Pedro do Coutto
Excelente e oportuna reportagem de Felipe Seligman, Folha de São Paulo de quinta-feira 23, focalizou com o destaque merecido, manchete principal da edição, o que o STF decidiu na véspera quanto à necessidade de regulamentação do direito dos empregados dispensados a receberem aviso prévio proporcional ao tempo de casa. Atualmente, o aviso prévio, pago em dinheiro, é no valor de um mês de salário. Mas a Constituição Federal, destaca objetivamente Seligman, no item 21 do artigo 7, diz que este fator indenizatório é apenas básico, abrindo a estrada para que possa ser maior.
A questão foi levada à Corte Suprema por funcionários demitidos da Vale do Rio Doce. O relator do processo, ministro Gilmar Mendes. A decisão, justa e sobretudo lógica, passa a exigir entretanto regulamentação do dispositivo em causa. É da Carta de 88 até hoje não regulado. Como pelo menos uma centena de outros princípios essenciais que muitas vezes deixam de ser aplicados na prática por falta de lei complementar.
O Supremo dispõe-se a realizar esta regulamentação preenchendo mais uma grave lacuna do Congresso nacional. Eu me lembro que, em 1979, quando o saudoso Roberto Gurshing era secretário da Modernização Administrativa, então vinculada ao Ministério do Planejamento, e que se tornou então embrião do Ministério da Reforma Administrativa, eu e o ex-deputado Wagner Siqueira trabalhávamos com Gurshing. Wagner, inclusive, era o vice da SEMOR, a sigla.
Pesquisamos a Constituição Federal, estava em vigor a de 1969. Identificamos 107 dispositivos que estavam à espera de leis complementares. Mario Henrique Simonsen demitiu-se do Planejamento, substituído por Delfim Neto. Antes da era dos computadores, o trabalho ficou nos arquivos implacáveis, título de uma coluna de João Condé no antigo O Cruzeiro, revista semanal de grande sucesso no passado.
Relativamente à Carta de 88, o número de leis complementares deve ser igualmente enorme. Mas se nada foi feito ontem, igualmente nada é produzido hoje. Inclusive o nível do Parlamento tem baixado muito. A Câmara, por exemplo, chegou a ser presidida pelo deputado João Paulo Cunha. Mas estas são outras questões.
É absolutamente lógico que os avisos prévios devam seguir uma regra de proporcionalidade. Quanto maior for o tempo de serviço, maior o aviso. Não tem cabimento, de fato, prevalecer o sistema atual. E já que o Congresso não age, entra em ação o Supremo. Assim aconteceu em relação à Lei de Imprensa. Com base no mesmo princípio adotado sobre o aviso prévio, o STF deve estender seu campo de atuação quanto às aposentadorias pagas pelo INSS.
O artigo 201 da CF determina que os vencimentos dos aposentados e pensionistas têm que ser preservados contra a corrosão inflacionária. Durante anos isso não aconteceu, especialmente no período FHC. Tanto assim que os que se aposentaram há, digamos quinze anos recebendo dez salários mínimos, hoje recebem em torno de cinco.
Logo, o princípio constitucional não está sendo cumprido na prática. Outra omissão do parlamento. Porque, afinal, deputados e senadores não deixam pelo menos um pouco de pleitear cargos e dedicam parte de seu tempo para construir o edifício complementar? Não fazendo isso, deixam o campo aberto para o Supremo. Pois em matéria de Direito não pode haver vazio legal.
Fonte: Tribuna da Imprensa