domingo, outubro 27, 2019

Ministério Público tem um “cometa para enterrar na gente”, diz Queiroz em outro áudio


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Ilustração reproduzida do Arquivo Google
Ana Luiza Albuquerque, Catia Seabra e Italo NogueiraFolha
Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o policial aposentado Fabrício Queiroz demonstrou em conversas preocupação com a investigação do Ministério Público do Rio contra os dois e a comparou com um problema “do tamanho de um cometa”.
Em áudios de WhatsApp obtidos pela Folha, ele se diz abandonado e vê seu grupo político temeroso, quando poderia estar exercendo sua força política. À distância, aponta falhas na condução do governo e considera que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) deveria usar a estrutura policial contra aqueles que lhe causam dificuldades.
“É o que eu falo, o cara lá está hiperprotegido. Eu não vejo ninguém mover nada para tentar me ajudar aí. Ver e tal… É só porrada. O MP [Ministério Público] tá com uma pica do tamanho de um cometa para enterrar na gente. Não vi ninguém agir”, disse o policial militar aposentado em áudio de julho deste ano.
NO WHATSAPP – Não é possível determinar a quem ele se refere como protegido. Os áudios foram enviados por Queiroz a um interlocutor não identificado, por meio do WhatsApp. A fonte que repassou as gravações à reportagem pediu para não ter o nome revelado.
Queiroz é pivô da investigação contra Flávio Bolsonaro, conduzida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Os promotores do Gaecc (Grupo de Atuação ao Combate à Corrupção) investigam as práticas de lavagem de dinheiro, peculato e organização criminosa no gabinete do filho do presidente Jair Bolsonaro no período em que foi deputado estadual.
QUEIROZ SUMIU – Desde que o caso foi revelado, Queiroz teve raras aparições públicas. De acordo com sua defesa, ele está em São Paulo desde dezembro do ano passado para o tratamento de um câncer.
Jair e Flávio Bolsonaro afirmam que não conversam com Queiroz desde que a atípica movimentação financeira do ex-assessor veio à tona, no fim de 2018.
Mesmo supostamente distante, o PM aposentado revela tristeza com a situação política dos aliados.
PENA DE BOLSONARO – “Era para a gente ser a maior força, a gente. Está todo mundo temendo, todo mundo batendo cabeça”, disse Queiroz ao interlocutor.
Ele também critica a cobertura da imprensa e diz sentir pena do presidente em razão das crises sucessivas do governo, inclusive a causada pela investigação contra si.
Ao investigar a Alerj, Ministério Público Federal pediu ao Coaf dados de movimentações financeiras de gabinetes dos deputados. O material é encaminhado em janeiro de 2018 ao Ministério Público do Rio. Em julho, com base nas informações do Coaf, Promotoria abre investigação criminal sobre Queiroz sob suspeita de lavagem de dinheiro e ocultação de bens
MUITO DINHEIRO – O procedimento contra Queiroz foi aberto após o Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) identificar uma movimentação de R$ 1,2 milhão nas contas do ex-assessor de janeiro de 2016 a janeiro de 2017.
Além do volume movimentado, chamou a atenção a forma com que as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de servidores da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Queiroz afirmou que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem o conhecimento do então deputado. A sua defesa, contudo, nunca apontou os beneficiários finais dos valores.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – Queiroz agora não pode mais reclamar de nada. É um dos beneficiários do acordo dos Três Poderes para abafar a Lava Jato e garantir a impunidade de corruptos e corruptores, com a complacência do Supremo. (C.N.)

