sexta-feira, outubro 29, 2021

Um desastre na história parlamentar do Brasil chamado Arthur Lira

Publicado em 29 de outubro de 2021 por Tribuna da Internet

Lira sustentou que o relatório da CPI se volta contra a liberdade de expressão 

Pedro do Coutto

A TV Globo e a GloboNews levaram ao ar no final da tarde de quarta-feira e o jornal O Globo focalizou na edição de ontem um pronunciamento do deputado Arthur Lira, presidente da Câmara Federal, logo após ter recebido o relatório da CPI do Senado sobre as ações e omissões do governo Bolsonaro em relação à Covid-19, que já deixou 600 mil mortos no país. A reportagem no O Globo é de Bruno Góes, Mariana Muniz, Daniel Gullino e Adriana Mendes.

Numa atitude inédita no parlamento brasileiro, Arthur Lira não se limitou a receber o documento que estava sendo entregue em função de uma rotina adotada no Legislativo. Ele sustentou que o relatório é inaceitável, inclusive porque se volta contra a liberdade de expressão de deputados eleitos. Equivocou-se. A referência mais contundente é o deputado Ricardo Barros, líder do presidente Bolsonaro no parlamento, mas que não foi acusado por qualquer opinião sua e sim por ter se colocado como intermediador de um incrível projeto de compra da vacina indiana Covaxin.

TRIBUNAL DE EXCEÇÃO  – Arthur Lira colocou-se também contra as acusações da CPI ao presidente Jair Bolsonaro e também ao deputado Eduardo Bolsonaro, defesa que ele estendeu também a Onyx Lorenzoni. Lira chegou a dizer que uma CPI não pode se converter em instrumento de inquisição ou tribunal de exceção.

Bolsonaro, por seu turno, recorreu ao Supremo Tribunal Federal para que o relatório final do senador Renan Calheiro, aprovado pela CPI, possa ser divulgado através das redes sociais da internet. Outro absurdo. A CPI na realidade, ao contrário do que disse Arthur Lira, não julga ninguém. Tanto assim que encaminhou a acusação a Augusto Aras, procurador-geral da República.

Numa entrevista na tarde desta quinta-feira a GloboNews, o ministro aposentado do STF, Ayres Britto, disse que na hipótese da PGR não se manifestar em tempo razoável, o Supremo Tribunal Federal poderá dar encaminhamento próprio às acusações que atingem tanto o presidente da República quanto vários de seus ministros, o ex-ministro Eduardo Pazuello, além de várias outras autoridades e pessoas que se envolveram nas negociações para as compras de vacinas. O relatório focaliza o caso da empresa Precisa, que sem habilitação legal tentou intermediar a compra de vacinas da Índia sem qualquer documento e ainda propondo um adiantamento de US$ 45 milhões.

O SONHO DE ARAS – A respeito do posicionamento a ser adotado por Augusto Aras, focalizo aqui o artigo de Ruy Castro, na edição de ontem da Folha de S. Paulo, quando afirmou que no fundo não há necessidade de investigações, expressão que parte de fatos pelo menos parcialmente ocultos.

Mas as evidências são tantas que o próprio Augusto Aras não precisará perder o sono com novas indecisões. Ruy Castro produziu uma página de humor, sem dúvida. Mas o humor também é uma forma bastante forte para iluminar uma realidade.

NOVA SELIC – Ao decidir elevar a taxa Selic em 1,5%, o Banco Central e o Comitê de Política Monetária elevaram a despesa anual do Brasil em R$ 90 bilhões. Matéria de Gabriel Shinohara e Stephanie Tondo, O Globo, destaca na quinta-feira a decisão tomada na véspera, quando o Banco Central deixou claro que no final de novembro haverá outro aumento. A taxa Selic é a que remunera os títulos do Tesouro Nacional que lastreiam a dívida interna do país. Essa dívida, como já tenho escrito, situa-se em cerca de R$ 6 trilhões, 90% do Produto Interno Bruto.

Portanto, um ponto percentual significa uma despesa adicional de juros de R$ 60 bilhões por ano. Um ponto e meio, assim, faz com que o dispêndio suba para R$ 90 bilhões. A taxa de 7,75% é a mais alta desde dezembro de 2017. O resultado dela é a capitalização dos juros em favor dos credores, os bancos, os fundos de aposentadoria complementar e os fundos de investimento. Isso porque não tendo recursos em dinheiro para pagar os juros, o governo substituiu o pagamento pela emissão de novos títulos.

