Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro reunidos em frente a um quartel do Exército pedem intervenção das Forças Armadas contra resultado das eleições de 2022
Em redes sociais, manifestantes prometem repetir apoiadores de Donald Trump, que invadiram a sede do Congresso dos EUA
Por Renato Alves
Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) que não aceitam a derrota nas urnas e participam de manifestações planejam um grande ato em Brasília para impedir a diplomação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como presidente eleito. A solenidade está marcada para 19 de dezembro, e a posse, 1º de janeiro.
Durante a cerimônia de diplomação, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atesta que os candidatos à Presidência da República e à vice-presidência foram efetivamente eleitos e estão aptos a tomar posse. A entrega dos diplomas só é concretizada após o término do prazo de questionamento legal do resultado e de processamento final do resultado das eleições.
No caso de governadores, senadores, deputados federais, estaduais ou distritais e suplentes, a diplomação é feita pelos tribunais regionais eleitorais dos 26 estados e do Distrito Federal, que também devem observar a data-limite de 19 de dezembro.
No entanto, por meio de redes sociais e até discursos públicos, eleitores que não aceitam o resultado das urnas falam em impedir a diplomação de Lula e seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), com o uso da força. Eles organizam um ato em Brasília por meio dos grupos bolsonaristas nas redes sociais.
Homem convoca atiradores
No último sábado (26), um homem, que se identificou como Milton Baldin e morador de Juruena (MT), subiu em um caminhão de som, em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília, e, ao microfone, pediu para que empresários mandem caminhoneiros à capital e que atiradores estejam presentes durante a diplomação de Lula. Tudo foi registrado em vídeo que circula nas redes sociais.
“Eu gostaria de pedir ao agronegócio, a todos os empresários, que deem férias aos caminhoneiros, que mandem os caminhoneiros à Brasília, porque nós precisamos de peso e de força aqui. São só 15 dias, não vai fazer diferença. Queria também pedir aos CACs, os atiradores que têm armas legais. Hoje nós somos, inclusive eu, 900 mil atiradores. Venham aqui mostrar presença. Se nós perdermos essa batalha, o que vocês acham que vai acontecer dia 19? Vão entregar as armas, e aí o que que vão falar? 'Perdeu, mané'. E como nós vamos nos defender? Defender a nossa propriedade e a nossa família?”, disse.
O homem acrescentou que só sairá de Brasília acompanhado de um suposto major, que aparece no vídeo usando uma roupa camuflada que se assemelha ao uniforme do Exército. “Major, muito obrigado, se não fosse por você eu não estaria aqui. E quero te dizer uma coisa, eu só vou sair daqui junto contigo, e essa batalha é nossa. Major, outra coisa, essa bandeira, ela até pode ser vermelha, mas com o meu próprio sangue”, ressaltou o homem, enquanto segurava uma bandeira do Brasil.
Apoiadores de Bolsonaro prometem repetir trumpistas
Os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro prometem, por meio das redes sociais, repetir apoiadores de Donald Trump, que, após serem convocados pelo então presidente derrotado nas eleições norte-americanas, se reuniram em frente ao Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021, em Washington, para protestar contra o resultado da eleição.
Naquele dia, as duas casas legislativas se reuniriam para ratificar a vitória de seu oponente. Mas Trump e os apoiadores queriam forçar que o vice-presidente Mike Pence e o Congresso rejeitassem a vitória do presidente eleito, Joe Biden. No início, os manifestantes se reuniram para um comício, em que os participantes ouviram os discursos de aliados de Trump, como seu advogado pessoal Rudy Giuliani.
Por fim, o grupo decidiu invadir a sede do Congresso norte-americano. Alguns dos manifestantes estavam armados. O saldo foi quatro mortos (incluindo um policial), mais de 140 feridos (a maioria policiais) e quase 1000 pessoas indiciadas judicialmente – o próprio Trump é investigado pelo ato criminoso. Mesmo com a selvageria, Mike Pence realizou a sessão que reconheceu a vitória de Joe Biden.
