sábado, dezembro 21, 2019

Clientes ignoram repercussão sobre loja de chocolates de Flávio Bolsonaro em meio às vendas de Natal

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Muitos clientes desconhecem que Flávio é dono da loja de chocolates
Ana Luiza Albuquerque
Folha
O vai e vem de clientes foi intenso nesta sexta-feira, dia 20, na loja da Kopenhagen do shopping Via Parque, na Zona Oeste do Rio. Surfando nas vendas de Natal, a franquia é idêntica a centenas de outras que existem no país.
Há, no entanto, uma (importante) exceção: segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, foi por meio dessa loja que o senador Flávio Bolsonaro (sem partido), dono de metade da empresa, lavou até R$ 1,6 milhão em recursos ilícitos entre 2015 e 2018. Ele nega.
DONO DA LOJA – A loja foi alvo de um dos mandados de busca e apreensão cumpridos na última quarta-feira, dia 18. Nesta sexta-feira, a Folha permaneceu por cerca de uma hora no local. Cinco clientes abordados pela reportagem disseram não saber quem é o dono da loja, que ficou em 3° lugar no PEK (Programa de Excelência Kopenhagen).
Para o MP-RJ, o volume de depósitos em dinheiro vivo na conta da franquia era desproporcional em relação a negócios semelhantes. Durante o tempo em que permaneceu na loja, a reportagem verificou que a maioria dos clientes efetuou o pagamento utilizando cartões.
Os investigadores afirmam também que a entrada dos recursos em espécie em favor da empresa coincidia com datas em que Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, arrecadava parte dos salários dos empregados do então deputado estadual.
LAVAGEM – A suspeita é de que o estabelecimento, propriedade do atual senador desde 2015, tenha sido usado para a lavagem de dinheiro no suposto esquema de “rachadinha” em seu antigo gabinete na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), de 2007 a 2018.
Os depósitos de dinheiro vivo nas contas da loja teriam como objetivo “esquentar” os recursos obtidos ilegalmente, segundo a Promotoria. Eles poderiam simular vendas fictícias feitas pela empresa, dando aparência legal ao recebimento. Desde que Flávio assumiu a franquia até 2018, o volume de depósitos em dinheiro vivo foi o equivalente a cerca de 37,5% dos recebimentos por cartões de débito e crédito —de 2015 a 2017, esse percentual chegou a 41,8%.
PROPORÇÃO – Em depoimento ao Ministério Público, o antigo proprietário da loja afirmou que essa proporção girava em torno de 20%. A Promotoria também identificou que essa proporção não se mantinha estável ao longo do ano. Em período de vendas maiores, como na Páscoa, o pagamento com dinheiro representava apenas cerca de 20% do recebido por cartões. Essa taxa aumentava nos demais meses do ano.
Foi o que ocorreu entre 22 de novembro e 7 de dezembro de 2015, quando os depósitos em espécie foram equivalentes a 92% do recebimento por cartões. O período coincide com o início do pagamento de 13º de servidores da Alerj.
AUDITORIA – Os promotores recorreram também à auditoria feita por shoppings nas lojas para cálculo do aluguel, que também considera o faturamento do estabelecimento —modalidade chamada de “aluguel de desempenho”. Essa fiscalização costuma ser feita também presencialmente, para contabilizar as vendas realizadas.
O volume de créditos efetivos nas contas da loja superou em 25% o faturamento auferido pelos fiscais do shopping de 2015 a 2018. Em valores absolutos, a diferença chega a R$ 1,6 milhão. O tradicional panetone da Kopenhagen foi o produto escolhido por grande parte dos clientes que passaram pela franquia de Flávio nesta sexta-feira.
REPASSE – O panetone também é uma das compras preferidas do policial militar Diego Ambrósio, segundo entrevista que deu à Folha. O Ministério Público afirma que Ambrósio pode ter tido participação na lavagem de recursos ilícitos obtidos por Flávio Bolsonaro. Ele repassou mais de R$ 20 mil à franquia do senador em três anos.
O militar afirmou à Folha que compra cerca de cem panetones por ano para distribuir a síndicos de prédios, fornecedores e colaboradores nas festas de fim de ano. “Foi uma maneira de ajudar um amigo que acabava de abrir uma empresa”, justificou, enviando à reportagem fotos de caixas de panetone.
“É COMUM” – Nas redes sociais, Flávio afirmou ser comum o uso de dinheiro vivo em compras de lojas como a sua, uma franquia da Kopenhagen. “É óbvio, energúmenos. É um comércio. As pessoas pagam em dinheiro também. A gente recebe em dinheiro e depois deposita na conta da loja. Qual o problema? O que tem de ilegal nisso?”, afirmou.
O filho do presidente Jair Bolsonaro nega ter utilizado a loja para lavar dinheiro. “Se eu quisesse lavar dinheiro eu abriria uma franquia, que tem o controle externo da franqueadora, que tem auditoria? Abriria uma outra atividade qualquer que não deveria satisfação a ninguém.”
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Guardadas as devidas proporções, já tem gente chamando Flávio Bolsonaro de Willy Wonka, o excêntrico dono da mágica, misteriosa e “Fantástica Fábrica de Chocolates”, filme de fantasia, adaptação para o cinema do livro britânico homônimo de 1964 , de Roald Dahl. Queiroz, se atuando estivesse, certamente seria o chefe dos Oompa Loompas, os fiéis escudeiros de Wonka. E os que não gostam do senador estão indo ainda mais longe. Pelas suposições de envolvimento com “agentes suspeitos”, dizem que o sucesso da loja é o panetone chocolícia, o preferido pelas milícias. Brasileiro não perde a piada mesmo. (Marcelo Copelli)