segunda-feira, novembro 29, 2021

O voto nos corredores da Justiça




POR GILBERTO MENEZES CÔRTES

A eleição de 2022 tem nesta semana, um preâmbulo invertido do quadro anterior ao último comparecimento dos brasileiros às urnas para escolher o seu presidente por mais quatro anos. O Supremo Tribunal Federal decide na próxima semana, em recurso julgado na 2ª turma, o caso das “rachadinhas” na Alerj, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, onde o então deputado Flávio Bolsonaro rachava/dividia salários de funcionários lotados em seu gabinete. Como Flávio deixou de ser deputado em 1º de janeiro de 2019, mas só tomou posse como senador eleito em 2018, em 1º de fevereiro, no hiato de janeiro de 2019, o Ministério Público do RJ entrou com denúncias de peculato e desvio de dinheiro público. Nas provas colhidas pelo MP, e reconhecidas pelo juiz federal Flávio Itabaiana, com base nos extratos que eram manipulados pelo ex-assessor, o ex-PM Fabrício Queiroz, houve desvio de R$ 1 milhão. Tudo indica que o “modus operandi” também foi praticado nos gabinetes do então deputado federal Jair Bolsonaro, de q
uem Queiroz foi assessor, antes de ser transferido ao filho. Outras denúncias semelhantes foram feitas contra o gabinete do vereador Carlos Bolsonaro. Um DNA familiar.

Entretanto, o processo contra o hoje senador foi barrado no Superior Tribunal de Justiça, pelo seu presidente, ministro João Octávio de Noronha, que se tornou relator de quaisquer futuras ações contra o senador fluminense. E a última decisão de Noronha, cotado para as próximas vagas do STF, inicialmente previstas para 2023, quando se aposentariam, ao completar 75 anos, os ministros Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, foi de considerar nulas todas as provas e extratos bancários já colhidos da movimentação financeira do gabinete do ex-deputado estadual. O MP do RJ quer que o Supremo Tribunal Federal reconsidere o foro privilegiado do atual senador. A questão é que a 2ª turma do STF está desfalcada de um membro, diante do impasse de quase cinco meses para a sabatina do ex-advogado geral da União, André Mendonça, no Senado. A 2ª turma tem só quatro ministros. O relator do caso é o ministro Gilmar Mendes, que tem proferido entendimentos mais em conforme com os pleitos da família Bolsonaro. Dois ministros costumam votar contra: o próprio Lewandowski e Edson Fachin. O ministro Kássio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro, em 2020, é tido como voto certo pró Flávio Bolsonaro. Se o placar empatar em 2 x 2, como é praxe na Justiça, o benefício é do réu.

Esta é apenas uma das preliminares que estão sendo decididas nos corredores da Justiça - nos Tribunais de Justiça dos estados, em uma das 10 Varas Federais (MG pode ganhar uma nova vara em 2022), no STJ e no Supremo – que terão influência nas eleições de 2022. A entrada do ex-juiz Sérgio Moro no rol dos presidenciáveis pode recolocar a questão da corrupção e da impunidade (que são faces da mesma moeda) no debate eleitoral. Embora o STF e o Tribunal Superior Eleitoral tenham arquivado, sem qualquer condenação, apenas com um cartão amarelo, a questão do uso de robôs nas eleições de 2018 e a influência da disseminação de notícias falsas no resultado final (advertindo que não tolerará a repetição em 2022), o Supremo tem, nas mãos do ministro Alexandre de Morais, o caso das “fake news”, que motivou o movimento extremo dos apoiadores de Jair Bolsonaro de pedir o fechamento do Congresso e a invasão do SFT. O fato não se consumou no 7 de setembro, que poderia ser a repetição do assalto contra o Capitólio, a sede do Congresso dos Estados Unidos, pelas hordas de Donald Trump, devido à reação enérgica dos presidentes do STF, Luiz Fux, que foi cobrar proteção da instituição ao comandante do Exército, e do TSE, Luís Roberto Barroso.

Mas o movimento da deputada federal, bolsonarista de carteirinha, Bia Kicis (PSL-DF), de aprovar na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, da qual é presidente, a proposta de redução de 75 para 70 anos na idade limite de permanência de ministros no STF e demais instâncias da Justiça (uma espécie de reedição do AI-5 para revogar a “PEC da Bengala”, de 2015, que reconhecendo o aumento da longevidade no país e a conveniência de aproveitar o saber jurídico dos magistrados por mais um lustro, elevou o prazo de aposentadoria nos tribunais brasileiros), pode fazer tanto quanto fez o AI-5, já em 1969, para remover do STF quem tinha mandatos fixos. Os presidentes da Câmara e do Senado já disseram que a proposta não irá a plenário. Mas as palavras de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco estão na berlinda. Se a proposta prospera, o presidente Bolsonaro que, com ajuda de Nunes Marques e Octávio Noronha, está promovendo a renovação de mais de 75 cargos na Justiça Federal com novos desembargadores (de preferência conservadores), daria um cavalo de pau no lento movimento da Justiça brasileira de se atualizar nas decisões referentes à cidadania plena e à pauta de costumes. De quebra, Lewandowski e Rosa Weber sairiam em 2022 e não em 2023. E Bolsonaro poderia indicar, em reconhecimento, o próprio Noronha para uma das vagas no Supremo, enquanto a 2ª vaga poderia caber ao também evangélico e conservador ministro do STJ, Henrique Martins, alinhado com o governo.

Jornal do Brasil