sexta-feira, fevereiro 21, 2020

Aos pseudos Juristas de Jeremoabo

A imagem pode conter: texto



PODER JUDICIÁRIO
 JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
 Seção Judiciária de Pernambuco - 20ª Vara Federal
 Processo nº 0000972-93.2009.4.05.8304



 1 Processo nº 0000972-93.2009.4.05.8304
 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e outros
 Réu: HUGO XAVIER DE SÁ CARVALHO

 SENTENÇA

 (Tipo “A” SEN.0020.000034-3/2011) 1

. RELATÓRIO

 Trata-se de ação civil por atos de improbidade administrativa, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de HUGO XAVIER DE SÁ CARVALHO

. Aduz o autor que o réu, ex-prefeito do Município de Belém do São Francisco/PE, praticou atos de improbidade administrativa, tipificados no art. 10, caput, e art. 11, II, da Lei de Improbidade Administrativa nº 8.429/92 (LIA), consistente na ausência de recolhimento ao INSS das contribuições previdenciárias descontadas dos servidores efetivos e desvio indevido das referidas verbas.

 Consoante narra a parte autora, o ex-gestor efetuou desconto no contracheque dos servidores efetivos da Municipalidade a título de contribuição previdenciária, mas não efetuou os repasses ao INSS, utilizando a verba indevidamente. Juntou documentos (f. 17/113).

 Requer que o demandado seja condenado ao ressarcimento integral dos valores descontados, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos por três anos, pagamento de multa civil no montante dos valores descontados e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios por cinco anos.

 Notificado a apresentar a manifestação prevista no art. 17, §7º, da Lei nº 8.429/92, o demandado ofereceu defesa preliminar às fls. 134/156.

 Em suma, reconheceu que não houve o recolhimento dos valores descontados dos servidores municipais. Para tanto, alegou que em razão de o município não possuir regime próprio de previdência social e a fim de evitar que seus servidores ficassem desamparados em relação aos benefícios previdenciários, o próprio município efetuava o recolhimento da contribuição, mantendo os valores em sua conta bancária, e efetuava o pagamento de benefícios previdenciários. Afirmou que não houve prejuízo ao erário, uma vez que os valores permaneceram à disposição do município e foram utilizados em benefício dos servidores, alegando, ainda, que não houve dolo ou má-fé a ensejar a qualificação do ato como ímprobo, pelo que requereu a total improcedência dos pedidos.

 Manifestação do Ministério Público Federal às f. 163/166.

Decisão à fl. 168/169, recebendo a petição inicial e determinando a citação do demandado.

 Efetuada a citação, o demandado apresentou contestação mantendo os termos da defesa preliminar, acrescentando, ainda, que os valores não repassados à Previdência foram objeto de parcelamento celebrado entre o Município de Belém do São Francisco/PE e a Receita Federal do Brasil, o que implicaria em reconhecer a inexistência de dano ao erário

. Manifestação do MPF às f. 210/212

. Diante do requerimento das partes, foi realizada audiência de instrução, por meio audiovisual, para oitiva das testemunhas arroladas (f. 260 e 272). Juntada de ofício pelo demandado (f. 268/271).

 Alegações finais do autor e do réu, respectivamente, às f. 276/280 e 282/302

. Vieram-me os autos conclusos.

 É o relatório

. 2. FUNDAMENTAÇÃO

 2.2 Mérito

 O cerne da presente lide reside em saber se a conduta do réu, efetuar descontos de contribuições previdenciárias de servidores públicos, sem proceder ao repasse ao INSS, quando inexistente lei que tenha instituído regime próprio de previdência social municipal, mas efetuando a gestão dos recursos recolhidos para a finalidade previdenciária, configurou ato de improbidade administrativa, a merecer as reprimendas contidas na Lei nº 8.429/92. Vejamos.

 A Carta da República, no art. 37, caput, dispõe que a Administração Pública direta e indireta deve obedecer aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, rezando, outrossim, no § 4.º do mesmo dispositivo, que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, da forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”

. Sabe-se que o conceito de improbidade, assim denominado pela Carta Magna o ato lesivo à moralidade administrativa, está intimamente ligado à necessidade de o agente público agir sempre, impreterivelmente, com honestidade e em atendimento aos interesses públicos, sem aproveitar-se indevidamente dos poderes e facilidades que lhes são conferidos no exercício de mandato, função, emprego ou cargo público.

 Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, para que o ato de improbidade administrativa possa acarretar a aplicação das medidas sancionatórias presentes no art. 37, § 4.º, da CR/88, devem estar presentes determinados elementos, quais sejam: o sujeito passivo ser uma das entidades mencionadas no art. 1.º da Lei n.º 8.429/92; o sujeito ativo ser um agente público ou terceiro que induza ou concorra para a prática de ato de improbidade ou dele se beneficie; a ocorrência de ato danoso causador de enriquecimento ilícito para o sujeito ativo, prejuízo para o erário ou atentado contra os princípios da Administração Pública e a presença de elemento subjetivo: dolo ou culpa. 

Analiso a presença desses componentes no caso em tela.

 O art. 1º da Lei n.º 8.429/92 explicita quais os entes administrativos passíveis de sofrer a prática de um ato de improbidade:

 Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

 Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.

 Observe-se que aí estão relacionados os órgãos da administração direta, à qual pertence a municipalidade pretensamente atingida pelas irregularidades provenientes da alegada frustração da licitude do processo licitatório. 

A mesma lei dispõe, nos arts. 2º e 3º, aqueles que podem ser sujeito ativo do ato de improbidade administrativa

: Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior. 

Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

 Aperfeiçoado igualmente esse requisito, vez que o réu era, à época da ocorrência dos atos descritos na vestibular, prefeito do Município de Belém do São 1 In Direito administrativo. 17 ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 705.

Francisco/PE, fato incontroverso nos presentes autos.
 Resta, assim, apurar a ocorrência dos demais elementos, quais sejam: a ocorrência do ato ímprobo e a prática deste com dolo ou culpa, conforme o tipo de improbidade.

 Sabe-se que, nos termos do disposto nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92, os atos de improbidade administrativa compreendem 3 (três) modalidades, quais sejam: a) os que importem enriquecimento ilícito; b) os que causam prejuízo ao erário; c) os que atentam contra os princípios da Administração Pública.

 In casu, pretende-se a imputação aos demandados de ato de improbidade causador de dano ao erário, previsto na primeira parte do art. 10, caput, e do art. 11, da Lei de Improbidade Administrativa. In verbis:

 “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente”. 

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

 II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”.

 No caso dos autos, a acusação do Ministério Público acerca da omissão do demandado quanto ao repasse das contribuições previdenciárias descontadas dos servidores do município trata-se de ponto incontroverso, uma vez que o próprio demandado reconhece a ilicitude do ato, embora não lhe atribua a qualidade de ímprobo.

 Extrai-se dos autos que, de fato, foram efetuados descontos previdenciários na folha de pagamento dos servidores públicos do município de Belém do São Francisco/PE, os quais não foram repassados ao INSS (f. 33/34; 68).

 O demandado justificou tal fato, tanto no procedimento administrativo quanto em sede judicial, argüindo que, à época dos fatos (2003/2004), o município ainda não possuía regime próprio de previdência social e a fim de que “ninguém ficasse prejudicado”, a própria edilidade passou a reter os valores de contribuição previdenciária em conta bancária própria, ao passo que efetuava o pagamento dos benefícios previdenciários aos servidores (f. 40/41; 134/156).

 Observa-se que o principal pilar de argumentação da conduta do demandado não subsiste a uma mera análise da legislação pátria, notadamente dos arts. 201 da Constituição Federal e art. 12 da Lei 8.213/91:

“Art. 201 (CF): A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial (...)”.

 “Art. 12 (Lei 8.213/91): O servidor civil ocupante de cargo efetivo ou o militar da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, bem como o das respectivas autarquias e fundações, são excluídos do Regime Geral de Previdência Social consubstanciado nesta Lei, desde que amparados por regime próprio de previdência social”.

 Conclui-se, portanto, que a ausência de regime próprio de previdência social do município não implica em desamparo previdenciário dos servidores municipais, uma vez que a adesão ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS – é automática e independe de lei específica nesse sentido, ao contrário do quanto afirmado pelo demandado, o qual compreendia erroneamente que haveria tal necessidade. Se existe necessidade de lei, é justamente no caso inverso, ou seja, para a implementação de um regime próprio de previdência social.

