Míriam Leitão
O Globo
O presidente do PSD, Gilberto Kassab, diz que gostaria que o 8 de janeiro não tivesse acontecido, mas usa a expressão “tentativa de golpe” para definir o que aconteceu. Ele defende o centro político comparando com o ser humano. “O ser humano tem a orelha esquerda, a orelha direita e a cabeça no centro”. Ele diz que o partido tem um projeto presidencial, e define o PSD como um partido que tem um projeto liberal na economia e forte ação social.
O PSD venceu até agora em 882 e tem dez disputas no segundo turno, entre elas duas capitais Belo Horizonte e Curitiba, Piracicaba, São José dos Campos, Ribeirão Preto, Caucaia, Londrina, Uberaba, Olinda, Canoas. Ele é considerado o vencedor dessas eleições. Mas qual é o projeto do PSD? Afinal, o que é o PSD? Foi o que eu conversei com o Kassab.
Vamos começar por um problema de São Paulo. Tem uma briga entre o governo federal e o governo municipal sobre de quem é a culpa por essa crise da falta de luz. Quem está com a razão nessa briga?
É evidente que a empresa não presta bom serviço. Isso é claro. Ainda no caminho, vindo para a gravação ouvindo aqui uma das emissoras de rádio dizendo que apenas 1% do que havia sido comprometido pela empresa em termos de poda de árvore foi cumprido. Então, é evidente que falta fiscalização. Uma concessionária precisa ser fiscalizada com muito rigor. E, para ser sincero, as agências brasileiras precisam melhorar a sua postura de fiscalização como um todo, e não é diferente na Aneel.
O governo federal gostaria de fazer uma mudança nas agências, inclusive fazendo mandatos coincidentes com o mandato do presidente. O senhor acha que isso faz sentido?
Nenhum. Deixa de ser uma agência. As agências são instrumentos do Estado, não de governo. Senão o governo assume e vai nomear, aí passa a ser uma ação de governo.
Mas sabe que o seu ministro gosta dessa ideia, né?
É, eu acho que ele deveria aprofundar e se me faz essa pergunta, eu sempre sou muito franco no que eu penso. Eu, a princípio, tenho uma posição bastante distante disso, porque ela vai se aproximar muito como um instrumento de governo e não de Estado.
O senhor está, assim, é o chefe de governo e de relações institucionais do governo de Tarcísio, que foi do governo Bolsonaro e sempre diz, sempre quando ele é perguntado, ele diz que o líder dele é Jair Bolsonaro. Mas o senhor está com três ministros no governo do Lula. Até quando o senhor acha que consegue manter esse um pé em cada canoa?
Vamos lá. Que partido é o do Tarcísio? É o Republicanos. E o Republicanos tem ministro no governo Lula. Que partido é o MDB? O MDB tem ministro, inclusive está me apoiando. Que partido é o PP? O PP tem ministro. O PL não tem ministro, mas tem uma boa relação. Então, não há nenhuma incoerência. A democracia brasileira, infelizmente, é assim, mas eu sou contra a coligação, trabalhei muito para acabar as coligações das proporcionais, vereador, deputado estadual, deputado federal, acabaram, e trabalho muito para que acabe no Brasil as coligações majoritárias. Na medida que elas existem, existe naturalidade nas alianças estaduais, em alguns momentos, incompatíveis com as federais. O PSD, aqui em São Paulo, foi a única força política que apoiou o então candidato Tarcísio, tanto é que indicamos o vice e estamos participando do governo, até porque era para participar mesmo, eleição é para isso.
E no plano federal, como fica?
No plano federal, em 2018, por exemplo, o PSD apoiou o Geraldo Alckmin para presidente. Perdemos as eleições, ficamos quatro anos sem participar do governo Bolsonaro. Agora é diferente, o PSD não teve candidato. Nós tentamos, você sabe disso, quantas vezes eu vim aqui na Globo com o Rodrigo Pacheco, o PSD fez de tudo para lançar o Rodrigo Pacheco, candidato a presidente. Quando ele abriu mão da sua pré-candidatura, fizemos de tudo para lançar o Eduardo Leite, não foi possível. Acabamos ficando sem candidato, liberando as nossas lideranças, os nossos diretórios estaduais, para cada um seguir o seu caminho. Um caminho também totalmente correto, politicamente correto. Aqueles que apoiaram o presidente Lula, corretamente, estão participando do governo. Só falta eu pedir para o Otto Alencar não participar do governo. Ele, desde o primeiro momento, esteve com o presidente Lula.