Com isso, o endividamento sobe, mas outra elevação de juros vai se fazer sentir porque a rentabilidade das aplicações em títulos do Tesouro não pode ser, é claro, inferior à inflação do IBGE, pois neste caso seriam juros negativos que acarretariam prejuízos aos investidores. Prejuízos que teriam como exemplo o que está acontecendo com os salários dos funcionários públicos e dos empregados da iniciativa privada passando pelos servidores regidos pela CLT das empresas estatais.

LUCRO DO SANTANDER – O presidente do Santander no Brasil, Sergio Rial, revelou na tarde de quarta-feira que no trimestre de agosto a outubro o banco atingirá um lucro líquido de R$ 4,3 bilhões, uma elevação de 12,5% em relação ao lucro líquido de igual período do ano passado. O resultado tem sua base maior no crédito a pessoas físicas, créditos esses que chegaram ao volume de R$ 200 bilhões.

A maior parcela de 26%, refere-se ao financiamento de imóveis.  Realmente os lucros do Itaú, Bradesco e Santander, como os dos Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, comprovam que a remuneração do capital financeiro é muito superior à remuneração dos investimentos econômicos. A entrevista de Sergio Rial é objeto da reportagem de Lucas Bombana, Folha de S. Paulo de quinta-feira.

RENDA MÉDIA RECUA – A reportagem, extremamente importante, é de Carolina Nalin, O Globo, e mostra oportunamente o contraste do avanço do Santander, superando a inflação, e a queda do salário médio do trabalho como sempre perdendo para o índice inflacionário. O IBGE informou que o desemprego caiu de 14 milhões para 13,7 milhões de brasileiros e brasileiras. Entretanto, a renda média que em 2020 era de R$ 2,6 mil por mês, agora se encontra em R$ 2,4 mil. Quer dizer que o desemprego baixou segundo o IBGE, mas a renda média também diminuiu. Aliás, digo, existe uma certa confusão a ser dissipada nessa questão do emprego.

Por que nos textos do governo não ficam claras as diferenças entre os empregos com carteira assinada e aqueles que vêm da informalidade? Reconheço, e o IBGE deveria reconhecer, que é muito difícil identificar com precisão o número de empregos informais porque não incluindo as contribuições para o INSS e o FGTS, a avaliação é difícil. Por esse motivo deixo uma pergunta ao IBGE: na próxima divulgação sobre o nível de emprego, poderia explicar como é feito o processo de aferição da empregabilidade informal do país?

PACHECO NA DISPUTA – O Globo de ontem, matéria de Jussara Soares, informa que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, assinou a sua filiação ao PSD, afastando-se, portanto, do DEM pelo qual fora eleito em 2018. Pacheco provavelmente será candidato à Presidência da República. Não que possa vencer as eleições, mas reforça a legenda e deverá retirar votos de Lula ou de Bolsonaro. Nesse caso, se Bolsonaro mantiver mesmo a sua candidatura, o que já está gerando dúvidas no sistema político.

Rodrigo Pacheco, por outro lado, com sua candidatura ao Planalto, afasta ainda mais a perspectiva de uma terceira via fora da polarização entre o PT e a direita brasileira, na qual se inclui a extrema bolsonarista. Estou me referindo à direita porque até hoje não se sabe em qual partido Bolsonaro vai se inscrever. Há dúvida entre o PP e o PL de Valdemar Costa Neto. De qualquer forma, a votação de Rodrigo Pacheco não era igual a zero. Parece que ele influi pouco, mas de qualquer forma influi nas correntes que estão ao lado do governo, embora a sua atuação tenha sido marcada pela independência política do Planalto.

DIVISÃO NO PSDB – Uma reportagem de Carolina Linhares, Folha de S. Paulo, assinala que prévias eleitorais estão sendo realizadas na cidade de São Paulo e no ABC paulista e expondo uma acentuada divisão entre os governadores Eduardo Leite e João Doria. Eduardo Leite tem ganhando espaços principalmente nas áreas lideradas pelo governador Geraldo Alckmin, que será candidato novamente ao governo do estado e se encontra bem situado na mais recente pesquisa do Datafolha.

Alckmin é hoje um adversário declarado de João Doria que ingressou na política apoiado por ele para prefeito da capital paulista. No PSDB, portanto, cresce a possibilidade de vitória do governador do Rio Grande do Sul.