Após quatro anos, sabe-se muito sobre o governo Bolsonaro, mas pouco sobre os planos do petista
Por Marcelo Godoy (foto)
O tenente-coronel Mauro Cesar Cid Barbosa se levantou da cadeira na plateia do estúdio e se dirigiu em passo acelerado até o presidente Jair Bolsonaro. Queria levar uma última instrução para o chefe, pouco antes do início do debate promovido pelo Estadão e pelo SBT – entre outros. O militar fardado, homem da Ajudância de Ordens do Planalto, uniu-se ao ministro das Comunicações, Fábio Faria, e a outro assessor do candidato à reeleição.
Cid é pessoa conhecida em Brasília. Oficial da Artilharia como o presidente, sempre está ao lado deste. Laços de amizade unem sua família à do chefe – seu pai, o general Mauro Cesar Lorena Cid, é colega de academia de Bolsonaro. Desde os primeiros dias do governo, o coronel acompanha as lives presidenciais. Chegou mesmo a se ver envolvido no inquérito policial a respeito de atos antidemocráticos. Fazia – ele admitiu – o papel de leva e traz de informações de blogueiros para o presidente.
Cid cuida das preocupações do dia a dia de Bolsonaro. Mostra-se a todos como um dos símbolos da onipresença militar na Esplanada. A exemplo dele, outros milhares de oficiais ocupam cadeiras nos ministérios. Após quase quatro anos, sabe-se muito sobre o governo Bolsonaro. Seus atos passaram pelo escrutínio judicial. Seus erros foram expostos e seus resultados – ou a ausência deles –, conhecidos. É possível que mais ainda exista nos arcani imperii do Planalto, afinal, o palácio, como advertia Baruch Spinoza, sempre pode “estender armadilhas aos cidadãos como as lançadas ao inimigo em tempo de guerra”.
É o julgamento do atual governo – reprovado nas pesquisas de opinião – que provoca uma assimetria nessa campanha eleitoral: ninguém se questiona sobre quem seria o “coronel Cid” de Luiz Inácio Lula da Silva ou o que o petista pensa a respeito da presença militar na Esplanada. Não se sabe como ele pretende lidar com a economia em um mundo afetado por novos conflitos geopolíticos e antigos desafios, como a desigualdade no País. Ou como impedir a corrupção e se relacionar com um Congresso que domina 50% dos investimentos do orçamento. Enfim, quais grupos de pressão apostam no candidato mais bem posicionado nas pesquisas de intenção de voto?
O eleitor tem o direito de saber o que pensa Lula para que a democracia não se transforme na plutocracia demagógica vislumbrada por Vilfredo Pareto. O petista recuperou os direitos políticos. Ganhou um habeas corpus do STF. Quer agora recuperar a Presidência. E usa um novo HC: Bolsonaro. Mas, ao contrário de seu oponente, Lula não parece se armar para ser um profeta. Não devia esquecer a lição da Florença renascentista: os profetas desarmados se arruínam.
O Estado de São Paulo