 Caracterizada, portanto, a ilicitude praticada, resta averiguar se a referida conduta possui o condão de caracterizar-se como ato de improbidade administrativa, nos moldes previstos nos art. 10, caput, e art. 11, II, da Lei de Improbidade Administrativa.

 No que concerne ao art. 10, que define o ato de improbidade que acarrete lesão ao erário, não obstante a gravidade da conduta praticada, há que se reconhecer a não ocorrência de dano patrimonial à edilidade, tendo em vista a existência de parcelamento do débito pelo município junto à Receita Federal do Brasil (f. 268/271), na esteira dos posicionamentos doutrinário e jurisprudencial a respeito da questão, notadamente o atual entendimento adotado pelo E. Superior Tribunal de Justiça e demais tribunais pátrios:

 Além da ilegalidade, é requisito de sua configuração a ocorrência de efetivo dano material aos cofres públicos. Nem o prejuízo presumido nem o dano moral serve para sua caracterização. Pelo contrário, sem a prova da perda patrimonial certa não se verifica esse tipo de improbidade administrativa, restando ao autor da ação civil respectiva responsabilizar o agente público, desde que comprove que sua conduta funcional antijurídica infringiu os princípios constitucionais reguladores da Administração Pública, por violação do art. 11 da LIA. 2 PROCESSUAL CIVIL.

 ADMINISTRATIVO. RECURSOS ESPECIAIS. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. DESCUMPRIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. NÃOCONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282/STF e 211/STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO-CONFIGURAÇÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (ARTS. 10, VIII E IX, DA LEI 8.429/92). 2 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa comentada. Aspectos constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 78-79.

LESÃO AO ERÁRIO. INEXISTÊNCIA. REQUISITO ESSENCIAL PARA A CONFIGURAÇÃO DA CONDUTA PREVISTA NO REFERIDO PRECEITO. RECURSOS ESPECIAIS PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA PARTE, PROVIDOS. (...) 4. (...). 6. O ato de improbidade previsto no art. 10 da LIA exige para a sua configuração, necessariamente, o efetivo prejuízo ao erário, sob pena da não-tipificação do ato impugnado. Haveria, portanto, uma exceção à hipótese prevista no inciso I do art. 21, o qual somente deve ser aplicado nos casos de improbidade administrativa descritos nos arts. 9º e 11 da Lei 8.429/92. 7. Recursos especiais parcialmente conhecidos e, nessa parte, providos. (RESP 200400941923, Denise Arruda, STJ - Primeira Turma, 29/11/2007) 

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO. AUSÊNCIA DE REPASSE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO AOS COFRES DA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL DESPROPORCIONALIDADE DAS SANÇÕES. O ato praticado pelo Prefeito, embora censurável, não justifica a postulação das rigorosas sanções do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa. Não obstante a inobservância da norma, a conduta levada a efeito não pode ser objeto de valoração isolada, separada do contexto em que se deu. E segundo depreende-se dos autos, a postura do Prefeito teve por alvo o interesse social. Ademais, considerando que os débitos do Município para com o INSS encontram-se renegociados e regularmente pagos, bem como que não houve prejuízo aos cofres da Administração Municipal, a desproporcionalidade das sanções seria flagrante, causando ao agente maior lesão do que aquela que ele causou ao ente estatal. (AC 200271050078915, Valdemar Capeletti, TRF4 - Quarta Turma, 08/11/2006)

 ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE REPASSE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS RECOLHIDAS. NÃO-PROVOCAÇÃO DE PREJUÍZOS AO MUNICÍPIO. 1. É de ser mantido acórdão que, seguindo entendimento da sentença, considera improcedente ação de improbidade administrativa contra prefeito municipal que deixa de repassar aos cofres da Previdência Social valores recolhidos de contribuição previdenciária. 2. Débitos questionados que se encontram negociados com o INSS. 3. Ausência de prejuízo ao município. 4. Não-caracterização da infração administrativa capitulada nos arts. 10, caput, e incisos X e XI, e art. 11, caput, incisos I e II, da Lei n. 8.429/92. 5. Parecer da matéria pública pela confirmação do decisório recorrido. 6. Recurso especial não-provido. (RESP 200701529468, José Delgado, STJ - Primeira Turma, 23/04/2008 

Acertada a consolidação dos entendimentos jurisprudenciais, pois se a própria esfera penal, ultima ratio, aceita o parcelamento como forma de suspensão das ações penais que buscam a pretensão punitiva estatal, e se a própria Receita Federal classifica o devedor-parcelante como sujeito quite com suas obrigações, a ponto de lhe emitir uma certidão positiva com efeitos negativos, a imposição de sanções da lei de improbidade administrativa, no mesmo caso, mostra-se como fortemente  excessiva, pois se nem a execução fiscal prossegue, não pode uma sanção política der espaço lógico.

