Daniel Gullino
O Globo
Enquanto responde a um procedimento disciplinar no Exército, o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, resiste aos conselhos de passar para a reserva por temer que isso piore sua situação na CPI da Covid. Após prestar um primeiro depoimento, dividido em dois dias, Pazuello já foi reconvocado pela comissão, e considera que o status de militar da ativa pode render um tratamento diferenciado dos senadores — e até mesmo evitar um eventual pedido de prisão, ainda que esteja protegido por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Pazuello apresentou anteontem sua defesa no processo aberto no Exército após sua participação em um ato político ao lado do presidente Jair Bolsonaro, no domingo passado, no Rio.
TESE POLÊMICA – No documento, o ex-ministro alegou que o ato não tinha caráter político — tese repetida por Bolsonaro em transmissão nas suas redes sociais. Agora, a justificativa será analisada pelo comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira, e Pazuello ainda poderá ser ouvido pessoalmente.
Enquanto isso, o ex-ministro da Saúde tem sido pressionado a passar para reserva, como uma forma de reduzir o desgaste da Força.
De acordo com interlocutores de Pazuello, a resistência em aceitar os conselhos é explicada pelo temor de que, se ele deixar a ativa, os membros da CPI adotariam uma atitude mais dura.
FALSO TESTEMUNHO – Um general da reserva aponta, por exemplo, que caso os senadores queiram prender em flagrante Pazuello por falso testemunho — como foi cogitado com o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten —, o ex-ministro poderia utilizar o artigo do Código de Processo Penal Militar que determina que “a prisão de militar deverá ser feita por outro militar de posto ou graduação superior; ou, se igual, mais antigo”. O código, contudo, trata de inquéritos militares e não precisaria ser seguido pela CPI.
Antes de seu primeiro depoimento à comissão, Pazuello conseguiu um habeas corpus que lhe garantiu o direito de não se incriminar, mas acabou respondendo a praticamente todas as perguntas. Senadores, no entanto, sustentam que ele mentiu em diversas oportunidades por se sentir protegido pelo habeas corpus.
NOVO DEPOIMENTO – O objetivo é que em um novo depoimento ele seja confrontado sobre os pontos em que teria mentido, e também sobre contradições entre sua fala e a de testemunhas que prestaram o depoimento posteriormente, como Mayra Pinheiro, secretária de Gestão do Trabalho do Ministério da Saúde, e o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas.
O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), chamou o general de “mentiroso assumido” e disse que a reconvocação seria “pedagógica” para evitar que outros depoentes usassem o mesmo artifício.