Leandro Mazzini
BRASÍLIA. Mojuí, no Pará, e Charlau, no Rio Grande do Sul, são dois distritos de Santarém e Novo Hamburgo, respectivamente, onde a população vive a expectativa de ter um prefeito que atenda às suas reivindicações. São apenas dois casos entre 817 distritos que querem entrar oficialmente no mapa do Brasil como municípios. E, se vingar uma articulação em andamento no Congresso, isso pode acontecer em pleno ano eleitoral, aumentando em muito as chances de candidatos que vão prometer mundos e fundos a esses redutos.
Os 817 distritos estão na fila para emancipação, segundo levantamento nacional feito pela Associação Gaúcha das Aéreas Emancipandas, e o número cresce desde 1997, logo depois de aprovada pelo Congresso a Emenda Constitucional 15/1996. A partir de então, foi o governo federal quem puxou para si a responsabilidade de criar novas cidades - 57 até agora. Mas, num forte lobby, a Bancada da Emancipação atravessou o salão azul do Congresso e chegou ao gabinete do presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), disposta a mudar esse cenário.
Liderados pelo presidente da União Nacional dos Legislativos Estaduais (Unale), o deputado estadual Alexandre Postal (PMDB-RS), os chamados municipalistas reuniram-se com Viana, semana passada, e saíram do gabinete com a primeira conquista. A pedido da bancada - que reúne uns 10 senadores e pelo menos 60 deputados federais, todos ex-estaduais - eles conseguiram desengavetar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 13/2003, do senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS). A PEC altera a redação do parágrafo 4º do artigo 18 da Constituição, e devolve aos governadores e assembléias legislativas a autonomia para a emancipação.
- Tenho total apreço pela matéria e acho que ela deve ser votada, porque está pronta para entrar na pauta - disse Tião Viana durante o encontro. - É preciso definir regras e não concentrar poderes.
O discurso saiu em sintonia com o que pregam os municipalistas do Congresso. A matéria está na pauta desta semana. Mas em outra frente, a conhecida Confederação Nacional dos Municípios (CNM), com forte presença no Congresso, cobra também a regulamentação da Emenda 15, até hoje em débito. A não regulamentação dessa emenda deixa quase na "clandestinidade" os 57 municípios criados desde 1997 pela União, adverte a CNM.
Num acordo com a Bancada da Emancipação, a CNM tratou de contornar o problema para não perder a vez. A PEC 13/03, se aprovada, oficializa essas cidades por tabela. Como nos casos de Figueirão (MS), a última promovida a muicípio, em 2004, e a famosa Luís Eduardo Magalhães (BA), bem conhecida do setor do agronegócio.
É a Bahia, aliás, que puxa a fila dos pedidos de emancipação parados nas assembléias. São 141 distritos com o sonho de ganhar um paço municipal e encher uma casinha de vereadores. Os entusiastas do projeto explicam a euforia. Justificam que o governo federal é ausente nos rincões.
- A emancipação é uma forma de barrar a migração a curto prazo, de evitar a favelização das capitais e de descentralizar os investimentos no desenvolvimento sócio-econômico - argumenta o autor da PEC, senador Zambiasi.
Com toda a cautela possível, obviamente, para não fazer de qualquer bairro populoso às margens de uma metrópole uma cidade sem que haja necessidade.
- Não se pode deixar que bairros sejam emancipados - acrescenta. Há emendas à PEC que prevêem uma distância mínima entre as cidades emancipadas, entre outros pontos. Há "freios" constitucionais para evitar erros.
Assim como o otimista Zambiasi, o líder do grupo que foi ao gabinete do presidente do Senado, o deputado estadual Alexandre Postal, acredita na aprovação da PEC.
- A proposta tem todas as condições de ser aprovada, e é altamente positiva - comenta. - Não se pode ficar trancando essa porta por onde entram investimentos nos municípios.
O otimismo tem uma explicação numérica. Se passar em dois turnos pelo Senado - precisa de 3/5 dos votos de cada Casa - a PEC entra no plenário da Câmara com o apoio de pelo menos 150 deputados, além do voto certo dos 60 da bancada.
Mesmo aprovada para o ano que vem, os governadores só poderão criar municípios a partir de 2012, quando serão realizadas, novamente, eleições municipais.
Pela proposta original, deverá ser obedecido o prazo de um ano para a realização de plebiscitos nos distritos e estudos de viabilidade. Mas em anos eleitorais, esse critério não chega a ser um obstáculo. Basta lembrar que a baiana Luís Eduardo foi oficializada em pleno calor da campanha municipal de 2000.
Fonte: JB Online