quinta-feira, junho 30, 2022

Da Arena ao Centrão


Lira, Bolsonaro e Collor


Por Bernardo Mello Franco

Uma ditadura não se impõe apenas pela força das armas. Depende do apoio de civis interessados em extrair vantagens do arbítrio. Em 1964, políticos, empresários e setores da classe média incentivaram os militares a dar o golpe. Uniram-se pela resistência às reformas de base, pelo medo do comunismo e pelo desejo de ocupar o poder sem a obrigação de vencer eleições.

Depois das primeiras levas de cassações, a ditadura extinguiu os partidos políticos e impôs um sistema de duas legendas. A oposição consentida se agrupou no MDB. Os governistas fundaram a Arena, que chegou a se apresentar como o “maior partido do ocidente”. Um dos próceres da sigla, Célio Borja, morreu ontem aos 93 anos.

Ex-udenista, professor de direito, Borja chegou ao Congresso no governo Médici. Sua ascensão coincidiu com os anos de chumbo, quando a ditadura usou o AI-5 para prender adversários e amordaçar a imprensa. Em 1974, já sob o governo Geisel, virou líder da Arena. No ano seguinte, foi alçado à presidência da Câmara.

Quando o golpe fez 50 anos, o jurista recebeu um repórter em seu escritório em Copacabana. Entre bicadas no cafezinho, saiu em defesa dos antigos chefes: “Ditadura, nunca houve. O que se podia dizer é que havia um regime de plenos poderes”. Sobre o ex-presidente João Goulart, que morreu no exílio, opinou: “Era um pobre homem. Quando muito, um aprendiz de caudilho, despreparado para governar”.

A Arena acabou, mas seu espírito sobrevive nos partidos do Centrão. O bloco está sempre pronto a aderir. Topa até apoiar um novo golpe, desde que as torneiras do Orçamento permaneçam abertas.

Ontem dois ex-arenistas subiram ao palanque de Jair Bolsonaro em Maceió: o ex-presidente Fernando Collor, de quem Borja foi ministro da Justiça, e o ex-senador Benedito de Lira, pai do atual presidente da Câmara. A dupla parecia perturbada com a situação do governo nas pesquisas. Collor discursou aos gritos, e Lira expulsou um homem da plateia aos palavrões.

Os veteranos da velha Arena sabiam perder com mais elegância. Derrotado na eleição de 1982, a última antes do fim da ditadura, Borja saiu à francesa e foi tocar a vida no setor privado. Anos depois, voltaria à ribalta como ministro do Supremo. Foi convidado por José Sarney, outro civil que colaborou com o regime dos generais.

O Globo