenação. Significa o que essa falta de sintonia? Senadores mentiram para os repórteres do matutino paulista? Os coleguinhas desaprenderam a somar? Muitos senadores mudaram de opinião, em menos de um dia?
Pode ser, mas a verdade está no fato de que opinião pública e opinião publicada são realidades distintas. A partir do resultado, a quase unanimidade da mídia chegou de tacape e borduna em cima do Senado, imaginando-se o que publicarão as revistas de fim de semana. A instituição parlamentar está sendo posta em frangalhos, concluem os veículos de comunicação, porque os senadores deixaram de cassar o mandato de Renan. Liminarmente, condena-se aqueles que absolveram o representante de Alagoas.
É preciso ir com cuidado. Não se tem notícia, ao menos por enquanto, de multidões indignadas estarem ocupando praças e avenidas para protestar contra a decisão do Senado. Não parece nem aí para o resultado o cidadão comum, aquele que forma a opinião pública. E que cada vez mais desconsidera a opinião publicada. Trata-se de um risco para a nossa profissão que deveria voltar-se, em essência, para informar.
Obviamente que opinar também é lícito, até necessário, mas certos barões da imprensa estão invadindo áreas acima e além de suas responsabilidades. Obrigam o profissional da informação a pensar e a atuar conforme suas idiossincrasias e seus amuos. Ou seus interesses, entre os quais sobressai a desmoralização das instituições, mecanismo ilusório para conquistar leitores, telespectadores, ouvintes e anunciantes.
Renan Calheiros quebrou ou não o decoro parlamentar? O mais provável é que tenha quebrado, tornando-se obrigação da mídia pesquisar por que seus colegas decidiram diferente. Daí a denegrir o Senado, porém, a distância é imensa.
Como recuperar a imagem?
Mesmo sem estar posta em frangalhos, nem tão desmoralizada como parte da mídia pretende, a imagem do Senado necessita de recuperação. O diabo é que, com todo o respeito, carecem de condições para esse objetivo Garibaldi Alves, Waldir Raupp, Neudo do Couto, José Maranhão, Edison Lobão e outros menos falados como pretendentes à presidência da casa. Trata-se de uma espécie de cisma nascendo na Câmara Alta, situação em que pouco adiantam sermões de párocos, bispos e até cardeais. Só uma encíclica do papa botaria ordem na confusão.
Traduzindo: os senadores do governo e da oposição necessitam livrar-se de questiúnculas e ciumeiras para escolher um presidente capaz de restabelecer a majestade do cargo e o respeito das demais instituições nacionais. Para ficar no PMDB, com direito à indicação por tratar-se da maior bancada, existem opções. Poucas, mas efetivas: José Sarney, Pedro Simon e Jarbas Vasconcelos, por exemplo.
Adiamento tático
O presidente Lula adiou, por enquanto por cinco dias, o encontro que teria em La Paz, terça-feira, com o presidente Evo Morales. O motivo alegado foi a necessidade de estar em Brasília para operar a prorrogação da CPMF, cujo resultado ainda permanece indefinido. Estaria tudo bem se nos dias próximos o presidente Lula não fosse a Buenos Aires e Caracas, conforme sua agenda.
Na verdade, o adiamento da viagem deve-se ao fato de não haver perspectiva de entendimento entre Brasil e Bolívia a respeito do gás. Morales exigiu novos e vultosos investimentos da Petrobras em seu território, sob pena de expulsá-la, mas, de forma deselegante, mandou dizer que não garantia o envio de um galão, sequer, para nós.
Isso significa que vamos botar dinheiro bom numa empreitada ruim, sem garantia de retorno. Como precisamos do gás que eles já nos exportam, também à custa de nossos investimentos, o remédio continua sendo negociar, mesmo em situação de inferioridade. Mas tudo tem limite, advindo daí o adiamento da visita de Lula ao companheiro boliviano.
Razão mesmo tinha o tonitruante general-presidente Ernesto Geisel, botando para fora de seu gabinete o ministro que sugeria investimentos da Petrobras na Bolívia. Ao rejeitar a proposta, ainda comentou: "E depois, quando eles descumprirem os contratos, você vai liderar as tropas do Exército atravessando a fronteira?"
"Recebi e já respondi"
Magalhães Pinto e José Maria Alckmin eram mineiros, deputados e adversários. Mantinham diálogo respeitoso e cordial. Magalhães ia pelos corredores do Palácio Tiradentes, a antiga Câmara Federal, no Rio, acompanhado do jornalista Villas-Boas Corrêa, quando viu Alckmin caminhando em sentido contrário. Lembrando haver esquecido o dia anterior, quando deixou passar em branco o aniversário do colega, ao abraçá-lo, indagou: "Recebeu meu telegrama de felicitações?" Resposta: "Recebi e já respondi."
Por que se conta essa história plena de mineiridade?
Porque é o que falta ao presidente Lula e aos líderes do DEM para continuarem seguindo seus caminhos distintos e até conflitantes, mas sem necessidade de agressões verbais. Importa menos saber quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha. Se foi o Lula que começou ou se foram os democratas a agredi-lo primeiro. O problema é que a briga não favorece a ninguém. Pelo contrário.
Fonte: Tribuna da Imprensa