Publicado em 23 de julho de 2023 por Tribuna da Internet
Francisco Leali
Estadão
O mundo jurídico parece afundado em pontos de interrogação e de exclamação. O caso das agressões e hostilidades ao ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e seus familiares em solo estrangeiro fez eclodir mais dúvidas do que certezas. A lista começa com a convicção de que nenhum ser humano pode ser tratado à base de impropérios e termina com indagações sobre até onde pode ir o Estado para proteger a todos nós.
Moraes, mulher e filhos estavam em Roma. De malas prontas para retornar ao Brasil, teriam sido vítimas de agressões verbais e até físicas.
BUSCA E APREENSÃO – Seus algozes foram procurados pela Polícia Federal assim que chegaram por aqui. Três deles já prestaram depoimento. Por ordem do STF, chegou-se a fazer busca e apreensão nos endereços dos detratores de Moraes. Dito dessa forma, parece uma mera descrição de manual de normas e procedimentos. Será que é isso mesmo?
Mas busca e apreensão em suspeitos de hostilizar Moraes ‘extrapolam’ a lei, dizem constitucionalistas. O procurador da República Vladimir Aras, que já chefiou a área de cooperação internacional na Procuradoria-Geral da República, veio a público para tecer considerações sobre o caso e juntou-se à turma que evita o aplauso fácil.
Disse que o incidente das agressões a Moraes nem seria para investigação criminal no Brasil, nem processo para o STF cuidar. Citou leis, jurisprudências e acordos de cooperação com a Itália para explicar por que vê o episódio dessa maneira.
MAIS CRÍTICAS – Ao Blog do Fausto Macedo, constitucionalistas também levaram senões à condução do caso. Já o ministro da Justiça, Flávio Dino, ex-juiz federal, entende que, até agora, ninguém saiu do script. Diz ele que a PF fez as buscas para preservar provas e as medidas adotadas são as devidas.
Os juristas ainda certamente debaterão como encaixar o caso no mundo das leis. Já no mundo dos leigos resta a impressão de que tudo parece tão certo que dá para desconfiar.
Uma autoridade agredida lá fora não seria caso para acionar a polícia local? Armada a confusão, não teriam que todos serem levados para esclarecer o ocorrido, se crime houve, perante as autoridades italianas?
ALGO QUE VIROU MODA – A opção por esperar uma dezena de horas de voo para tratar tudo em solo brasileiro induz a acreditar que por aqui um ministro do STF teria melhores condições de se proteger. Afinal, o hábito de sair apedrejando verbal e até fisicamente o suposto adversário político virou moda nos últimos anos quando o morador do Palácio da Alvorada rosnava para quem julgasse ser seu inimigo.
Mas é medida proporcional a presidência da Suprema Corte determinar uma busca de celular no interior de São Paulo? E o processo vai ficar ali no STF com base no foro de quem? Os agressores da família do empresário Roberto Mantovani Filho não têm essa prerrogativa legal. Já Alexandre de Moraes tem, mas ele é o agredido.
Foro especial para vítima parece cheirar a jabuticaba, a fruta que o ministro Gilmar Mendes gosta de citar quando se depara com uma invenção à brasileira.
ALVO PREFERENCIAL – Nos últimos tempos, Alexandre de Moraes virou alvo preferencial de bolsonaristas. Como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), avisou cedo que no pleito não toleraria golpismos, muito menos ataques à higidez do sistema eleitoral.
Sob a alcunha de Xandão, personificou os piores pesadelos dos apoiadores do então presidente da República que precisavam de um culpado para a derrota pelo voto que não fosse o próprio candidato.
A campanha acabou, Lula foi eleito, mas o ressentimento transbordado vez ou outra em ódio segue vivo. Por essas e outras espera-se que ainda haja juízes em Roma. A eles entregou-se a chave da palavra final nas contendas travadas no regime democrático. Quando o caldo entorna e os próprios magistrados viram alvo não pode ser diferente. Se o STF irá nos resguardar do próprio STF é aposta à espera dos dias que virão.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Mais um excelente artigo de Francisco Leali. Infelizmente, foi escrito antes de o presidente Lula e o ministro Flávio Dino colocarem a cereja no bolo azedo de Alexandre de Moraes. É uma loucura total querer pena de 20 a 40 anos de prisão para quem “atentar”, contra o presidente e outras autoridades constituídas. No caso de tentativa de homicídio de cidadão comum, a pena hoje vai de 6 a 20 anos, dependendo do estrago causado à vítima que sobreviveu à tentativa. Como se vê, essas autoridades brasileiras só pensam nelas, e os outros cidadãos que se explodam, como dizia Chico Anysio. (C.N.)