sábado, agosto 05, 2023

Se for condenado, Trump não poderá ser candidato; uma questão moral de bom senso

Publicado em 5 de agosto de 2023 por Tribuna da Internet

Trump tentou  impedir a proclamação da vitória de Biden

Pedro do Coutto

Comentaristas da política americana têm levantado dúvidas se mesmo condenado pela Justiça (processos não faltam), o ex-presidente Donald Trump poderá concorrer às eleições de novembro de 2024 e ser eleito para um novo mandato na Casa Branca. Baseiam-se no fato de a Constituição dos Estados Unidos não prever a hipótese de tal impedimento.

Mas isso conduz a um universo interpretativo baseado num princípio moral de bom senso que impede que o homem que tentou fraudar as eleições de 2020 e impedir a proclamação da vitória de Joe Biden, possa novamente disputar a Presidência da República. Um absurdo completo que é facilmente identificado no princípio substantivo do bom senso e do direito comparado, pois se um criminoso comum é privado da liberdade, como proporcionar a um condenado incomum a liberdade de governar o país?

BOM SENSO – Não faz o menor sentido quando se pensa objetivamente sobre a atmosfera que envolveria a maior economia do planeta sob o comando de alguém que poderia encontrar-se recolhido à prisão. Direito, como disse há pouco, é uma questão de bom senso e que, naturalmente, fixa limites no comportamento humano. Não é possível, portanto, que um prisioneiro da Justiça encontre-se livre para dialogar – aqui vai apenas um exemplo – com presidentes de outros países. Como será possível um presidente prisioneiro encaminhar a mensagem anual ao Congresso do país?

Portanto, passando da hipótese não prevista na Constituição a que tal lacuna possa ser preenchida na prática, equivaleria, sem dúvida, a permitir a qualquer condenado judicialmente a ser candidato a algum cargo político. Não tem cabimento. Os leitores e as leitoras certamente já sentiram a atmosfera que seria gerada não só nos Estados Unidos, mas no mundo inteiro, se Donald Trump, condenado e preso, concorresse pelo partido Republicano e vencesse as eleições.

A sua posição no partido Republicano é bastante sólida. Pesquisas apontam um índice de aceitação de 61%. Mas, mesmo na hipótese de vencer a convenção partidária, levaria para a campanha eleitoral uma divisão capaz de derrotá-lo no caminho das urnas. Há divisões no Partido Republicano que poderiam abrir uma dissidência nas eleições que ele, Trump, ambiciona.

ACUSAÇÃO – Mas não é apenas este o caso. A questão é que Trump é acusado de buscar na Geórgia – estado de Jimmy Carter, que já foi presidente dos Estados Unidos –  votos fraudados para levá-lo a conquistar esse colégio importante para o desfecho final das eleições. A mais grave acusação contra ele está na invasão do Capitólio e no esforço para impedir a diplomação do vencedor, Joe Biden. No episódio, é bom lembrar, morreram cinco pessoas e o ato causou um repúdio geral nos países democráticos, exceção do Brasil, de Jair Bolsonaro à época, cujas correntes repetiram a investidas dois anos depois em nosso país.

Por todos esses fatores, sou de opinião que nem tudo que não está escrito na Constituição e nas leis pode ser praticado. Não há dispositivos, tampouco poderia haver, destinados a impedir crimes de morte, de roubo, de peculato, de assaltos. Não está escrito, mas as penas existem. Logo, o impedimento está caracterizado pelo fato em si, não pelo texto legal que os impede. Se assim não fosse, as Constituições dos países seriam livros intermináveis, estabelecendo minuciosamente todas as impossibilidades que caracterizam as sociedades organizadas e civilizadas.

A candidatura de Donald Trump torna-se impossível, não apenas em face do que o Partido Republicano vier a decidir, mas sim em função do que a Suprema Corte inevitavelmente venha a resolver. Os conflitos humanos são de uma amplitude enorme, mas as suas soluções dentro da lei têm que ser decididas pelo Poder Judiciário. Não é porque a lei não impede isso ou aquilo que homens e mulheres possam se julgar imunes aos princípios morais e éticos que regem o relacionamento entre as pessoas e também o relacionamento entre o poder e a sociedade. Trump infringiu e ultrapassou os limites do impossível. Com isso, tornou a sua nova candidatura inviável.  

CRÉDITO ROTATIVO – Numa reportagem na edição desta sexta-feira do Estado de S. Paulo, Bianca Lima focaliza divergências entre os bancos e as lojas comerciais de varejo quanto às taxas cobradas (absurdas) pelo sistema bancário. Os cartões de crédito chegaram este ano a cobrar juros de 437% por 12 meses. Não há quem consiga pagar dívidas assim.

Os casos de inadimplência se multiplicam, abrangendo 74 milhões de homens e mulheres. O governo tenta mediar o assunto, mas nessa escala de juros qualquer acordo torna-se impossível. É perder tempo. Medidas executivas têm que ser colocadas em prática.