José Nêumanne
Estadão
Nove encontros da cúpula do Congresso com grandes empresários, representantes de bancos e do mercado financeiro resultaram em movimento político pela intervenção no desgoverno de Bolsonaro. Os mais de 300 mil mortos pela covid-19 e a situação cada vez pior da economia levaram os presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, a afinarem o discurso com o mercado.
Ambos têm colocado o impeachment como possibilidade, se as conversas com o governo fracassarem. As cobranças mais urgentes do setor econômico eram a demissão dos ministros das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e do Meio Ambiente, Ricardo Salles. A avaliação recorrente nas reuniões é de que Araújo atrapalha as negociações por vacinas e insumos da Índia e da China. E Salles prejudica contatos com os Estados Unidos. Bem, Araújo já foi exonerado, mas ainda falta o governo se livrar de Salles.
TRÁFEGO AÉREO – Na recentíssima História do Brasil, processos de impeachment são precedidos de intenso tráfego aéreo entre Brasília e São Paulo, com jatinhos particulares transportando parlamentares e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) interessados em mudar presidentes da República.
Esse tráfego foi bastante intenso quando o alvo era Fernando Collor, processo no qual o vice, substituto constitucional e, portanto, maior interessado, era o mineiro Itamar Franco. Mas este nem precisou mexer-se muito, deixando a articulação no Legislativo com Fernando Henrique, no Senado, e Roseane Sarney, na Câmara dos Deputados. Collor ainda tentou reagir com a mão pesada do líder da bancada do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) na Câmara, Roberto Jefferson, e os conselhos de Thales Ramalho, que tinha sido muito próximo de Tancredo Neves.
No caso de Dilma Rousseff, que era ainda mais desastrada do que o alagoano nascido no Rio, tudo ficou nas mãos de Eduardo Cunha, o Caranguejo do propinoduto da Odebrecht no processo chamado de mensalão no STF.
QUADRILHÃO DO MDB – Toda a complicada conspiração que levou Collor ao solo foi substituída pela costura de uma conspiração, na qual pontificava o “quadrilhão” do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), para ocupar o poder na pessoa do vice Michel Temer, escolhido por Lula para as chapas vencedoras de madame.
A sólida aliança que havia evitado o impeachment e garantido a reeleição de Lula em plena efervescência do mensalão derreteu-se no fogo ateado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, e seu lugar-tenente preferido, Romero Jucá. A aliança, que levou o constitucionalista de Tietê ao cargo máximo da República, manteve-o lá, apesar de todos os esforços de um adversário institucionalmente poderoso, mas politicamente inofensivo, Rodrigo Janot, que não alcançou a maioria de três quintos necessária dos deputados federais para depor o ex-vice.
Agora, mais uma vez o impeachment se torna necessário.