terça-feira, março 30, 2021

Ao demitir o ministro da Defesa, Bolsonaro entra na fase do pré-golpe de seu sonho ditatorial


Charge do Flávio Luiz (Arquivo Google)

Carlos Newton

Sabe-se, com toda certeza, que o presidente Jair Bolsonaro é desprovido de equilíbrio emocional e não tem condições de continuar no cargo. Mas a democracia é assim mesmo e não há como pedir uma junta médica para examinar o chefe do governo. Assim, a gente vai levando, contém a indignação e fica torcendo para chegar logo à próxima eleição. Mas há ocasiões em que o presidente é quem se encarrega de encomendar a própria queda.

É exatamente o que está acontecendo com Jair Bolsonaro. Ao demitir o experiente ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, o chefe do governo pretende que o substituto, general Braga Netto, um apagado chefe da Casa Civil, seja também desequilibrado a ponto de garantir envolvimento direto das Forças Armadas com a política, que é o principal motivo da atual crise.

NO FORTE APACHE – O descontentamento militar vem se arrastando desde abril do ano passado, quando o “gabinete do ódio” convocou e organizou uma manifestação antidemocrática diante do território sagrado do Forte Apache, Quartel-Geral do Exército, com discurso do próprio Bolsonaro, em meio a faixas e cartazes pedindo o fechamento do Supremo e do Congresso.

O fato concreto é que Bolsonaro, em seus delírios, desde a eleição julga ser comandante-em-chefe das Forças Armadas “lato sensu”, em sentido amplo, esquecido de que somente pode exercer esses poderes nos termos expressos contidos na Constituição.

Seu sonho é criar um estado de exceção que possa lhe garantir superpoderes institucionais, conforme ocorreu em 1964 e 1968, com edição do AI-1 e do AI-5, sem perceber que essa possibilidade é absolutamente impossível em período de democracia plena, como se vive no Brasil de hoje, apesar de todas as mazelas nacionais.

PRÉ-GOLPE – Na mente doentia de Bolsonaro, a demissão do correto e responsável general Fernando Azevedo e Silva corresponde a uma espécie de pré-golpe, suficiente para lhe garantir um automático alinhamento das Forças Armadas a seus planos de empolgar o poder ditatorialmente.

Na sua ignorância, ele pensa que basta nomear para o Ministério da Defesa um chefe militar vergável, amoldável e maleável, que troque os comandantes das Forças Armadas por oficiais também manejáveis, para abrir caminho ao estado de exceção. Mas será que o escolhido, general Walter Braga Neto, tem esse perfil?

“Oh, coitado!” – diria a humorista Gorete Milagres ao tomar conhecimento desses planos bolsonarianos. Realmente, o estado mental do presidente chega a dar pena. Como ele pode julgar que os militares brasileiros sejam de tão baixo nível? Como pretender que os oficiais superiores o acompanhem nessa tresloucada aventura, quando eles são formados e treinados exatamente para fazer o contrário e manter a democracia?

OUTRAS EXONERAÇÕES – Bolsonaro espera que entreguem seus cargos os comandantes do Exército, general Edson Pujol, da Marinha, almirante Ilques Barbosa Júnior, e da Aeronáutica, brigadeiro Antonio Carlos Moretti Bermudez, que se reuniram nesta segunda-feira, para tomar uma posição conjunta.

Hoje, 30 de março, exatamente na véspera da comemoração do golpe de 64, saberemos se os três comandantes vão permanecer ou também serão exonerados. Mas a exata extensão da crise somente será divulgada nesta quarta-feira, nas ordens do dia de Exército, Marinha e Aeronáutica, que irão relembrar o aniversário da chamada Redentora.

Em tradução simultânea, é grave a crise. Mas a democracia ainda não está sob ameaça. Isso só ocorrerá se houver quebra das normas constitucionais. No momento, o presidente pensa que se fortaleceu, mas na realidade pode estar cavando um abismo a seus pés, sem entender que o mundo é um moinho, como ensinava o mestre Cartola, numa linguagem simples, que até Bolsonaro pode entender.