Eliane Cantanhêde
Estadão
Tudo muito bem, tudo muito bom… a articulação política e as relações entre os Poderes pareciam ter avançado ao longo da semana, mas sofreram um freio brusco que embola todos os problemas e desacertos, com o pedido do governo e o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) contra a desoneração da folha de pagamento de empresas e municípios.
O Congresso prorrogou a desoneração, o presidente Lula vetou, o Congresso derrubou o veto de Lula e o Supremo agora entra para arbitrar o jogo.
SÍNTESE DA GUERRA -Logo, esse julgamento é uma síntese da guerra entre Executivo, Legislativo e Judiciário, que andam em círculos de faca nos dentes, um perseguindo o outro incessantemente, e envolve uma questão central – economia e equilíbrio fiscal – e uma periférica – as decisões monocráticas do Supremo.
Foi do ministro Cristiano Zanin, nomeado por Lula, a liminar, ou canetada, que suspendeu a decisão do Congresso, que suspendeu a decisão de Lula, que suspendeu a decisão do Congresso.
O Supremo julga a canetada de Zanin no plenário virtual, com três ministros em Londres para um seminário, e a votação caminha a favor do governo – e contra o Congresso, a desoneração, os municípios e os 17 setores da economia que mais empregam e, por isso, pagam menos impostos pela folha de funcionários.
CINCO A ZERO – Com quatro votos acompanhando Zanin, de Flávio Dino, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, o Senado entrou com recurso, o ministro Luiz Fux suspendeu a votação e a conclusão ficou no ar.
São cinco a zero e só falta um voto para vitória do governo e derrota do Senado. Detalhe: o pedido de vista de Fux mantém a liminar de Zanin e a volta da cobrança de impostos de empresas e municípios. Durma-se com um barulho desses. Num dia, empresas e prefeituras vão dormir com a decisão de continuar não pagando impostos pela folha e, no outro, acordam com a reviravolta em contrário.
Assim, o julgamento no Supremo é uma síntese e uma aula sobre o clima e o bate-cabeça em Brasília, que pareciam ter tido um refresco depois da conversa entre Lula e o presidente da Câmara, Arthur Lira, e do envio da primeira proposta de regulamentação da reforma tributária.
STF NA FOGUEIRA – O refresco durou pouco, quando o Planalto entrou com o pedido contra o Congresso e jogou o Supremo na fogueira, reacendendo as várias guerras do Senado e do seu presidente, Rodrigo Pacheco, contra o Judiciário e o Executivo.
Arthur Lira reclama de ser sempre o vilão, enquanto Pacheco faz cara de bom moço e ataca. Foi Pacheco quem articulou a prorrogação da desoneração e assumiu a autoria da PEC do Quinquênio e ambas atingem diretamente o equilíbrio fiscal, tão essencial à economia e ao próprio governo (apesar de sinalizações de Lula em sentido contrário…).
E foi ele também o autor da PEC das Drogas e deu asas a projetos para fixar mandatos e mudar a idade mínima de ministros do STF.
FICA DIFÍCIL – Com a tensão, as pressões, o feriadão (de semana inteira) e as festas juninas (que esvaziam o Congresso), fica difícil aprovar qualquer coisa até 17 julho, início do recesso parlamentar. E o segundo semestre… Bem, o segundo semestre será consumido pelas eleições municipais.
E os governadores já estão deixando suas desavenças de lado e botando as manguinhas de fora para a segunda regulamentação da reforma tributária, sobre o comitê gestor e os recursos da reforma, em torno de R$ 800 milhões a R$ 1 trilhão.
“Os Estados não podem perder autonomia, nem ficar de pires na mão para receber mesada do governo federal”, avisou Ronaldo Caiado, de Goiás, em conversa com a coluna. Guerra é guerra.