Deputado apresentou projeto para anistiar manifestantes
O deputado federal Major Vitor Hugo (PL-GO) apresentou, na quinta-feira (24), um projeto de lei que anistia manifestantes e financiadores dos protestos contra a eleição de Lula, que começaram com bloqueios de rodovias, após as urnas darem vitória ao petista, e resultaram em acampamentos ao redor de quartéis do Exército que persistem até hoje.
Para acelerar a tramitação do seu projeto, o deputado bolsonarista recolhe assinaturas para evitar os debates nas comissões da Câmara dos Deputados. Para isso, seria necessário obter o apoio de, ao menos, 257 dos 513 parlamentares. Um dos mais fiéis aliados de Bolsonaro no Congresso, Vitor Hugo não conseguiu assumir o governo de Goiás. Apesar do apoio do presidente, que fez forte campanha para o deputado, ele terminou em quarto lugar na corrida eleitoral vencida por Ronaldo Caiado, reeleito governador.
No texto apresentado ao plenário da Câmara dos Deputados, Vitor Hugo sugere o perdão a “manifestantes, caminhoneiros, empresários e todos os que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional” entre o dia 30 de outubro e a data em que a lei, caso seja aprovada, entrar em vigor.
A anistia também compreenderia “o financiamento, a organização e o apoio de qualquer natureza, além das falas, comentários ou publicações em redes sociais ou em qualquer plataforma na rede mundial de computadores (internet)”. As exceções seriam apenas para casos de “crimes contra a vida, contra a integridade corporal, de sequestro ou de cárcere privado”.
Deputado diz que manifestações são legítimas
Na justificativa do projeto, Vitor Hugo afirma que as manifestações são legítimas e conduzidas espontaneamente por cidadãos indignados pela forma como se deu o processo eleitoral neste ano – ele não apresenta prova de qualquer irregularidade.
“Não temos dúvidas de que não se trata de ações antidemocráticas ou crimes de qualquer natureza. Entretanto, infelizmente, essa convicção não é reverberada por importantes setores da sociedade e que podem impor às famílias hoje acampadas em diversas partes do país acusações de cometimento de crimes das mais diversas naturezas, o que se configuraria na maior das contradições vividas por nosso país nos últimos tempos: justamente aqueles que lutam, pacificamente, pela democracia brasileira são os acusados de atentar contra ela”, escreve.
Para o deputado, é um erro punir e intimidar cidadãos em “sua livre manifestação pacífica, em pleno exercício de seus direitos constitucionais”. Além disso, chamou as decisões judiciais contra os atos de "autocráticas e desrespeitosas, com consequência inimagináveis para o futuro”. Assim, ele argumenta que a aprovação do projeto de lei constituiria um gesto de pacificação e de redenção do parlamento “em face das milhões de pessoas que estão nas ruas nesse exato momento”.
Manifestantes são alvo de ações judiciais
Os atos promovidos por pessoas que se dizem insatisfeitas com os resultados das eleições são alvos de diversas ações, nos âmbitos das Justiças estaduais e federal, sob acusações dos mais diversos crimes, incluindo tentativas de homicídio contra policiais.
O Supremo Tribunal Federal (STF) já mandou que todas as rodovias do país fossem desbloqueadas, o que ainda não aconteceu. Em decisão, o ministro Alexandre de Moraes falou em “persistência de atos criminosos e antidemocráticos em todo o país, contrários à democracia, ao Estado de Direito e à proclamação do resultado das eleições”. Ele também determinou multas aos manifestantes que insistirem em desobedecer a lei.
Inclusive, o magistrado determinou o bloqueio das contas de 43 pessoas e empresas suspeitas de financiarem atos antidemocráticos.
“Não obstante a referida providência, as informações prestadas pela Polícia Rodoviária Federal dão conta de que empresários estariam financiando os atos antidemocráticos sob análise, com fornecimento de estrutura completa (refeições, banheiros, barracas, etc) para a manutenção do abuso do direito de reunião, além do fornecimento de diversos caminhões para o reforço da manifestação criminosa”, afirmou Moraes.
O Tempo