domingo, julho 04, 2021

PGR (sem Aras) acelera a queda de Bolsonaro e governo entra em sua fase final


Charge do Amarildo (agazeta.com.br)

Pedro do Coutto

Assinado pelo vice-procurador geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, a PGR, respondendo a um despacho da ministra Rosa Weber, formalizou o pedido de inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro, acusando-o de prevaricação, principalmente por não ter tomado medida alguma sobre a denúncia do servidor Luis Ricardo Miranda e do seu irmão, o deputado Luis Miranda, sobre um projeto de corrupção praticado pelo então diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias.

Segundo a denúncia, Ferreira Dias  propôs cobrar uma comissão ilegal na base de US$ 1 de propina para cada dose da vacina Coxavin negociada da Índia destinada, segundo o intermediário Luiz Paulo Dominguetti, a um total de 400 milhões de vacinas ao preço de US$ 15 cada.

EXAGERO – O preço da unidade estava em US$ 15, muito superior ao dos demais laboratórios fabricantes. A proposta foi considerada como um exagero na medida em que prometia um fornecimento de 400 milhões de doses da Astrazeneca para o Ministério da Saúde.

Os leitores deste site provavelmente se perguntam qual o motivo que levou o vice-procurador geral, Humberto Jacques de Medeiros, a se dirigir a ministra Rosa Weber, substituindo assim o procurador-geral Augusto Aras, cujo silêncio foi interpretado como uma fuga da responsabilidade do ato que levará à investigação do presidente da República e, por extensão, vários assessores do Palácio do Planalto.

O ato de Humberto Jacques de Medeiros sintetizou, praticamente, uma revolta dos procuradores contra o procurador-geral, Augusto Aras, aliado do presidente da República, e que temeu se deslocar para uma posição incômoda que o excluiria tanto de investidura em mais dois anos na Presidência da PGR como de sua indicação à vaga de Marco Aurélio Mello, no Supremo tribunal Federal.

RESISTÊNCIA –  Não conseguindo conter o movimento da maioria do Ministério Público Federal, Aras dificilmente poderá ser nomeado para a Corte Suprema. Por falar na vaga de Marco Aurélio, o outro candidato, André Mendonça, já está enfrentando resistências prévias por parte do Senado e também pela maioria do próprio STF. Mas a nomeação para o STF é outro assunto.

A ministra Rosa Weber, que havia cobrado uma ação concreta da PGR, acolheu o tema e estabeleceu a investigação de Bolsonaro no caso das suspeitas do jogo de interesses e de corrupção sobre o episódio Coxavin e Ferreira Dias, cuja conexão transformou-se em um escândalo colossal.

O Globo, a Folha de São Paulo e o Estado de São Paulo tiveram como manchete principal nas edições de ontem a investigação contra Bolsonaro autorizada por Rosa Weber. No O Globo, a reportagem foi de Leandro Prazeres e Mariana Muniz. Na Folha de São Paulo de Matheus Teixeira. No Estado de São Paulo a matéria foi produzida por uma equipe integrada por Pepita Ortega, Rayssa Motta, Weslley Galzo, Daniel Weterman, Matheus Lara e Marcelo de Moraes.

FASE FINAL – O presidente Jair Bolsonaro que já se encontrava em queda livre assume de forma bastante nítida o seu ingresso na fase final de um governo acionado por suas próprias atitudes ao lado de erros e das omissões gigantescas de parte do Palácio do Planalto cuja constelação teve suas faces atingidas, causando também uma sucessão de fatos que conduziram o país a uma total perplexidade.

O governo está em um abismo que separa de um lado o bom senso e de outro o delírio de poder e o desprezo pelo eleitorado que o levou à vitória de 2018 e que não consegue visualizar a enorme dualidade entre o candidato buscando votos e o presidente da República tentando apoios pouco legítimos.

Inúmeros pedidos de impeachment encontram-se engavetados na mesa do deputado Arthur Lira, presidente da Câmara Federal. Agora, entretanto, representantes da oposição e eleitores arrependidos de Bolsonaro ingressaram com um super pedido de impedimento numa tentativa clara de deslocar para o STF a questão envolvendo a inércia proposital da Mesa Diretora da Câmara.

LEGITIMIDADE – A esse respeito Hélio Schwartsman, Folha de São Paulo deste sábado, escreveu um artigo muito importante no qual coloca no debate a legitimidade ou não de um requerimento encaminhado no final da última semana reivindicando o desarquivamento dos pedidos contra Bolsonaro, cujo número vinha aumentando acentuadamente. São 120 requerimentos, todos eles pelo afastamento do presidente da República.

Hélio Schwartsman coloca bem a questão ao dizer que se a legislação prevê a hipótese do plenário de uma das casas do Congresso decidir pela colocação em pauta do impeachment, ele, o requerimento, terá que ser logicamente debatido, pois se assim não fosse, inclusive sob o ângulo constitucional, não seria possível o plenário derrubar o despacho do presidente da Casa.

PREVARICAÇÃO –  Numa entrevista de página inteira à Julia Lindner e Natália Portinari, O Globo de ontem, o presidente da CPI da pandemia sustenta que diante dos fatos que vieram já vieram à tona, qualquer servidor público diria que Jair Bolsonaro prevaricou na medida em que não tomou nenhuma atitude diante da denúncia recebida pelo deputado Luis Miranda e pelo seu irmão, Luis Ricardo Miranda, formalizada no dia 20 de março.

Omar Aziz destaca a sua surpresa com o fato de servidores de alta categoria aceitarem jantar com Dominguetti para conversar sobre compras de vacinas sem nunca o terem visto na vida. Esta é a indagação que a opinião pública brasileira está fazendo, pois se trata de um episódio de um absurdo completo.

PROCESSOS – Dominguetti é cabo da Policia Militar de MInas Gerais e responde a 36 processos  administrativos e militares junto à corporação. Além do mais, está sendo cobrado pela aquisição de um automóvel e não ter pago as prestações devidas. O senador Tasso Jereissati, como a Globo News exibiu na sexta-feira, demonstrou-se surpreendido com a participação de um intermediário, não especialista na matéria.

O governo Bolsonaro, portanto, está ingressando em seu capítulo final, transformando-se no maior líder da oposição a seu próprio governo, comandando paralelamente uma corrente negacionista que atinge em cheio a população brasileira.