Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - No último dia 17 o presidente Lula enviou ao primeiro-ministro da Dinamarca, Anders Rasmussen, o seguinte telegrama: "Recebi com especial satisfação a notícia da vitória de Vossa Excelência no pleito eleitoral realizado dia 13 de novembro. Sei que se trata da terceira vez que o povo dinamarquês confia a Vossa Excelência a elevada tarefa de conduzir o governo da Dinamarca, fato que demonstra o sucesso de sua administração.
Antecipo a satisfação que terei de dar continuidade aos profícuos entendimentos que tivemos quando da visita de Vossa Excelência ao Brasil, em abril deste ano, bem como por ocasião de minha visita à Dinamarca em setembro último, da qual guardo as melhores recordações. Estou certo de que nosso trabalho assinala a elevação do relacionamento entre nossos países a novos patamares de excelência.
Peço-lhe receber, juntamente com minhas sinceras felicitações, os votos de sucesso e de felicidade pessoal, que estendo a todo o povo dinamarquês. Mais alta estima. Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República Federativa do Brasil."
Trata-se de mensagem protocolar, em resposta a um comunicado do primeiro-ministro reeleito pela terceira vez, mas, convenhamos, que hora mais desastrada para elogiar a permanência de um governante em função do sucesso administrativo.
Pelos comentários anteriores do presidente Lula, Anders Rasmussen é mais um a integrar a lista encabeçada por Margaret Thatcher, John Major, Tony Blair, Felipe Gonzalez, Helmut Kholl, François Mitterrand e quantos mais que permaneceram à frente de governos por longos períodos, sem restrições diante de um bom desempenho administrativo. Entenda quem entender, mas se o ponto central das reeleições reside na capacidade do governante, abre-se larga avenida para a aplicação do princípio em qualquer sistema de governo, parlamentarista ou presidencialista...
O cobertor é curto
A se confirmar a informação de que o Palácio do Planalto prepara projeto de reforma política a ser enviado ao Congresso, a primeira dúvida refere-se à mudança de estratégia. O presidente Lula sempre declarou ser a reforma política assunto exclusivo do Congresso. Algum motivo existe para agora mergulhar de cabeça na questão, prestes a propor o financiamento público das campanhas, fidelidade partidária e votação em listas fechadas nas eleições proporcionais. Revelam fontes oficiais estar a decisão fundada no fato de que o Judiciário vem ocupando espaços do Legislativo, numa distorção óbvia do equilíbrio entre os poderes.
O problema é parecido com aquele do cobertor curto: para esquentar a cabeça, esfria os pés. E vice-versa. Porque se a intromissão do Judiciário nas atribuições do Congresso constitui uma aberração, diferente não será a iniciativa do Executivo. Afinal, já tramitam dezenas de projetos de reforma política na Câmara e no Senado. Se não andam, até mais vagarosos entre os deputados do que entre os senadores, trata-se de assunto deles. A interferência do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral na fidelidade partidária chocou muita gente, mas só aconteceu por conta da inação parlamentar.
Agora, diante de uma proposta do Executivo, fica evidente que funcionará a maioria governista. Pode ser que desta vez se concretize a reforma política. Mas com uma pergunta fundamental: que reforma política? A do Palácio do Planalto ou a do Congresso?
Haverá um acréscimo a fazer. Se a hora é de mudar as regras, quem garante que não aparecerá um companheiro qualquer sugerindo outras alterações além das formalizadas pelo governo? Que tal incluir no pacote sugestão de emenda constitucional admitindo o terceiro mandato? É bom tomar cuidado, porque os objetivos de um podem não ser os dos outros...
Desfaçatez
Destaca-se uma incongruência no documento base dos tucanos, espécie de plano de vôo para a sucessão presidencial divulgado durante a Convenção Nacional do PSDB agora realizada em Brasília. Trata-se do alerta contra o continuísmo, incluído no texto por inspiração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
É desfaçatez demasiada. Quem denuncia a possibilidade da permanência do presidente Lula no poder por um terceiro mandato é o criador da lambança, aquele que forçou o Congresso a permitir que disputasse mais um período de governo no exercício do próprio, sem desincompatibilizar-se. Admite-se, até, naqueles idos, o emprego de métodos pouco ortodoxos para a conquista de votos na Câmara dos Deputados. Como, agora, vem o maior artífice e beneficiário da reeleição denunciar o continuísmo por ele inaugurado? Certas coisas, só no Brasil.
Tucanos e camaleões
Transcorria sessão monótona da Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicação do Senado quando o presidente, senador Wellington Salgado (PMDB-MG), resolveu despertar as atenções. Mandou entregar ao senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) um tucano de madeira, com bico e tudo. Como reação, o paraense aproveitou para exortar o PMDB a também adotar um bicho qualquer como símbolo. E sugeriu, significativamente, o camaleão. (Pano rápido.)
Fonte; Tribuna da Imprensa