domingo, janeiro 05, 2025

Na psicologia do futuro, otimismo local contrasta com pessimismo global

Publicado em 5 de janeiro de 2025 por Tribuna da Internet

Pesquisa mostra como reage a psicologia do futuro

Hélio Schwartsman
Folha

A lógica e o pensamento racional são só um efeito colateral da miríade de impulsos cognitivos com que a evolução natural nos dotou. A melhor prova disso está na lista telefônica de vieses e erros sistemáticos que marcam nossos raciocínios.

Nutrimos um excesso de confiança em relação a nós mesmos e nossas capacidades (otimismo local) pareado com um irrazoável catastrofismo no que diz respeito ao mundo exterior (pessimismo global).

PREDISPOSIÇÃO – O Datafolha, mais uma vez, flagrou essa predisposição. De acordo com o instituto, 67% dos brasileiros acreditam que a inflação vai aumentar em 2025 e 41% apostam na alta do desemprego. Não obstante, 60% julgam que sua situação pessoal será melhor em 2025 do que foi em 2024.

Esse pequeno paradoxo tem lógica à luz da evolução. Em situações nas quais a nossa performance afeta diretamente o resultado, faz sentido favorecer a autoconfiança, mesmo que exagerada. O atleta que já entra na competição achando que vai perder perde mesmo.

Nas questões sobre as quais temos pouco ou nenhum controle, é prudente imaginar o pior e tentar fugir dos perigos.

VENCER DEBATES – E isso é só um pedaço da história. Dan Sperber e Hugo Mercier, cujos trabalhos já comentei aqui, sustentam que a razão não evoluiu para nos tornar capazes de apurar fatos objetivos e encontrar verdades, mas para nos fazer vencer debates e ficar bem diante do grupo.

A pergunta que se coloca então é como, com um legado desses, conseguimos desenvolver a ciência e as tecnologias que nos trouxeram até aqui. A resposta é complexa e tem a ver com a evolução cultural cumulativa, uma empreitada necessariamente coletiva, nunca individual. Newton só foi Newton porque, como ele mesmo dizia, pôde colocar-se no ombro dos gigantes que o antecederam.

E isso nos leva a uma pergunta ainda mais intrigante: por que diabos a matemática e a lógica funcionam tão bem na ciência? Para o físico Eugene Wigner, que propôs essa reflexão, não existe resposta racional. Não há nenhum motivo a priori para que as leis da natureza sejam capturáveis por ferramentas matemáticas.