sábado, agosto 28, 2021

Apesar de todos os defeitos de Bolsonaro, é preciso entender que Lula não é solução


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Ilustração reproduzida da Tribuna do Norte

Mario Vitor Rodrigues
O Globo

“No momento, eu penso que a volta de Lula é menos traumática para o Brasil”, declarou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em recente entrevista concedida à jornalista Ana Dubeux, no “Correio Braziliense”. O problema não está na premissa, mas no que ela atenua e, sobretudo, no que esconde.

Diante do pior governo em décadas, e o que mais flerta com a volta de um regime de força desde a reabertura, convém não perder tempo especulando o motivo de uma possível reeleição de Bolsonaro aterrorizar quem preza pela democracia.

PREFERÊNCIA – Mora fundamentalmente nesse temor, mais do que em qualquer avaliação política e de capacidade administrativa, como seria desejável, a ideia de que a volta de Lula ao poder seria preferível à continuidade de Jair. No fundo, como as pesquisas indicam, grande parte da sociedade já caminha célere para o consenso de que, em 2022, qualquer um será melhor opção do que Bolsonaro.

Lula, entretanto, não é qualquer um. Está há quatro décadas na vida pública, já presidiu o país em duas ocasiões, fez sua sucessora e comanda o maior partido do Brasil.

Sua recondução à Presidência não apenas acrescentaria novo capítulo à nossa longa tradição de eleger figuras personalistas, devolveria a uma legenda com inegável sanha hegemônica e capacidade organizacional, o PT, o condão para ditar nossos rumos político e democrático.

PERSPECTIVAS RUINS – Também representam importante senão os pesados fardos com os quais o próximo governante terá de lidar: os desmontes institucionais promovidos pela atual gestão nas mais diversas áreas, desemprego crescente, inflação e desequilíbrio fiscal. A julgar pelo último mandato petista, o de Dilma Rousseff, as perspectivas são pouco animadoras.

Não bastasse o estado de constante caos que impõe aos brasileiros, em verdade precisamente por essa razão, o mandato de Jair Bolsonaro também presta o desserviço de diminuir o nosso nível de exigência.

Assim, qualquer ressalva que hoje em dia se faça em relação às demais opções — especialmente ao petismo, devido à força de sua militância —, sejam os comprovados escândalos de corrupção desenfreada, deslumbramento por regimes autoritários e intransigência ideológica, tudo tende a ser desconsiderado.

LULA NÃO É SOLUÇÃO – A pouco mais de um ano do próximo pleito presidencial, contudo, é imperativo que o debate sobre projetos que possam fazer o país retomar o caminho do crescimento, da diminuição da desigualdade social e a da educação pública de qualidade, especialmente na base, aconteça livre de preconceitos e desvencilhado de táticas que visem a abafar necessários questionamentos. Em especial aqueles por vezes inconvenientes a quem deseja voltar ao poder.

Mesmo nos casos em que a realidade representa um risco maior do que as alternativas, como na hipótese da continuidade do bolsonarismo, não faz sentido, para bem do debate e em nome do registro histórico, se eximir de alertar quando a solução não é a ideal. E Lula, por extensão o Partido dos Trabalhadores e suas já conhecidas formas de fazer política, não é.