domingo, junho 30, 2024

Lula não falava tanto desde março, mas começou onda de azares, crises e erros


Lula ignora pressões do PT e faz terceiro mandato sem 'grilo falante'

Lula resolveu abrir o verbo, mas dá muitos tiros no pé

Vinicius Torres Freire
Folha

Luiz Inácio Lula não dava entrevistas exclusivas desde março. Foi quando o caldo engrossou. No Congresso, ainda mais. Também na inflação e nos juros dos EUA, o que teve efeito ruim sobre juros e dólar no Brasil, piorado pela mudança de metas fiscais. Sobreveio a catástrofe no Rio Grande do Sul. Discursos e decisão desastrada do Banco Central azedaram o caldo grosso.

Foi um trimestre de inversão de expectativas na finança, embora menos em relação a PIB e emprego neste ano.

MUITA ENTREVISTA – Na semana que passou, talvez o pico da crise recente, o presidente deu entrevistas exclusivas às rádios CBN (São Paulo), Verdinha (Ceará), Meio (Piauí) e Mirante (Maranhão) e ao jornal “O Imparcial” (Maranhão).

Lula reagiu aos problemas, mas não só. Se as entrevistas provocaram o presidente a falar do que lhe importa, conviria prestar atenção ao seguinte.

Primeiro, reforçou o ataque a Roberto Campos Neto, presidente do BC. Se a direção do BC —esta e a que ficar para 2025— quiser manter algum controle das condições financeiras, dificilmente baixará a Selic antes do final do ano. Até Lula sabe disso. Se, a partir de 2025, a direção do BC passar a cortar a Selic, vai parecer uma vitória (pois terá maioria “luliana”).

MARGEM OCIDENTAL – Segundo, quer explorar petróleo na costa do Amapá (Bacia da Foz do Amazonas), uma das decisões mais importantes que este governo vai tomar. Não se sabe se a definição terá sido baseada em algum plano de transição energética (como trocar fósseis por renováveis, em que ritmo, a que custo, com qual nível de segurança de abastecimento e com quais sobras de receita para o Tesouro). Não se conhece plano algum, amplo e organizado, a esse respeito.

Lula reconhece que há contradição entre transição verde e aumento da exploração petroleira, mas está de olho no dinheiro. Atualmente se torra a receita do petróleo em gasto corrente, sem investimento no futuro (na transição verde ou na redução da dívida).

Terceiro, dá grande importância ao plano para a “nova indústria”, para a transição verde, de bioeconomia etc. Algo andou, picado. Mas não se sabe bem quais são os tais planos.

RENÚNCIAS FISCAIS -Além disso, reiterou que é preciso dar um jeito no gasto tributário de R$ 524 bilhões (isenção de impostos para cidadãos, empresas e instituições), que “descobriu” nesta semana. Não se sabe se vai logo se esquecer disso. Porém, é daí que seus ministros econômicos podem arrumar dinheiro.

Até agora, a Fazenda tapava o que podia do déficit com aumentos de impostos aos solavancos, tática ferida, talvez de morte. Mais difícil é inventar uma necessária ofensiva para reduzir o gasto tributário, um plano maior, debatido e organizado. Passado um terço do governo, não há plano. No mais, vão ter de contingenciar (suspender) gasto neste ano. Lula vai aceitar?

Dólar caro, juro alto e desajuste fiscal ameaçam novo ciclo de investimentos. Lula volta a chamar Campos Neto de adversário e afirma que troca no BC trará ‘normalidade’.Fazenda aguarda novas alternativas para desoneração enquanto classe política bate cabeça.

MAIS CONFUSÕES – Lula falou muito de fazer mais universidade, escola técnica, integral. Falta dinheiro para essas instituições, Lula quer fazer outras. É um programa de grande interesse dele.

Estaria para sair a revisão do Plano Nacional de Segurança Pública, até agora um fracasso do governo. Mesmo nas entrevistas, Lula se mostrou impaciente com a demora. Diz que vai discutir o plano com seus ministros ex-governadores e com governadores. Pode ser uma frente da contraofensiva do governo.

Por fim, está obcecado com a compra de arroz, para vendê-lo a R$ 4 o quilo. Houve “falcatrua” no primeiro leilão (qual?), mas a coisa não vai parar.