 Com efeito, o MPF, autor da demanda, não se desincumbiu do ônus probatório que lhe cabia, conforme regra de distribuição estática do ônus da prova adotado pelo Código de Processo Civil (art. 333, I), uma vez que não há nos autos, ainda que em sede de procedimento administrativo, qualquer prova no sentido de que houve desvio da verba pública oriunda dos recolhimentos previdenciários efetuados pelo município.

 Ao contrário. A prova testemunhal foi unânime no sentido de que não havia locupletamento do ex-gestor em relação às quantias retidas na folha de pagamento municipal e que os valores recolhidos eram utilizados para pagamento de benefícios previdenciários aos servidores municipais e permaneciam nos cofres públicos.

 Nesse sentido, a testemunha Antonio Raimundo dos Santos, testemunha de acusação, afirmou que recebeu do gestor, à época, a informação de que o INSS não estava pagando aos inativos e aos pensionistas da prefeitura, razão pela qual a prefeitura estava usando o dinheiro para pagar aos inativos. (04:27)

 Questionado se saberia informar se o Sr. Hugo, ora demandado, teria se apropriado do dinheiro recolhido, respondeu negativamente. (07:38)

 Afirmou, ainda, que à época dos fatos, ou seja, antes da criação do regime próprio de previdência social, o município já pagava benefícios previdenciários. (08:40)

 A segunda testemunha, Maria da Gloria Rodrigues Nogueira, também testemunha de acusação, questionada acerca da destinação do dinheiro arrecadado pelo demandado, afirmou que foi informada que o dinheiro seria utilizado para pagamento de benefícios previdenciários. (12:30)

 Esclareceu, ainda, a testemunha, que “a gente estava preocupado, na realidade, com nossa aposentadoria, uma vez que não estava sendo repassado ao INSS (14:00)

 Questionada se tinha conhecimento de alguém que teria se dirigido ao INSS, tendo seu requerimento negado, afirmou que não teve conhecimento de funcionário que ficou sem receber aposentadoria no INSS. (18:15)

 Importante o esclarecimento da testemunha ao afirmar que: “o que a gente estava querendo, de fato, é que não fosse descontado dos nossos vencimentos (...) na época, de fato, o que a gente queria era que suspendesse, já que não estava sendo repassado (...) e que a gente pagasse, cada um pagasse o seu”. (20:30) 

Afirmou, ainda, que não era do seu conhecimento que alguém tivesse ficado insatisfeito por ter ido à procura da prefeitura e não ter conseguido o benefício previdenciário. (21:55) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA

                                                             (...)

Registre-se que o STJ, em recentíssimo julgado, teve oportunidade de se manifestar em caso análogo ao dos autos, no que diz respeito à omissão quanto ao repasse de contribuições previdenciárias recolhidas, adotando mais uma vez o entendimento de que se exige a presença do elemento subjetivo para a qualificação da ilegalidade como o ato ímprobo previsto no art. 11 da Lei de Improbidade Adminsitrativa: ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

 AUSÊNCIA DE REPASSE DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA RETIDA DOS SERVIDORES PÚBLICOS. UTILIZAÇÃO DA VERBA PARA O CUMPRIMENTO DE OUTRA FINALIDADE PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA IN CASU. 1. Hipótese em que o Ministério Público do Estado de Minas Gerais propôs Ação Civil Pública contra o ex-prefeito de Governador Valadares/MG por ter deixado de recolher à Previdência Social as parcelas retidas dos servidores municipais e aquelas devidas pelo próprio Município, a título de Contribuição Previdenciária. 

