Bruno Tavares
Jornal Nacional
E-mails obtidos pelo Jornal Nacional revelam que o diretor de Imunização do Ministério da Saúde, Lauricio Monteiro Cruz, deu aval para que um reverendo e a entidade presidida por ele negociassem 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca em nome do governo brasileiro com a empresa americana Davati.
A Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários, conhecida como Senah, foi fundada pelo reverendo Amilton Gomes de Paula. A sede fica em Brasília. São os nomes da Senah e do reverendo que aparecem nos e-mails obtidos pelos Jornal Nacional.
CARTA DE PROPOSTA – O JN procurou Cristiano Carvalho, representante oficial da Davati no Brasil, e ele confirmou que estava copiado nas mensagens.
No dia 23 de fevereiro, Lauricio Cruz, que é diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, enviou um e-mail para o reverendo Amilton. O assunto do e-mail era: “lista de presença e carta de proposta para fornecimento”.
A mensagem do e-mail começa assim: “inicialmente agradecemos a disponibilidade da Senah, representada por sua pessoa (…) Na apresentação da proposta comercial para fornecimento de 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca”. E finaliza dizendo que “todos os processos de aquisição de vacinas no âmbito do Ministério da Saúde estão sendo direcionados pela Secretaria Executiva”.
REUNIÃO NO MINISTÉRIO – No dia 4 de março, o reverendo postou fotos em uma rede social de uma reunião no Ministério da Saúde. Cruz está em uma das fotos. Na postagem, o reverendo escreveu: “Senah faz reunião no ministério para articulação mundial em busca de vacinas e para a consecução de uma grande quantidade dos imunizantes a ser disponibilizada no Brasil”.
Em 9 de março, Cruz envia outro e-mail, desta vez endereçado a Herman Cardenas, presidente da Davati nos Estados Unidos: “Informo que o Instituto Nacional de Assuntos Humanitários, representado pelo seu presidente Amilton Gomes, esteve no Ministério da Saúde em agenda oficial da Secretaria de Vigilância em Saúde e no Departamento de Logística com a discussão sobre as tratativas sobre a vacina da ‘AstraZenica’ e que o mesmo foi encaminhado para a Secretaria Executiva do Ministério da Saúde”.
Em outro trecho do e-mail, o diretor de Imunização deixa claro que a Senah tinha o aval do Ministério da Saúde para negociar a compra de vacinas com a Davati: “por fim, esperamos que os avanços de forma humanitária entre o Ministério e ‘AstraZenica’ pelo Instituto Nacional de Assuntos Humanitários”. Esse instituto a que ele se refere é a Senah, a entidade presidida pelo reverendo Amilton Gomes de Paula.
EM ESTÁGIO FINAL – No dia seguinte, 10 de março, o reverendo Amilton enviou e-mail para o presidente da Davati nos Estados Unidos. Em inglês, o reverendo escreve: “Eu cordialmente venho agradecer pela confiança depositada em nossa instituição em conduzir negociações com o Ministério da Saúde do Brasil. As negociações estão em estágio final e a expectativa é que o contrato seja assinado em 12 de março de 2021”.
O reverendo diz ainda: “nós pedimos para que enviem os dados para preencher o contrato de aquisição das vacinas (…) E que seja fornecido o s-g-s para ser enviado ao ministro quando ele requisitar”.
SGS é nome de uma empresa de certificação que atesta se determinado produto está em conformidade com as normas e regulamentações.
PREÇO ASTRONÔMICO – Por fim, o reverendo faz um pedido: “nós solicitamos com urgência o FCO atualizado, com o valor de US$ 17,50 como acordado em 5 de março e com a data de entrega”. FCO é uma sigla em inglês que quer dizer oferta completa de venda.
O reverendo manda um novo e-mail, um dia depois. E reafirma, em inglês, para o presidente da Davati, o papel da Senah.
“A Senah, devidamente reconhecida como interlocutora na negociação referente à aquisição das vacinas AstraZeneca entre a companhia Davati e o Ministério da Saúde, vem através deste informar que em 12 de março, às dez da manhã, no horário do Brasil, haverá um encontro com o secretário-executivo do Ministério da Saúde, coronel Élcio Franco, para tratar de questões relacionadas à aquisição de vacinas da AstraZeneca via Davati, fortalecendo assim a confiabilidade dos laços para futuras aquisições”, escreveu o reverendo.
HOUVE A REUNIÃO – Ele pede, então, a presença de representantes da Davati à reunião, já no dia seguinte. O representante da Davati no Brasil, Cristiano Carvalho, confirmou ao Jornal Nacional, por telefone, que o encontro com Élcio Franco, na época secretário executivo do Ministério da Saúde, ocorreu dia 12 de março, às 10h05. A Davati era empresa de material de construção antes da pandemia
Na agenda oficial de Élcio Franco, em dia 12 de março, aparece uma reunião com o presidente do Instituto Força Brasil, coronel Hélcio Bruno de Almeida. O representante da Davati diz que ele também participou da reunião.
O secretario Élcio Franco foi exonerado do cargo em 26 de março. E o negócio com a Davati não foi concretizado. O Jornal Nacional tentou contato com o reverendo Amilton, com o Ministério da Saúde e com a Casa Civil, mas não obteve resposta.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Realmente, virou bagunça. Daqui a pouco vai aparecer no Ministério o pastor Malacheia, digo Malafaia, querendo sua parte nesse latifúndio medicamentoso, no qual predomina o Deus Dinheiro, aquele que na política só aparece para os eleitos. (C.N.)