quinta-feira, dezembro 01, 2022

De onde vem e para onde vai o dinheiro do agronegócio brasileiro?




Por Tarcisio Miguel Teixeira

Para responder essa pergunta tão importante para todos os brasileiros, algumas preliminares precisam ser apresentadas. O conceito de Agronegócio ainda não é muito claro na sociedade em geral, pois o imaginário da agropecuária é muito arraigado em nossas mentes, seja pelo histórico da atividade econômica, seja pela literatura e arte visual. Para entender o moderno conceito de agronegócio temos que recorrer a John Davis e Ray Goldberg, que em 1957, no livro “Concept of Agribusiness”, iniciou uma mudança na forma de entender a produção agropecuária e as suas relações na economia dos países.

Com este novo entendimento, percebeu-se que a atividade é uma grande cadeia de relações (ou sistema), que inicia nas indústrias de insumos e máquinas, engloba o mercado de terras, legislação, sistema financeiro, educação e políticas públicas. Passa para fase de produção agropecuária, propriamente dita, e continua nas indústrias de processamento, logística, exportação, atacadistas, varejistas e chega no consumidor final. Enfim, agronegócio é um gigantesco sistema de múltiplas relações e que movimenta muito (mas, muito mesmo) dinheiro, pessoas e interesses. Outra característica importante do agronegócio é saber onde o dinheiro circula e é concentrado. Esta concentração irá definir quem controla este grande sistema. Quem tem mais dinheiro, manda.

Segundo um estudo de Goldberg, com dados do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), aproximadamente, 80% dos valores circulantes estão no setor antes da porteira e depois da porteira, ou seja, a agropecuária é essencial no processo, mas não coordena o sistema de produção. Munidos desta compreensão, é possível vislumbrar que o dinheiro do Agronegócio, ao final do processo, é concentrado na mão de quem detém as indústrias de insumos, processamento e distribuição. Outro aspecto importante, é que neste modelo, a produção agroindustrial não pode ser muito diversificada, pois somente com padronização dos produtos é viável aplicar o modelo industrial de produção em série na atividade agropecuária. Com pouca diversidade, as indústrias conseguem atuar em toda a produção com poucos produtos e, com isso, controlar praticamente todo o sistema.

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Esta concentração em poucos produtos agropecuários, também conduz a uma redução na diversidade de insumos para a produção. Com isso, haverá poucas empresas disputando o mercado e que para dificultar mais ainda a entrada de novos agentes, realizam fusões de proporções planetárias e controlam a maior parte do mercado de insumos e processamento. Segundo estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) de 2019, no ano de 2017, as dez maiores empresas de defensivos agrícolas no Brasil responderam por 80% do total comercializado e se ampliar para as 15 maiores, o total é de 96%. Portanto, boa parte dos gastos com insumos irão ser pagos a um grupo bem pequeno de empresas, sendo a maioria formada por capital estrangeiro. Quanto ao outro extremo da cadeia, o depois da porteira, também caminha a passos largos para a concentração.

Para ilustrar o fenômeno da concentração: o custo de produção do Soja RR, na região centro-sul de Mato Grosso do Sul, para a safra 2021/2022, segundo a Embrapa Dourados, consumirá com insumos, depreciação e custo de oportunidade com máquinas e implementos 59,8%. E o custo total de produção para o mesmo soja e região, poderá consumir de 43,92% a 81,56% da produção, a depender da pior ou melhor previsão dos preços do soja. Conclusão, com a produção e venda do soja, promove-se uma grande circulação de dinheiro, mas, ao final, este terminará nas contas de poucas multinacionais. Enfim, por unidade produzida, o agricultor brasileiro ficará com uma pequena parte deste dinheiro.

Evidente que, ao exportar o produto, o país terá a entrada de dólares que fortalecem as Reservas Externas do país e abastecem a economia de reais depois do câmbio. Este capital, advindo das exportações, será elemento essencial no financiamento da nova produção. Entretanto, estes recursos não vão chegar completamente nas mãos dos produtores, como explicado acima. É necessário considerar que a produção agropecuária é uma atividade de alto risco e o produtor somente consegue se manter na atividade por longos períodos se for abastecido de financiamento externo à propriedade ou se for um produtor de grandes proporções. Para manutenção de produtores médios e pequenos, é necessário prover a atividade de crédito de baixo custo, ou seja, com subsídios. E, atualmente, quem pode propiciar este crédito com juros baixos e alto risco de inadimplência, é o Estado.

Esses recursos disponibilizados à produção agropecuária, originam-se de uma política pública conhecida como Plano Safra, onde o Estado utiliza recursos da poupança rural (49%) e recursos obrigatórios (22%), estes oriundos do VSR (Valor Sujeito a Recolhimento dos recursos depositados à vista nos bancos). Enfim, há um esforço do Estado e, portanto, de toda a sociedade, para financiar a agropecuária, mas boa parte dos recursos não fica especificamente no bolso dos agropecuaristas. Com esse quadro a rentabilidade do agricultor brasileiro tem diminuído, o que conduz a necessidade de crescer em escala de produção para poder manter-se na atividade. Para este crescimento há duas vias: aumentar a produtividade e/ou aumentar a área de produção, que, nos dois casos, implica em grandes investimentos. Este aumento em produtividade implica em aprimorar o sistema industrial de produção, ou seja, investir mais recursos nos insumos das indústrias multinacionais e o crescimento de área implica em comprar novas áreas e avançar na fronteira agrícola. Com as regras ambientais brasileiras, novas fronteiras agrícolas estão se tornando escassas, o que resulta em uma elevação do preço das terras e a tendência natural é que as propriedades sejam cada vez maiores, mais caras e concentradas nas mãos de poucos produtores que consigam atender estas exigências do mercado.

Respondendo à pergunta título do artigo: o dinheiro do agronegócio origina-se em grande parte das exportações e do financiamento público, mas o seu destino final será, em boa parte, os cofres daqueles que coordenam as cadeias produtivas ou de alguns grandes produtores de grandes dimensões. O agronegócio é um dos grandes negócios no Brasil, mas precisa ser mais dos brasileiros.

O Antagonista