segunda-feira, agosto 24, 2020

Veja quanto está ganhando o rentista que compra títulos da dívida interna ou externa


TRIBUNA DA INTERNET | Governo remunera ilegalmente todo o dinheiro ...
Charge do Clayton (O Povo/CE)
Mathias Erdtmann
Antes de mais nada, rentista é um termo amplo e, para estimar melhor, precisamos reduzir o espectro e estudar apenas algumas categorias. Aqui avaliaremos a situação de apenas duas categorias em suas tentativas de ganhar dinheiro com pouco esforço, a partir da dívida pública brasileira:
(1) Investidores Pessoas Físicas (PF) Brasileiras (os 10% mais ricos do Brasil)
(2) Investidores PF Estrangeiras (incluindo os 1% de brasileiros mais ricos que dispõe de recursos em contas estrangeiras)
Vejam que nestas categorias estamos analisando somente as Pessoas Físicas, deixando de lado as Pessoas Jurídicas, Bancos, Holding, Dealers, etc, que seriam um mundo à parte (onde os 0,1% de ultraricos se encontrariam).
ANTES DA QUEDA – Ainda assim, dentro do universo das Pessoas Físicas, há de se avaliar o que está disponível como opção em termos de títulos novos (rentistas de curto prazo), mas também a composição de estoque de quem comprou ao longo dos anos (rentistas de longo prazo, perfil mais típico).
Para a categoria (1), PF Brasileira, para descontar o efeito inflacionário, vou utilizar a abordagem mais fácil, analisando compras do título IPCA+ via Tesouro Direto (TD). Esses títulos pagam como bônus a correção monetária, acrescida dos juros.
O rentista de longo prazo (10 anos) tem recebido 3,6% ao ano de juros, já descontados a inflação, os impostos e a custódia do TD (assumido 15% de IR). Desta média, tem-se 3,76% nos primeiros 5 anos e 3,49% nos últimos 5, de onde pode ser observada uma trajetória de redução dos juros.
APÓS A QUEDA – Os títulos ofertados atualmente, após a queda da taca Selic, pagam 2,95% brutos, que após impostos e custódia, assumindo as metas inflacionárias para os próximos 10 anos, resultam em um retorno de 1,85% acima da inflação. Portanto, se for possível manter tudo como está, teremos uma redução significativa dos ganhos dos rentistas PFs Brasileiros no longo prazo.
Embora ainda tenham assegurada sua sobrevivência, com juros positivos, muito possivelmente terão que ao menos avaliar investimentos em outras áreas, como a bolsa de valores.
Já para a categoria (2), PF Estrangeira, a situação é bem distinta. Aqui utilizei para análise os títulos da dívida externa emitidos em Dólar, também com prazo aproximado de 10 anos.
Os regimes fiscais são um pouco diferentes, então apresentarei os cenários para um residente fiscal no Brasil (que seria o caso de um Brasileiro que detém uma conta no exterior) e outro na Europa.
VEJA AS DIFERENÇAS – O PF Estrangeiro residente no Brasil paga 15% de IR sobre os rendimentos, enquanto o PF Estrangeiro residente na Europa (Alemanha) paga 26,4%. Com essas premissas, temos que o PF Estrangeiro pagando IR no Brasil lucrou uma média de 2,5% de juros anuais ao longo dos últimos 10 anos, sendo tanto os juros quanto o principal cotados em dólar (já descontada a inflação e tributos, mas não considerando os eventuais lucros/prejuízos cambiais), enquanto o PF Estrangeiro pagando IR na Europa teria tido um lucro médio de 2,0% ao ano.
Agora, o ponto relevante aqui é que os primeiros cinco anos compuseram 2,2% de juros anuais, enquanto os 5 anos posteriores renderam 2,9% ao ano, em uma trajetória ascendente.
Os títulos emitidos há 2 meses atrás, em meio aos juros mundiais mais baixos da história, contam com juros reais de 2,3% anuais, em cima do dólar (cupom de 3,875%, descontada inflação e tributos). Desta forma, aqui a tendência é inversa: os últimos anos tem rendido bem, e os novos títulos rendem tanto quanto os antigos (um pouco menos apenas). Outra curiosidade é que, no longo prazo, será melhor ser Estrangeiro que Brasileiro (do ponto de vista do juros, claro).
INTERNA OU EXTERNA – O resumo da história é que se mostra mais lucrativo para Pessoas Físicas comprar a dívida externa Brasileira (2,3% ao ano) ao invés de comprar a dívida interna (1,9% ao ano). De fato, há um fluxo enorme de dinheiro saindo do país com esses rumos, e o próprio governo deu este sinal aos investidores, pois é ele que define os bônus dos títulos e o volume emitido. Claro que não estou entrando no mérito das necessidades deste financiamento público nas diferentes moedas, nem da variação cambial e se é mais ou menos arriscado ter o dinheiro guardado em dólar ou real, e avaliando somente o bônus (juros) do ponto de vista do investidor.
Imagino que os consultores de gestão de fortuna devam estar sugerindo para seus clientes realizar esta transição para brasileiros dispostos a enviar seu dinheiro para longe, para investir como estrangeiros no Brasil – que é um arranjo um tanto quanto curioso.
OPÇÕES DO RENTISTA – Por fim, a vida do rentista está sim dificultada, mas não inviabilizada, sendo necessário um grau de sofisticação maior para manter um rendimento maior que 2% ao ano, obrigando o rentista que quiser ganhar acima dos 3% a migrar para áreas de maior risco.
Pode optar por como sociedade de ações; ou para áreas de maior esforço, como trabalhar (“oh, céus!”), abrir uma empresa (“oh, vida!”), comprar um imóvel para construir ou alugar (“oh, azar!”), ou reduzir o padrão de vida para poder manter o fluxo contínuo de renda.