A corrupção que não é punida acaba por se transformar num ato considerado “normal”

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Charge do Sponhoz
Ednei José Dutra de Freitas
Qualquer sistema simbólico, por ser uma virtualidade, necessita de suportes concretos e ocasiões concretas para existir. A cada vez que um juiz julga de acordo com os códigos da Justiça (mesmo que sua sentença seja injusta), e que sua sentença é acatada e cumprida, a ideia de Justiça tem continuidade. Em outras palavras, quanto mais as práticas cotidianas confirmam os códigos, mais o conceito de justiça se fortalece e se reproduz, consolidando o lastro necessário para continuar constituindo aspectos essenciais de nossa subjetividade.
Continuamos acreditando na Justiça e nos comportando de acordo com essa crença. A instituição continua viva. Mas este não é o caso no Brasil.
ATO DE CORRUPÇÃO – Ao contrário, quando o representante emblemático de uma instituição (juiz, presidente da República, parlamentares, governadores de Estado, pais, educadores, médicos, advogados, funcionários públicos) sustenta, simultaneamente, uma lógica pública e outra ligada a interesses pessoais, as duas se corrompem.
Como consequência, o vínculo até então naturalizado entre o significante “juiz” e o significado “justiça” vai se enfraquecendo, até que, no limite, se dissolve e se desnaturaliza. Há uma fratura do símbolo.
O juiz deixa de simbolizar Justiça. A instituição se enfraquece ou morre. Assim também ocorre também com os políticos, normalmente corrompidos por empresários corruptos para que ambos levem vantagem roubando dinheiro público.
UMA EPIDEMIA – Estabelece-se uma epidemia de corrupção que, infecciosa, contamina pais, educadores, médicos, e os demais já citados e mesmo parte da população que passa a praticar diferentes delitos, como sonegação de impostos, propinas a policiais para se livrar de multas de trânsito, só para dar poucos exemplos, o que contamina o caráter e o danifica, e o cidadão comum, inclusive o de baixa renda, também se corrompe, porque assimila em sua vida a prática de certos delitos, e na hora de votar, vota em políticos que fazem como ele: políticos corruptos.
Neles confiam quando fazem promessas messiânicas de que irão combater a corrupção, com discursos messiânicos, porque, apesar de tudo, o superego dos eleitores que praticam delitos (que também é corrupção) clama, do fundo do inconsciente do eleitor para corrigir sua vida delitiva.
SEMPRE MENTINDO – Vota nos mentirosos messiânicos, embora sabendo que são mentirosos, para mentir para o próprio superego, como fazem os católicos ao pedir perdão de seus pecados no confessionário, embora saibam que após o perdão dos pecados dado pelo confessor, irão comungar, mas logo à frente continuarão praticando os mesmos pecados que diziam ao padre no confessionário de que estavam arrependidos de tê-los feito. A corrupção é, pois, um mal-estar na Cultura.
Segue-se um efeito em dominó, em que todas as palavras perdem o lastro que a instituição viva e o símbolo forte garantiam. Há um esvaziamento semântico. As palavras que eram determinadas por aquele sistema se esvaziam de significação. A toga e a beca, por exemplo, tornam-se engraçadas, fantasia de carnaval, em lugar de inspirar um temor respeitoso.
SEM SIGNIFICADO – As palavras: “réu”, “culpa”, “transgressão”, “punição”, “lei”, “justiça”, ainda existem, mas já não significam. Não são mais significações operantes — uma significação é operante quando tem o poder de produzir subjetividade. As subjetividades aí constituídas — o modo de ser, pensar, agir e sentir das pessoas — já não serão determinadas pelas significações ligadas a esse sistema simbólico.
Quando um juiz aceita suborno, coloca em andamento um processo que culmina na corrupção do sistema que ele representava.
O mais grave, porém, ainda está por vir. O laço simbólico fraturado tende a se refazer, ligando o mesmo significante a um novo significado. Por exemplo, o significante “Justiça” pode agora ligar-se ao significado “terminar em pizza”. A consequência desse novo laço é que a sensibilidade das pessoas com relação ao tema se altera. Em outras palavras, a subjetividade constituída por esse e nesse novo laço passa a achar normal a impunidade. Institui-se outra moralidade, isto é, uma nova sensibilidade diante dos mesmos fatos.