Publicado em 20 de outubro de 2023 por Tribuna da Internet
Hélio Schwartsman
Folha
Durante a pandemia, os planos de saúde se deram bem. Os gastos que tiveram com a Covid foram amplamente compensados pela forte redução da demanda por outros serviços. Pacientes atrasaram cirurgias eletivas e deixaram de procurar o médico, o que levou a uma diminuição momentânea nos novos diagnósticos de cânceres e outras doenças de alto custo.
É claro que não duraria para sempre. E não durou. A pandemia passou, a demanda reprimida explodiu, e a situação dos planos hoje é de crise. A maioria deles amarga prejuízo operacional, e vários já atrasam pagamentos a prestadores e reembolsos a clientes.
DUAS QUEIXAS – Planos obviamente não são santos. Há uma lista telefônica de táticas abusivas que eles usam sem pudor contra segurados. Mas há duas queixas dos administradores que procedem.
A primeira são as fraudes. Elas sempre existiram, mas, de uns anos para cá, foram profissionalizadas. Hoje há grupos especializados em extrair mais reembolsos, nem sempre devidos. A segunda é a generosidade de legisladores e reguladores, que estão sempre ampliando as coberturas e retirando restrições.
O Congresso derrubou o rol taxativo que fora reconhecido pela Justiça. Retiraram-se os limites para consultas com fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos etc.
PAGAR O PREÇO – Não há nada errado em ampliar coberturas, desde que se aceite pagar o preço por isso. Mas nem todos podem. As mensalidades sobem bem mais do que a inflação, e é crescente o número de jovens que, confiando na própria juventude, opta por não contratar um plano. Não é uma decisão irracional, já que podem contar com o SUS.
O problema é que isso cria uma seleção adversa. As pessoas com mais problemas de saúde fazem de tudo para manter seu plano, enquanto as mais saudáveis arriscam a sorte.
Isso faz com que a sinistralidade aumente, o que torna os planos ainda mais caros, num complicado círculo vicioso.
Mantidas essas premissas, não há como dar certo.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Excelente análise de Hélio Schwartsman. Na prática, o direito constitucional à vida se divide entre os que têm plano de saúde e os que dependem do SUS, no qual um exame de sangue ou um simples raios-X pode demorar três meses nos postos de saúde, acredite se quiser. Apenas na emergência o atendimento anda mais rápido, porém a fila é grande, dá no mesmo. Acredito que um país somente seja democrático quando o serviço de assistência médica for igual para todos. Na educação, a mesma coisa. Quando não há oportunidades iguais para as crianças, a democracia não existe na prática. É só conversa fiada. (C.N.)