Publicado em 29 de setembro de 2022 por Tribuna da Internet

Charge reproduzida do Vale do Iguaçu (Vvale)
Roberto Brant
Capital Político
Dentro de alguns dias, ou, com maior probabilidade, no final de outubro, conheceremos aquele que o povo brasileiro escolheu para presidir o país nos próximos quatro anos. Durante o processo eleitoral, os meios de comunicação e as redes sociais propiciaram aos eleitores o mais amplo conhecimento dos candidatos realmente competitivos.
O perfil de cada um, suas ideias, seus valores, sua biografia, seu histórico político, seus defeitos e deficiências ficaram expostos com grande transparência e sujeitos ao juízo crítico de todos os eleitores.
GRANDE EQUÍVOCO – Mesmo com tudo isso, o voto para presidente pode se revelar um grande equívoco, como tem sido muitas vezes o caso. A causa, no entanto, não terá sido nunca defeito do sistema eleitoral ou a falta de informação do eleitor e sim a imperfeição do seu juízo político, este um problema derivado da natureza humana e sem remédio conhecido.
As boas democracias são aquelas em que as instituições políticas são desenhadas para lidar com as imperfeições humanas, atenuando o seus efeitos, sem suprimir as liberdades e sem submeter as pessoas ao jugo de uns poucos.
Como o Poder não é exercido autocraticamente pelo governante, mas compartilhado com o Parlamento, as escolhas do presidente e dos parlamentares estão solidamente articuladas nas democracias que realmente funcionam.
HÁ DIFERENÇAS – Nos regimes parlamentaristas o governo é a maioria parlamentar, ambos originados de uma só vontade majoritária. Nos regimes presidencialistas mais importantes, como o dos Estados Unidos e o da França, a eleição do Parlamento é realizada de forma tal que a vontade popular de fortalecer ou limitar o governo é inteiramente clara para o eleitor.
Na França, só após a escolha do Presidente da República a população é convocada para eleger um Parlamento, oportunidade em que o povo pode definir sem ambiguidades se deseja dar ao governo uma maioria para governar livremente, ou uma minoria que o obrigue a negociação e a moderação dos seus projetos e de suas ideias.
Nos Estados Unidos, a Câmara e parte do Senado são eleitos em meio ao mandato presidencial, para que a população decida favorecer o governo com uma maioria ou, ao contrário, limitá-lo, elegendo uma maioria de oposição. Em ambos os casos a escolha dos parlamentares se dá por eleição majoritária, no âmbito de distritos circunscritos regionalmente, onde cada eleitor conhece os candidatos e sabe qual o real significado do seu voto.
TUDO AO CONTRÁRIO – No Brasil as coisas são totalmente diferentes. As eleições para a Câmara dos Deputados, vitais para o dimensionamento do poder de fato do Presidente, transcorrem na maior invisibilidade e por meio de um processo que oculta do eleitor a consequência do seu voto. A quantidade de candidatos e de partidos torna impossível qualquer avaliação.
Na eleição presidencial o eleitor exprime com clareza sua vontade e suas expectativas. Entre nós, na eleição dos deputados o voto raramente tem um sentido, em termos de visão do país ou de alternativas de políticas públicas, sendo de um modo geral uma escolha aleatória e inconsequente.
Por esta razão, nossas eleições parlamentares, embora ocorrendo no mesmo dia da eleição presidencial, são na verdade um evento paralelo e não um processo de formação de maiorias políticas, como deveria ser e como é em todo o mundo democrático.
BASE ALIADA – Ao final, carregando dezenas de milhões de votos e expressando sem dúvida a vontade majoritária do país, para o governo funcionar, precisa formar, por conta própria, a maioria parlamentar que a população não pôde eleger, por arte de um sistema eleitoral sem equivalente no mundo e concebido para iludir a vontade política da população.
A forma como se constroem estas maiorias artificiais tem sido a maldição de muitos governos e uma causa da corrupção que tem ferido o Estado brasileiro e que resiste a todas as tentativas de combate.
No dia 2 de outubro seria importante que cada brasileiro meditasse um instante sobre estas tristes realidades e começasse a sonhar como uma verdadeira reforma do sistema com que elegemos os nossos deputados.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Uma extraordinária análise dos verdadeiros problemas da democracia brasileira, pelo ex-deputado mineiro Roberto Brant, ao criticar um sistema eleitoral absurdo, imbecil e contraproducente, que não segue os modelos democráticos mais avançados. Pense sobre isso, na hora de escolher deputado e senador. (C,N.)