sexta-feira, setembro 26, 2025

Anistia como moeda de troca ameaça travar a justiça fiscal no Congresso

Publicado em 26 de setembro de 2025 por Tribuna da Internet

Declaração expõe uma estratégia de barganha

Pedro do Coutto

A declaração do relator Paulinho da Força, de que a ausência de consenso no texto da anistia pode comprometer a votação do projeto de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, expõe uma estratégia de barganha que coloca em rota de colisão duas agendas de natureza distinta, mas igualmente sensíveis.

De um lado, está uma proposta de grande impacto social, que beneficiaria milhões de trabalhadores e reforçaria a ideia de justiça fiscal num país marcado pela regressividade tributária; de outro, uma pauta de forte carga política e simbólica, que envolve a possibilidade de anistiar os envolvidos nos atos de 8 de janeiro.

TENSÃO – Ao atrelar a tramitação das duas matérias, Paulinho não apenas tensiona a relação entre governo e oposição, mas também coloca em xeque a credibilidade do próprio Legislativo, ao transformar uma conquista social em moeda de troca para aliviar responsabilidades de quem atentou contra a democracia.

A reação imediata da bancada do PT, ao rejeitar qualquer flexibilização, mostra que essa associação será combatida com vigor, enquanto o presidente da Câmara, Hugo Motta, tenta conter os danos ao garantir que a votação da isenção do IR não será refém de impasses políticos.

Esse movimento, no entanto, revela muito mais do que um simples cálculo de calendário legislativo: ele explicita a dificuldade de o Congresso lidar com a herança dos atos golpistas e a tentação de diluir a gravidade das responsabilidades em nome de uma suposta pacificação nacional.

POLARIZAÇÃO – Para setores conservadores, a anistia seria o passo necessário para encerrar um ciclo de polarização; para setores progressistas, representaria um recuo perigoso diante da necessidade de afirmar a força das instituições. Nesse cenário, o Senado impõe uma pressão adicional ao aprovar em comissão a proposta de isenção, obrigando a Câmara a se posicionar sob risco de desgaste público se a matéria for atrasada.

O dilema é claro: ao insistir na costura de pautas inconciliáveis, os parlamentares correm o risco de inviabilizar tanto a medida de alívio fiscal quanto a própria legitimidade de um debate sobre anistia, reforçando a percepção de que, em Brasília, os interesses de poder continuam a se sobrepor ao interesse coletivo.