E ele crescendo assim, ele tem um projeto presidencial? Ele quer ser como o PSDB, ter um projeto presidencial?
Lógico, o partido que não tem projeto é um partido que está condenado a ser dissolvido, a desaparecer. Temos bons quadros do PSD. Tem o Topázio em Florianópolis, que ganhou a eleição no primeiro turno, um excelente prefeito. Tem o Ratinho, tem o Eduardo Pimentel em Curitiba. Tem o Eduardo Paes no Rio de Janeiro. Temos uma aliança aqui em São Paulo com o Tarcísio, que é a grande revelação da política brasileira. Hoje eu entendo o Tarcísio, ao lado do presidente da República, lógico, como um dos maiores líderes do país. Temos o Antônio Brito, temos o prefeito de São Luís, o Braide. Então, é um partido que está se preparando, sim. É um partido com uma posição clara de centro, onde abraça na economia o liberalismo, mas vê com muito cuidado a questão social, defende investimentos expressivos no ensino público, na saúde pública, na defesa, na segurança. Então, está crescendo por sua coerência e por estar conquistando bons quadros para a vida pública brasileira.
O senhor acha que o Jair Bolsonaro vai continuar inelegível na sua avaliação? O senhor tem muita capacidade de análise política.
Olha, eu lamento muito que um ex-presidente da República esteja nessa condição. Não é bom para o país, não é bom para a nossa imagem no exterior. O Judiciário tem que cumprir suas funções. Eu torço que tudo isso que aconteceu tenha sido um grande equívoco, mas, na verdade, o que eu vejo é muita pouca vontade do Judiciário de mudar sua decisão.
Mas o senhor acha que há motivos? O que houve foi uma tentativa de golpe tudo o que aconteceu? Como é que o senhor avalia o que aconteceu?
Eu avalio com muita tristeza. Eu gosto da vida pública. Uma carreira, até já longevo, fui vereador em São Paulo, deputado estadual, duas vezes federal, prefeito. Disputei eleições, venci. Fui ministro, hoje sou secretário do governador Tarcísio, com muita honra. É muito triste…
É muito triste Bolsonaro ser inelegível ou ter havido uma tentativa de golpe?
É muito triste ver essa situação de esses grandes equívocos ou tentativas de golpe ou golpe com tantas pessoas envolvidas. Eu gostaria muito que isso não tivesse acontecido. Então, vamos aguardar o Judiciário se definir, vamos ver como vai acabar esse processo. Ainda não existe algo definitivo, mas eu acho que não vejo nada no horizonte que mude a decisão do judiciário.
Apesar de o senhor ter dito que tem um projeto presidencial, o senhor tem falado sempre que está no projeto do Tarcísio de Freitas, que é do Republicanos. Então, se chegar em 2026, se houver a possibilidade de lançar um candidato próprio, o senhor ficará longe do Tarcísio de Freitas?
Se ele se lançar candidato a presidente? Primeiro, essa é a decisão dele, sair ou não candidato. Eu acho que o Tarcísio é a grande renovação da política brasileira. Eu tenho nele hoje o melhor quadro da política brasileira, muito bem preparado, muito inteligente, com capacidade de estruturar a equipe, por onde passou, saiu muito bem avaliado, e em governos totalmente diferentes do ponto de vista ideológico. Ele vai muito bem no governo de São Paulo, que está se transformando sob o seu comando. Muitas inovações na infraestrutura, na saúde, no ensino, nas reformas administrativas que ele vem impondo ao estado. Então, ele na hora certa vai definir se é candidato a governador, se é candidato a presidente. Eu espero que ele saia candidato, que ele continue na vida pública, não é?