Presidente foi menos agressivo, como queria o Centrão, mas não conseguiu impor sua agenda e praticamente só falou de temas que são ruins para ele
Por Ricardo Corrêa (foto)
Passadas algumas horas da sabatina com o presidente Jair Bolsonaro (PL) no Jornal Nacional, e somadas as reações que elas provocaram, é possível fazer uma análise um pouco mais completa de sua presença no principal telejornal no Brasil. Afinal, Bolsonaro ganhou ou perdeu com a aparição para milhões de brasileiros? Ganhar, com certeza, ele não ganhou, mas talvez também não tenha perdido. Em uma sabatina como essa, dura por natureza, é razoável aos aliados temerem que o candidato tome uma goleada. Isso não aconteceu com Bolsonaro. Mas para quem está em segundo nas pesquisas, um empate ou uma derrota simples não ajuda em nada na tarefa de virar o jogo. Foi o que aconteceu com o presidente, que cumpriu a missão dada pelo Centrão de ser mais ponderado para não assustar o eleitor médio, mas não conseguiu impor os temas que gostaria e passou grande parte da conversa na defensiva.
Havia de fato um temor em seu entorno de como ele reagiria as provocações dos apresentadores. A grande preocupação é que, se repetisse a postura de franco atirador de 2018, o presidente pudesse incomodar os indecisos que ele agora precisa alcançar. Com ou sem media training, o presidente conseguiu ter o equilíbrio e a ponderação que geralmente não consegue ter. E isso provocou alívio e uma avaliação inicial positiva por parte de seus aliados. Eles têm esperança de que outros candidatos não consigam fazer o mesmo.
Mas a postura mais detida teve consequências. E a principal delas foi fazer com que o presidente não conseguisse impor a sua agenda. Grande parte da entrevista se deu em território ruim para ele. A discussão rendeu bastante sobre as críticas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, principalmente, a postura durante a pandemia. É bom lembrar que o pior momento de avaliação de Bolsonaro foi justamente no momento mais agudo da crise da Covid-19. Isso tudo veio à tona novamente com as lembranças das brincadeiras e da postura controversa ao lidar com a doença. Entre esses temas, surgiu a pergunta sobre o fato de ter imitado pacientes com falta de ar, o que aconteceu ao menos duas vezes durante a pandemia. Isso fez explodir as buscas pelo assunto. Se em 2018 as pessoas saíram da sabatina pesquisando sobre “kit gay”, como queria o presidente, agora saíram procurando vídeos sobre uma postura tenebrosa e que, certamente, afasta Bolsonaro desse eleitor médio que, em muitos casos, perdeu parentes e amigos para uma doença terrível.
Em meio à extensão dos debates sobre TSE, pandemia, relação com o Centrão e corrupção no MEC, Bolsonaro não conseguiu chegar nos assuntos que poderia usar para furar sua bolha e tomar votos do adversário. Ele praticamente não conseguiu falar de Auxílio Brasil, PIX, financiamento estudantil e queda no preço da gasolina. Ao longo da entrevista, os espaços foram curtos para isso e foi necessário usar as considerações finais, de apenas um minuto, para entulhar às pressas todos os temas que tinha na cabeça. Não parece suficiente para convencer o eleitor a mudar de lado.
O empate fora de casa, em um jogo considerado duro como é a sabatina da Globo, pode até ser considerado um resultado positivo em uma situação normal. Para um time que está dez pontos atrás do primeiro colocado no campeonato, porém, era preciso de um pouco mais. A oportunidade foi perdida por Bolsonaro e agora resta o horário eleitoral para tentar furar a bolha e virar o jogo. Faltam 40 dias para as eleições.
O Tempo