2. O Tribunal de origem, apesar de reconhecer a ausência de repasse, consignou ausência de violação dos princípios da Administração Pública, pois atribuiu-se outra finalidade pública à quantia não repassada. 3. A Lei de Improbidade Administrativa deve ser interpretada de acordo com a sistemática inaugurada pela Constituição de 1988, que alterou sobremaneira o papel das municipalidades no âmbito do direito previdenciário. 4. Muito embora não seja possível estabelecer uma regra geral, o caso dos autos não representa improbidade, já que a escolha tomada pelo administrador público (de deixar de repassar o tributo aos cofres previdenciários) deveu-se à necessidade de saldar dívidas de administrações anteriores, a fim de evitar o bloqueio do Fundo de Participação dos Municípios – FPM. 5. Registre-se que não se trata de "carta branca" para que os administradores, em toda e qualquer situação, deixem de repassar à Seguridade Social o tributo que lhe é devido. Apenas se está afirmando que, dadas as peculiaridades do caso concreto, o prefeito não praticou ato ímprobo, pois evitou efeitos financeiros ainda mais drásticos para o Município e seus servidores. 6. Recurso Especial não provido. (RESP 200000078646, Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, 19/05/2010)

 Tendo em vista a similitude do referido julgado com o caso em análise, transcrevo trecho do brilhante voto do E. Ministro do STJ, Mauro Campbell Marques, ao analisar a indispensabilidade do elemento subjetivo do dolo para configuração do ato de improbidade descrito no art. 11 da Lei nº 8.249/92:

 “Se por negligência, imprudência ou imperícia, os administradores violam os deveres de legalidade, honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições (que é o substrato fático que autoriza a incidência do art. 11 da Lei n. 8.429/92), por mais desaconselhável que isso seja, haverá irregularidade administrativa (e não improbidade), que também é uma infração, merecendo sanção por outras esferas de controle, tais como a de responsabilização fiscal, a dos processos administrativos disciplinares, a da fiscalização dos Tribunais de Contas e os demais mecanismos de controle interno da Administração Pública, sem embargos do não menos eficiente controle exercido pelos novéis Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público.

 Não se trata de ser por demais permissivo, e sim de compreender o espírito das normas que resguardam a probidade administrativa. Nesse sentido, aproveito as lições de Juarez Freitas acerca dos arts. 9º e 11 da LIA: "[p]ara mim, para que haja improbidade administrativa, em qualquer uma das três espécies, há dois requisitos fundamentais. [...] O juiz precisa, simplesmente, de um princípio constitucional importantíssimo chamado 'princípio da sensatez'. [...] Então, o primeiro pressuposto é que, com bom senso, se examine o seguinte: há grave violação do senso médio superior de moralidade da comunidade? [...] É a primeira e mais grave pergunta para que haja uma improbidade administrativa, dada a gravidade das sanções em relação às três espécies. [...] E o segundo requisito, inequívoca intenção desonesta. [...] A mera irregularidade, a mera ilegalidade, para mim é insuficiente para condenar alguém por improbidade administrativa" (Ação civil pública – Improbidade administrativa , Boletim de Direito Administrativo n. 5, 2005, p. 543/544)”.

Assim, ausente o dano ao erário a caracterizar o enquadramento no art. 10 e presente tão somente a culpa no ato ilegal praticado, sendo esta insuficiente ao enquadramento da conduta no art. 11 da Lei n.º 8.429/92, impõe-se a improcedência dos pedidos

. 3. DISPOSITIVO

 Diante do exposto, julgo improcedentes os pedidos aduzidos na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito (art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil)

. Condeno a demandante a pagar os honorários advocatícios em prol do demandado, os quais fixo na soma de R$ 1.000,00 (um mil reais), em atenção ao disposto no art. 20, § 4º, do CPC.

 Sem condenação no pagamento das custas processuais, em face da isenção gozada pelo autor (art. 4.º, III, da Lei n.º 9.289/96).

 Decorrido o prazo para a interposição de recursos voluntários, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região, para o reexame necessário (art. 475, inc. I, do CPC).

 Registre-se. Publique-se. Intimem-se

. Salgueiro, 28 de março de 2011

. MARCELO HONORATO

 Juiz Federal Substituto

 (Publicada no Boletim nº 2011.000050, do D.O.E. (PE) nº 55, de 31/03/2011, pág.08)