segunda-feira, janeiro 31, 2022

Um crime em cima do outro

 




Presidente se especializou em desrespeitar a lei para obter ganhos políticos

Por Bruno Boghossian (esq.)

A Polícia Federal acrescentou mais um crime à ficha de Jair Bolsonaro. A delegada Denisse Ribeiro afirma que o presidente participou, em agosto passado, do vazamento de um inquérito sobre a invasão de sistemas do Tribunal Superior Eleitoral. Além dele, foram enquadrados o deputado Filipe Barros e um ajudante de ordens do Planalto.

O episódio desenhou mais uma peça da máquina de infrações montada pelo presidente e seus aliados. Segundo a polícia, Barros usou o posto de relator da PEC do voto impresso para pedir acesso à papelada sobre o ataque feito ao TSE em 2018. Em seguida, Bolsonaro e o deputado divulgaram numa rádio o conteúdo do inquérito sigiloso.

A violação identificada pela PF foi cometida para municiar outra investida criminosa do presidente. Embora aquela invasão ao sistema do TSE não tenha provocado prejuízos à votação ou à contagem de votos, Bolsonaro distorceu o conteúdo dos documentos para reforçar seu ataque às urnas eletrônicas.

O presidente passou meses espalhando mentiras sobre o sistema de votação no país, com o intuito de fabricar desconfiança sobre as eleições de 2022. O objetivo final era abrir caminho para um terceiro crime: desestabilizar o processo de escolha de um novo governo e arranjar uma maneira de permanecer no poder em caso de derrota nas urnas.

Bolsonaro se especializou em desrespeitar a lei para obter ganhos políticos. A PF e o Supremo até provocaram dores de cabeça nos últimos tempos, mas o presidente apostou na boa vontade da Procuradoria-Geral da República, do comando da Câmara e da estrutura de um governo que opera para acobertá-lo.

Com a impunidade garantida, Bolsonaro deu sequência à série e aproveitou para descumprir uma ordem judicial. Na sexta (28), ele faltou ao depoimento que deveria dar à PF para explicar o vazamento do inquérito sobre o ataque hacker ao TSE. O drible pode configurar crime de responsabilidade, mas o presidente sabe que não será incomodado.
 
Folha de São Paulo