A triste sina do Ministério da Justiça
segunda-feira, 21 de março de 2016
"José Eduardo Cardozo
era professor da Faculdade de Direito da PUC. Quando eleito vereador em
SP soube conciliar muito bem as funções de político e professor. Porém,
quando assumiu o MJ abandonou totalmente a condição de jurista, ignorou
tudo que sabia e ensinava sobre a República, o interesse público e a
ética, para defender, incondicionalmente, os interesses políticos do
governo e do partido. Para substituí-lo a presidente nomeou um membro do
MP, Wellington César Lima, que deixou de ser ministro sem nunca ter sido, porque essa acumulação é, indiscutivelmente, vedada pelo art. 128 da Constituição. Agora, para substituir o substituto, a Presidente nomeou Eugênio Aragão,
também integrante do MP, uma figura grotesca, que começou por ameaçar a
PF. Na perspectiva jurídica, sua nomeação é tão inválida quanto a do
Wellington Lima, e pela mesma razão. Já há uma ação no STF, movida pelo
PPS, postulando a decretação dessa nulidade. Aragão argumenta que não
estaria proibido de ocupar cargo no Executivo, sem deixar o MP, por já
ser integrante do MP anteriormente à promulgação da CF/88. Com efeito, a
CF, nas disposições transitórias, art. 29, § 3º, dispõe: "Poderá optar
pelo regime anterior, no que respeita as garantias e vantagens, o membro
do Ministério Público admitido antes da promulgação da Constituição,
observando-se, quanto às vedações, a situação jurídica na data desta."
Note-se o destaque para as vedações. Uma coisa é a manutenção de regime
quanto a garantias e vantagens, e outra coisa são as vedações, para as
quais deve ser observada a situação jurídica vigente em 5 de outubro de
1988. Ou seja: quem, nessa data, se encontrasse em acumulação que passou
a ser vedada, poderia assim permanecer. Trata-se de uma oportuna
aplicação do princípio da segurança jurídica. Porém, de maneira alguma é
possível extrair daí que integrantes do Ministério Público naquela data
incorporaram ao seu patrimônio jurídico o direito de acumular funções
expressamente proibidas pelo texto constitucional. Isso ficou muito
claro no julgamento do RE 157.538-7 Rio de Janeiro (STF, 1ª Turma, Rel.
Min. Moreira Alves, VU, presentes os Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello e Ilmar Galvão, 22/6/93), de cuja ementa
consta, expressamente, que "Não há direito adquirido contra a
Constituição". Toda norma jurídica, para ser aplicada, deve ser primeiro
interpretada, sendo certo que toda norma comporta uma pluralidade de
interpretações. Entretanto, um princípio fundamental de hermenêutica é
aquele no sentido de que toda exceção deve ser interpretada
restritivamente. No caso em exame, não é possível dar interpretação
extensiva, atribuindo a antigos membros do MP o privilégio de violar a
Constituição. Espera-se que a Presidente tenha o bom senso de abandonar a
luta inglória pela manutenção de mais uma violação da Constituição e
nomeie para o MJ algum dos muitos respeitáveis juristas que a apoiam, e
que não abandone seu compromisso com o Direito, acabando com a triste
sina desse órgão governamental."
Adilson Abreu Dallari
Professor Titular de Direito Administrativo pela PUC/SP, especialista em Direito Político pela Faculdade de Direito da USP e consultor jurídico
Professor Titular de Direito Administrativo pela PUC/SP, especialista em Direito Político pela Faculdade de Direito da USP e consultor jurídico